
05 de setembro de 2010 | 00h00
Fazer previsões sobre o Brasil no futuro imediato é ainda mais fácil, porque, quando a gente pensa que alguma coisa vai mudar, não muda nada, a começar pelos mesmos, que sempre estiveram aí e, informa a experiência, sempre estarão. Saíram os que morreram ou se incapacitaram, ou passaram tudo para os herdeiros, ou preferiram uma mamata obscura, das incontáveis que no Brasil abundam e a generosa pátria criou para premiar seus filhos operosos. A maioria engorda, uns alisam ou pintam o cabelo, outros fazem plástica, todos viajam à Europa e nenhum sai pobre, notadamente os que entraram pobres. No papel, são irrepreensíveis, mas todo mundo sabe que estão ricos. Pode-se ver, pode-se tocar, pode-se falar. Só não se pode provar e muito menos punir a safadagem que alicerçou o enriquecimento.
Sim, mudaram as alianças, nos últimos anos. Vivem mudando e só duram enquanto a chance de morder o filé não trocar de lado. Quando o olhão se acende, a consciência se apaga. As alianças, em nenhum momento, tomam em consideração questões ideológicas ou mesmo interesses imediatos dos súditos. Fazem-se das maneiras mais esdrúxulas e atentatórias ao pudor, levando quem ontem xingava a hoje exaltar e quem ontem abraçava a hoje repudiar. Os que se opõem ao sucateamento descarado de princípios e valores são desdenhosamente tachados de ingênuos, primários ou radicais, até porque suas objeções ignoram as exigências da governabilidade. Governabilidade esta que, para quem está de fora, ou seja, os governados, se resume ao preenchimento de cargos públicos e semelhantes pelos indicados por essas alianças. E, pensando melhor, para os governantes também.
Os partidos? Os mesmos e a mesma conversa, com a exceção dos nanicos, que aí estão apenas para compor a festa democrática. No Senado, as mesmas caras, os mesmos ares farisaicos, o mesmo Senado, com as mesmíssimas características. Na Câmara, também os mesmos, os mesmos em toda parte, os mesmos para onde quer que a gente se volte, os mesmos que ressurgem como assombrações quando alguém clama por renovação e que perduram entra ano, sai ano, vem eleição, vai eleição. E os mesmos programas, que promoverão a justiça social, investirão em saneamento básico, darão prioridade à educação e à saúde e assim por diante - ouviu um, ouviu outro.
Agora esse escândalo da Receita Federal praticamente não causou revolta em ninguém e também é facílimo prever que vai ficar tudo por isso mesmo. Podem perguntar o que quiserem à Receita Federal, que ela é soberana e não dá satisfações e o cidadão não tem nada com isso, tem mais é que pagar, calar a boca e deixar as autoridades em paz. Não consigo imaginar país nenhum em que um descalabro desses não fosse objeto de uma indignação sem medidas e unânime, com todas as consequências disso advindas, inclusive punições, sanções e reformas enérgicas. Aqui não. Aqui é tratado como uma fofoca de campanha, quando a avacalhação do sigilo de dados confidenciais não precisa ter nada a ver com campanha nenhuma, como comprova a venda acintosa de informações também confidenciais. É um abuso inominável, um crime contra a credibilidade e a estabilidade das instituições, mas a carneirada dá de ombros e procura o caderno de variedades para ler, em vez da chatice que afeta sua vida. Em que confiar, em que acreditar?
Grandes coisas, estas previsões, agora que as vejo aqui expostas. Qualquer um poderia fazer estas e outras, é só olhar em torno ou ligar a televisão. Mas não custa ser explícito e novamente creio que muita gente pensa como eu. Ninguém mais, que eu saiba, duvida que d. Dilma se eleja (presidenta, segundo ela; daqui a pouco haverá gerentas de bancos e jovens adolescentas). Acho que apenas o dr. Serra ainda bota fé no contrário. Mas ele deve é se preparar para ter o ex-presidente Lula como companheiro de oposição, uns dois anos depois da posse da presidenta. Para prever, é só viver e ver.
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