Poesia de Manoel de Barros, no palco

Na peça Inutilezas, Moacir Chaves, diretor do premiadíssimo Sermão da Quarta-Feira de Cinza e Bugiaria, extrai poesia cênica de coisas sem serventia

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

Talvez os paulistanos tenham retido na memória alguns bons espetáculos do diretor carioca Moacir Chaves que fizeram temporada na cidade. Entre eles, o premiadíssimo Sermão da Quarta-Feira de Cinza e Bugiaria. O primeiro, era um monológo de Pedro Paulo Rangel criado a partir de um dos sermões do padre Antonio Vieira. O segundo, uma comédia criada a partir do processo movido pela Inquisição contra João Cointa no século 16. As montagens de Sermão e Bugiaria têm algo em comum. Ambas partiram de textos de difícil transposição para o teatro. E, por isso mesmo, valem ser lembradas agora, quando estréia no Sesc Belenzinho Inutilezas, o mais recente espetáculo dirigido por Chaves, criado a partir de poemas de Manoel de Barros. Em cena, Bianca Ramoneda e Gabriel Braga Nunes. No cenário, criado por Fernando Melo com quem Chaves mantém uma longa parceria artística, muitas caixas de sapatos vazias, entre outras ´inutilidades´. A trilha sonora foi criada especialmente para o espetáculo por Pedro Luis e será executada ao vivo por Pepê Barcelos, que além de instrumentos tradicionais como a viola, toca ainda ´caixa-de-sapato-vazia´. Sem falar numa sinfonia de cantos de mais de 33 pássaros. "Não há uma única palavra no espetáculo que não seja de Manoel de Barros", garante o diretor. Mas que ninguém espere um ´recital sonorizado´. Como nos espetáculos anteriores, Chaves buscou criar uma ´obra teatral´ a partir da poesia. "Cada criação tem seu universo próprio, com seus mistérios e princípios." Assim como conseguiu "fazer teatro" a partir de um ´processo de Inquisição´, levado ao palco na íntegra, Chaves buscou criar uma obra que pode ter interesse até mesmo em que não conhece ou não se encanta com as poesias do mato-grossense Manoel de Barros. "Importante não é a beleza de um texto e Bugiaria é um espetáculo paradigmático, nesse sentido. Se as duas coisas vêm juntas, ótimo." Em sua concepção, buscou recriar no palco o universo poético de Manoel de Barros. "O teatro é também o espaço onde se cria um tempo de fruição e prazer. A gente está sempre querendo alguma coisa, tentando descobrir qual o sentido, qual a mensagem, qual a transformação proporcionada por uma montagem teatral. Mas estou fazendo uma montagem sobre a obra de uma poeta que diz: ´Um homem jogado fora serve para a poesia.´ Então, o espetáculo tem de ir contra todas as questões pragmáticas. Pode, por exemplo, ter um cenário que não serve para nada." Assim, em Inutilezas, Chaves extrai poesia cênica de coisas sem serventia. Entre elas, atores. Afinal, no sentido estritamente capitalista e utilitário, para que servem atores? Qual a utilidade de sua arte? Dois desses bons atores inúteis estão no palco em Inutilezas. Escritora premiada, a atriz Bianca Ramoneda recebeu críticas elogiosas por sua interpretação no monólogo Só in Cena, cuja dramaturgia ela criou a partir de sua literatura. E Gabriel Braga Nunes já recebeu do diretor o convite para participar de sua próxima montagem do Fausto. Atualmente, Chaves é diretor artístico do Teatro Planetário, no Rio, onde realiza em breve as montagens de Fausto e Dias Felizes. Serviço - Inutilezas. Comédia. Inspirada na obra de Manoel de Barros. Roteiro Bianca Ramoneda. Direção Moacir Chaves. Duração: 50 minutos. Sábado, às 21 horas; domingo, às 20 horas. R$ 15. Sesc Belenzinho. Avenida Álvaro Ramos, 915, tel. (11) 6605-8143. Até 25/8.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.