Peça reabilita teatro de Abílio Pereira de Almeida

...Em Moeda Corrente do País, que estréia hoje em São Paulo, resgata a obra de um dos mais populares dramaturgos nacionais

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

Na década de 50 do século passado ele foi o mais popular dos dramaturgos. Suas peças representavam porto seguro para as companhias teatrais. O público fazia fila durante meses para ver seus textos, que costumavam provocar boas polêmicas. Em meados dos anos 60, no entanto, começou a parecer ultrapassado. O teatro passava por transformações que ele não acompanhou. Aos poucos vieram o silêncio e o esquecimento. Os espectadores, além de muitos diretores e atores jovens, ignoram hoje quem foi o paulistano Abílio Pereira de Almeida (1906-1977). Desconhecimento que deve diminuir agora. Esta noite entra em cena, no Teatro Artur Azevedo, ...Em Moeda Corrente do País. A peça, um dos maiores sucessos da carreira do autor, estreou em 1960, com Cacilda Becker e Walmor Chagas. E volta ao cartaz sob direção de Silnei Siqueira, com interpretações de Francarlos Reis, Eliana Rocha, Flávio Galvão, Lavínia Pannunzio e Teca Pereira. O texto, cuja ação está situada no fim da era JK, põe em foco um casal de funcionários públicos que ganham mal e moram pior. Uma negociata, que pode render uma grande propina, a ser paga "em moeda corrente do país", coloca o protagonista, Guimarães, em rota de colisão com sua mulher, Floripes. Ele resiste à corrupção, e ela, que aspira a melhores condições de vida, acha que o marido deveria ceder. Francarlos Reis, intérprete de Guimarães (papel criado por Walmor Chagas), diz: "O que a peça tem de mais impressionante é que continua válida. Nós tínhamos pensado em atualizar, trazê-la para os dias de hoje. Mas percebemos que seria mais contundente manter a ação em 1960. As pessoas vão ver a atualidade incrível do texto." Importante para o ator é que "Abílio escreveu peças em que os personagens não eram heróis ou vilões. Todos, até Guimarães, têm dúvidas, hesitam. São pessoas que reconhecemos. Abílio não era um gênio, como Nelson Rodrigues, mas um ótimo autor que retratou bem a sociedade em que vivia". A idéia de montar ...Em Moeda Corrente foi do diretor Silnei Siqueira, que está concluindo uma pesquisa para a Fundação Vitae sobre o dramaturgo. Em março, o encenador deve concluir e entregar à fundação o resultado de seu trabalho, o livro Abílio Pereira de Almeida - Seu Tempo, Sua Obra. O projeto teatral era mais ambicioso. Abarcava uma exposição, montagens de outras peças e leituras. Por falta de patrocínio, a iniciativa acabou restringindo-se à produção de ...Em Moeda Corrente do País. "Abílio merece ser resgatado desse segundo plano a que o relegaram", diz Siqueira. "Não só pela qualidade de sua dramaturgia, como por tudo que fez pelo teatro brasileiro. Ele foi uma figura importante na modernização do teatro e influenciou muito o TBC." O diretor lembra de um raciocínio de Paulo Autran para explicar a ausência de Abílio Pereira de Almeida na memória do teatro brasileiro: "Paulo diz que, ao contrário da França e dos Estados Unidos, países que se orgulham de autores como André Roussin e Neil Simon, o Brasil considera pecado o teatro dirigido ao grande público e de sucesso." Abílio Pereira de Almeida fazia um teatro popular que por muito tempo resultou em ótimas bilheterias. Eliana Rocha, que vai interpretar Floripes (personagem que pertenceu a Cacilda Becker), define-a como "a antagonista" do marido. "Ela é dramática, exagerada, reclama direto e não deixa de ter razão, porque quer uma vida melhor." É uma mulher egoísta, acrescenta a atriz. "Para Abílio, todo mundo é desonesto em algum grau." Floripes não quer ver as implicações morais da proposta de corrupção que é feita a Guimarães. O corruptor é Gervásio, amigo da família que corteja Dalva, irmã de Floripes. O papel será vivido por Flávio Galvão, que o vê como "um grande picareta, que tem uma lábia fantástica". O ator julga que por meio das situações prosaicas de ...Em Moeda Corrente "Abílio mostrou o cotidiano dessa gente, que vive todo dia a mesma coisa, uma vida sem perspectivas. Ele pode ter sido inspirado pelo neo-realismo no caso de peças como esta, como Paiol Velho. É um teatro que merece ser redescoberto". O elenco é completado por Lavínia Pannunzio, que vive Dalva, e por Teca Pereira, que faz a empregada Edwiges. Os cenários e figurinos são de Laura Carone e Telumi Helen. A trilha sonora é assinada por Tunica. Em Moeda Corrente do País. De Abílio Pereira de Almeida. Direção Silnei Siqueira. Duração: 1h30. Sexta e sábado, às 21 horas; domingo, às 19 horas. R$ 10,00. Teatro Artur Azevedo. Avenida Paes de Barros, 955, tel. 6605-8007. Estréia hoje às 21 horas.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.