''Poderia ter feito um filme cabeça...''

Prestes a lançar O Homem do Futuro, Cláudio Torres fala de suas escolhas

PUBLICIDADE

Por Sonia Racy
Atualização:

Encontros com o EstadãoClaudio Torres recebeu a coluna, em um hotel no Itaim Bibi, durante sua rápida passagem por São Paulo. "Tenho sido assessor de mim mesmo", brincou o diretor, enquanto ajeitava o banner de seu longa O Homem do Futuro, com estreia marcada para setembro. Na foto do cartaz, o casal protagonista do filme: Wagner Moura e Alinne Moraes. "Adoro comédia romântica", revela. A produção contou com efeitos especiais e elementos fantásticos para dar tempero ao romance, "sem perder a profundidade", explica. "Se pudesse voltar no tempo e me encontrar comigo mesmo, o que diria? O filme nasceu dessa pergunta", conta Torres, se divertindo ao lembrar os bastidores das filmagens e cenas com Wagner Moura. Diretor do sucesso de bilheteria A Mulher Invisível, que posteriormente se transformou em série para a Globo, faz questão de dizer que não corresponde aos estigmas de cineastas excêntricos, do tipo que enlouquece a equipe. "Pra mim, o set é um lugar ótimo. Adoro fazer filmes, me divirto muito". A calma e a falta positiva de deslumbramento com a profissão não são à toa. Filho do casal Fernanda Montenegro e Fernando Torres, o cineasta aprendeu desde cedo - ao lado da irmã, Fernanda Torres - a ver, naturalmente, a arte como "modo de vida". "Sempre produzi minhas coisas. Essa ideia de que o cineasta é alguém que fica parado, tendo ideias, enquanto outro executa para ele não faz parte da minha história", afirma.Abaixo, os melhores trechos da entrevista.Depois do sucesso de A Mulher Invisível, você resolveu fazer outra comédia romântica. Por que?Isso tem a ver com exercer a minha profissão. Em A Mulher Invisível, entendi que o gênero comédia romântica interessa ao público - portanto, ao distribuidor - e à industria cinematográfica. Então, dá para levantar dinheiro para fazer um filme como esse. Também compreendi que posso acrescentar elementos fantásticos à sopa da comédia romântica, que é algo que me interessa como cineasta. De que maneira o toque ficção é um diferencial no gênero?Olha, me interessava falar sobre como curar uma "dor de corno". Tem uma frase do Bukowski (Charles Bukowski, poeta) que diz que todo sujeito já foi parar embaixo da ponte por causa de uma mulher. Fiz isso brincando com uma personagem que não existia - o que, do ponto de vista da dramaturgia, é interessante. Poderia abordar essa ideia de 25 maneiras diferentes. Mas adoro comédia romântica. E em O Homem do Futuro?O tempero fantástico conta com um pouco de ficção científica. Eu gosto, porque te coloca dentro de premissas impossíveis - que só o cinema, o teatro, a literatura deixam acontecer. Se pudesse voltar no tempo e me encontrar comigo mesmo, o que eu diria? O filme nasceu dessa pergunta.E o que você responderia? Acho que diria: "Não há vida sem problemas. A vida é enfrentá-los". Mas fiz isso com uma mise-en-scène que junta aventura, comédia, romance, tentando provocar um espetáculo. A comédia romântica está crescendo no Brasil. Por que acha que é um gênero que agrada o público? Qual a medida para fazer um filme leve desses sem deixar cair a qualidade? A comédia romântica precisa do amor. E você só comove se conseguir um enredo que te propicie falar algo mais profundo. E assim tocar a quem assiste. Toda vez que a comédia não consegue alcançar o romance, cai em algo mais próximo do produto. Claro, cumpre uma função mercadológica, mas acaba não ferindo lá no fundo, sabe? De que forma você busca alcançar isso nos seus filmes? Acho que A Mulher Invisível tem momentos surpreendentes, sob o ponto de vista da solidão. A que ponto um homem pode chegar quando se sente só. Criar um amor que não existe. Todo mundo já se sentiu isolado, sozinho. Essa ideia é triste. Em O Homem do Futuro, é um cara que não aceita seu passado. As pessoas que já assistiram se sentiram gratificadas por terem sido expostas a essa reflexão. Claro, poderia ter feito um filme hermético, cabeça, mas é pop. Por falar em pop, o clipe do filme, com Wagner Moura e Alinne Moraes cantando Legião Urbana, virou hit na internet. Como decidiu colocá-los para cantar? Gosto muito de música. Pra mim, o cinema é metade vídeo e metade áudio. Eu penso muito musicalmente. Já tinha visto o Wagner cantar na banda Sua Mãe. A Alinne descobrimos que também cantava. Aí já viu, né? É o auge do filme. Um momento de explosão mesmo.Wagner Moura é um dos atores mais cobiçados do País. Na sua visão, qual o grande diferencial dele como ator? O Wagner é um sedutor. E ele empresta isso a seus personagens. Até os mais terríveis, como o Capitão Nascimento, por exemplo. Sempre quis trabalhar com o Wagner. E acho que, pra ele, foi interessante fazer algo mais leve, uma comédia romântica, e se soltar um pouco do personagem de Tropa de Elite. Como sócio de uma produtora (Conspiração), você acredita que o Brasil conseguirá criar, algum dia, uma indústria cinematográfica que não dependa de incentivos do governo? O Zé Padilha provou que sim (risos). Caminhamos para isso. As leis de incentivo são importantes. No mundo inteiro tem. Com exceção dos EUA e da Índia. Agora, acho que o público brasileiro está apreciando mais o cinema nacional e isso é muito significante.E como a pirataria pode atrapalhar esse processo? A indústria audiovisual ainda não descobriu como sobreviver sem essa fonte de renda. Eu acho que o cinema é uma experiência coletiva. O Homem do Futuro foi feito para ser assistido na telona. Por mais que a pirataria aja, é sempre triste baixar um filme no seu computador e assistir sozinho. A saída para o cinema é propor algo feito especialmente para ser visto na tela grande. Você nasceu em uma casa de artistas. Acha que seus pais, Fernando Torres e Fernanda Montenegro, te influenciaram? Sim. Na minha casa a gente assistia a filmes com meus pais comentando do mesmo jeito que se comentam partidas de futebol: "Ih, fulano está ensebando, esse cara é bom etc.". Como eles sempre produziram suas coisas, essa ideia de que cineasta é alguém que fica parado, tendo ideias, enquanto outro executa não faz parte da minha história. Aprendi a entender a arte como um meio de vida. Como? Era importante que a peça deles tivesse sucesso. Porque isso garantia o pagamento do nosso colégio. Era o que determinava se a gente ia passar as férias na Disney ou em Cabo Frio (risos). E eu só fui pra Disney uma vez. Aconteceu uma compreensão minha e da Nana (Fernanda Torres) de não ter pudor em buscar a comunicação disso: a sobrevivência e a arte.Qual será o próximo projeto? Estou escrevendo um filme chamado As Bruxas. É a história de um cara que se casa com uma bruxa. Um filme metade de época, metade atual. O tag line será "o amor dá medo" (risos). /MARILIA NEUSTEINColaboraçãoDébora Bergamasco debora.bergamasco@grupoestado.com.brMarilia Neustein marilia.neustein@grupoestado.com.brPaula Bonelli paula.bonelli@grupoestado.com.br

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.