Publicitário publica a saga de sua transformação

José Luiz Tejon Megido relata em O Vôo do Cisne como conseguiu editar sua própria vida de modo a superar uma história trágica com o auxílio da música

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Por Agencia Estado
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Ele não é um mago performático que atribui a si o domínio de certas forças da natureza. Muito menos desafiou os próprios medos para conquistar o Evereste em uma escalada solitária. Mais do que isto, o publicitário, jornalista e escritor José Luiz Tejon Megido, de 50 anos, fez uma incursão para dentro de si mesmo, uma viagem de autoconhecimento para superar um trauma que carregou desde os três anos de idade: um acidente doméstico, uma queimadura que lhe deixou o rosto desfigurado apesar da série de mais de uma dezena de intervenções cirúrgicas. Estigmatizado, desde então, como patinho feio, Tejon descobriu sua singularidade e tornou-se um cisne. Neste processo, a música, em especial o rock?n?roll, teve particular participação ? hoje ele é vocalista e guitarrista da Dinossaurus Rock Band, que se apresenta regularmente no Dinossaurus Rock Bar, reduto paulistano de uma seleta confraria do rock. É esta a experiência de vida que Tejon divide em O Vôo do Cisne (Editora Gente), que será lançado nesta segunda-feira, dia 11, em São Paulo. Autor de livros técnicos sobre marketing, Tejon foi desafiado pelo editor Roberto Shinyashiki, um dos ícones da auto-ajuda brasileira, a expor a sua experiência pessoal. Eles fizeram o ensino fundamental juntos, em Santos, e só se reencontraram há dois anos. ?Primeiro ele me pediu para escrever um livro de vendas. Mas aí disse: ?Você tem uma vivência diferente, tem muita gente falando para as pessoas sobre transformação, mas poucos viveram uma. Por que não tentamos fazer um trabalho que mexa com mudanças, com o ser mais amplo ? a venda de você para você mesmo ? como poderíamos trabalhar com este conceito?? Ele me provocou e gostei da idéia?, relembra. ?A grande dificuldade para fazer um livro destes com integridade é que você precisa fazer uma viagem interior, e isto é dolorido?, conta. O livro ficou pronto em nove meses. ?Vou doar os direitos autorais da primeira edição (5 mil exemplares), 50% para o Instituto Cisne, que cuida de pessoas com limitrofia (anomalia do sistema nervoso que provoca dificuldade de concentração, falta de equilíbrio ou coordenação motora e problemas de articulação de fala e leitura), e os outros 50% para o Instituto Pró Queimados (IPQ), uma ong que atende queimados, especialmente crianças de baixa renda?, adianta. Tejon concedeu entrevista à Agência Estado. Agência estado - Qual foi a maior dificuldade para escrever este livro? José Luiz Tejon Megido - A grande dificuldade para fazer um livro deste com integridade é que você precisa fazer uma viagem interior. E traduzir isso em caminhos para que as pessoas possam tiram algum proveito. Aliado a isto, um texto que flua, que seja gostoso. A dificuldade foi grande e intensa. Este foi o meu grande exercício de janeiro até setembro. Em julho, durante 15 dias, fui sozinho viajar em um cargueiro para a Itália. Lá reli tudo. E voltei mudado. Como classificaria seu livro ? uma biografia ou um livro de auto-ajuda? Ele é um livro que foi processado no liqüidificador da minha cuca a partir de uma vivência muito diferente - alguém que com 3 anos sofreu um acidente e teve de encarar a vida. Ele é uma experiência vivencial e procura ajudar pessoas, sim. Acho que o leitor, sem exagero, sairá com mais informações sobre a vida do que antes. Trabalho caminhos que não são rápidos, mas dão resultado a médio e longo prazos. Trabalhamos a consciência para você desenvolver o seu lado cisne. Acho até que pode ser trabalhado junto com terapia. Por exemplo, falamos em como resgatar a sua criança e damos algumas dicas. No livro trabalhamos também dez caminhos, mas que não são fórmulas mágicas, são coisas para botar na cuca e que tem muito a ver com o humanismo. No livro, é notório o seu conhecimento de psicologia e psiquiatria. Você faz ou já fez terapia? Eu nunca fiz terapia, mas sempre li muito desde pequeno. Sempre tive este hábito. Também convivi muito com o pessoal do teatro, e li muito sobre sociologia e psicologia. E no marketing sempre mexemos com estes conceitos. Mas este livro acabou funcionando como imensa autoterapia. Terapia me dava medo, sempre procurei fugir dessas conversas. Vivia escapando desta hipótese. Hoje, depois do livro, estou aberto a fazer uma terapia. Imagino que deva ter sido mesmo difícil mexer com tantas cicatrizes do passado ? a queimadura, cirurgias, preconceitos. Olhando hoje para o passado, qual foi o pior momento e a melhor lição que nasceu com ele? Dos 3 anos até os 18 anos, foi um período muito difícil, vivia cheio de conflitos, muito angustiado. Porém uma coisa muito feliz, uma passagem encantadora, que relato no livro, foi quando estava internado no Hospital Brigadeiro, em São Paulo, em 1964. Durante a revolução, eu tinha 12 anos e estava internado, era um menino com muitos problemas. Tinha uma enfermeira, um senhora negra, a quem eu chamava de Tia Geralda, e ela substituía um pouco a minha mãe. Um dia ela disse: ?Nossa, menino, não é que você tem umas coisas bonitas, uns olhos bonitos, um corpão, você vai dar um monte de problema por aí?. Ao falar isso, ela instalou na minha cabeça uma percepção que eu não tinha. Existem patinhos feios na vida que ficam falando em patinhos feios. E existem pessoas cisnes, pessoas espetaculares que muitas vezes a gente não ouve, não dá atenção. Outro amigo pegou uma música minha e inscreveu escondido num festival. Depois me avisou: ?você foi classificado?. Eu não teria coragem para me inscrever. Falando em patinho feio e cisne, o que é ser feio ou bonito? A vida me revelou que não existe feio ou bonito, o que existe é que você é feito ou bonito dependendo da qualidade da obra que você gera. Descobri que apesar dos meus problemas estéticos faciais, poderia ser alguém forte, e ao mesmo tempo encantador, na medida em que produzisse resultados e obras que falassem por mim. Isso é genial para qualquer ser humano, você será espetacular, amado e desejado, dependendo do resultado da sua obra humana, que falará muito mais de você do que na verdade esta coisa exclusiva do corpo, que é ao que muita gente se apega. Isso é um grande drama. A pessoa que se concentrar apenas no valor estético será triturada, destruída e consumida pelo sistema. Vai virar produto de culinária, vai ser comido. E neste aprendizado você consegue encantar, na medida que gera coisas especiais para as pessoas. Mas, no fundo, você não queria ser diferente? Não queria ser diferente, queria ser como todos. Morria de medo de as pessoas se assustarem comigo. Na rua, eu corria para ninguém ter tempo de me ver. Fui obrigado a ser diferente na marra. A vida é muito aquilo que você edita. Existe o lado do preconceito contra você e também coisas legais. Uma grande síntese desta história toda é que existem pessoas fantásticas o tempo todo. Escolher e prestar atenção a estas pessoas é o que faz a diferença nesta vida. Tem gente que morre de medo das coisas e te coloca para baixo, mas tem gente maravilhosa. Assumir a editoria da sua vida é a grande dificuldade para chegar lá. Posso dizer que não é fácil nem simples. Quando você encontrou a felicidade? Felicidade é algo que você está vivendo e trabalhando. Acho que não existe ninguém realizado neste sentido, somos apenas seres humanos. A vida da gente é cheia de altos e baixos. A diferença é passar a não dar importância aos problemas errados, ou dar menos importância a eles. Você se dá mais valor como alguém quando pega uma matéria-prima e cria algo novo. No meu caso foi a música. Isoladamente, ela é a responsável maior por eu ter descoberto o cisne dentro do meu patinho feio. Com ela consegui ser querido. E aí até as minhas diferenças passaram a ser uma marca curiosa. Mas isso só ocorreu por que pessoas maravilhosas, e desinteressadas, estão com agente e nos dão uma tremenda força. E estar ligados nelas faz a diferença. Você acredita em Deus? Você pode falar com Deus na medida em que mergulhe dentro de você e passe a dar ouvidos a uma essência cósmica universal, a uma energia, uma espiritualidade. Forças que ainda não são explicadas pela ciência, mas que existem por aí. Existe um Deus que ainda precisa ser um pouco decodificado. Não acredito no Deus que substitui a sua força, ela está dentro de você. Não sigo nenhuma religião, não tenho preconceito contra nenhuma, procuro analisar as coisas boas de todas. Mas sou um obstinado crítico de qualquer uso da religião como instrumento de escravidão e manipulação do ser humano. O Vôo do Cisne - De José Luiz Tejon Megido. Editora Gente. 204 páginas. R$ 24,90. Lançamento em 11 de novembro, das 18h30 às 21h30, na Livraria da Vila, Rua Fradique Coutinho, 915, Vila Madalena. Fone (0xx11) 3814-5811.

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