Público pequeno para Bizet e Verdi

Pouco conhecidas, canções dos compositores foram recriadas com brilho por Caroline Stein e Arte Ensemble

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Por Redação
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Bizet e Verdi brilharam como nunca no domínio da ópera. Eles até se arriscaram, vez por outra, no universo da canção para voz e piano, dominado pelos compositores germânicos. Nenhum ultrapassou a marca das 30 canções (o primeiro compôs 28; o segundo, 25). Pouco conhecidas, provavelmente não atraíram grande público à Sala São Paulo. Na segunda à noite, não chegava a meia casa. Uma pena, pois elas escondem, entretanto, gemas incontestáveis, que a soprano Caroline Stein e o noneto Arte Ensemble recriaram de modo admirável. É cruel a síndrome da familiaridade com o repertório, que leva o público a querer sempre mais do mesmo. Não existe sequer a curiosidade de conhecer outras criações dos compositores que idolatra. Por que ficar com Bizet só na Carmen e com Verdi só na penca incrível de óperas que o transformou no mais popular compositor lírico de todos os tempos?

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Caroline tem uma bela e leve voz, de timbre claro e afinação impecável. Tanto se dá bem no reino da coloratura quanto no dramático. E o grupo de instrumentistas – um quinteto de cordas, do violino ao contrabaixo, acrescido de trompa, fagote, clarineta e flauta, formado por primeiras estantes da Orquestra da NDR – é de alto nível.

O toque final de refinamento e inovação ficou por conta do oboísta e compositor Andreas Tarkmann, mais conhecido por seus arranjos, já gravados por cantores como Plácido Domingo e Anna Netrebko, do que por suas criações originais.

Ao contrapor a voz a uma escrita fina para cordas e sopros camerísticos, Andreas amplifica o acompanhamento monocromático do piano original, em ambos os ciclos de canções. O efeito final, no entanto, é curiosamente contrastante. Em Souvenirs d’Été, reunindo sete adoráveis bijus de Bizet, a paleta de cores timbrísticas faz crescer o encanto de melodies como Chant d’Amour, Pastorale e a mais conhecida delas, Adieux de l’Hôtesse Arabe. Mas, na Verdiana, reunindo sete canções originais de Verdi para voz e piano, a ampliação de timbres soa tímida.

L’Esule, por exemplo, praticamente uma minicantata, possui uma longa introdução instrumental, alterna entre recitativo e ária e conclui com “um final estrepitoso em que o piano original soa como uma redução de orquestra”, anota a pesquisadora Claire Delamarche, ao comentar as canções de Verdi. Afinal, e quem sabe ao contrário das mélodies de Bizet, as canções do italiano já são claramente operísticas. Daí a estranha sensação de que o arranjo de Andreas Tarkmann soa mais como redução de uma imaginária partitura orquestral do que como ampliação do original para piano.

Em todo caso, são detalhes que não tiram o brilho de uma noitada muito boa de canções de câmara. Mas o programa foi curto. A descartável Carmen Suite, outro arranjo de Andreas, quase transformou os ótimos músicos da NDR num daqueles grupelhos que faziam medíocres papéis de parede sonoros nos salões dos grandes hotéis e spas europeus do século 19. Afinal, Caroline poderia ter cantado mais. O público presente, além de reduzido, decidiu aplaudir cada canção. Cansou de bater palmas intermediárias que quebraram o clima dos ciclos. E no final, quando de fato precisaria aplaudir para conseguirmos ao menos um ou dois extras, faltou entusiasmo para isso.

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