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Peça 'Razões para Ser Bonita' discute a ditadura da beleza

Com humor e crítica, texto de Neil LaBute chega ao teatro Vivo nesta sexta-feira, 21

Por FLAVIA GUERRA - O Estado de S.Paulo
Atualização:

Se, como dizia Serge Gainsbourg, a velhice é a vingança dos feios, a juventude é o período em que bonitos se distinguem dos 'não bonitos', começam a chamar atenção, descobrir seu poder de 'persuasão' em uma sociedade cada vez mais superficial. E o que dizer dos nem feios nem bonitos? Os 'comuns'? Talvez mais cruel que 'ser feio' é ser comum. Foi exatamente a normalidade que fez com que a personagem de Steph (Ingrid Guimarães) em Razões para Ser Bonita fique enfurecida e resolva terminar o relacionamento com Greg (Gustavo Machado). Tudo porque ela descobre que o namorado comentou com um amigo que "a moça do escritório é linda. Minha mulher tem um rosto apenas comum, mas mesmo assim não a trocaria por nada". O que para muitas soaria como uma declaração de amor, para Steph foi uma humilhação. E, aliás, é uma amiga que trabalha com Greg e Leo quem ouve a conversa e conta para Steph. A partir daí, sua vida, e a do namorado, se torna infernal. Steph não suporta continuar com alguém que não a ache bonita. O assunto se torna uma obsessão. No meio tempo, Leo (Marcelo Faria, melhor amigo de Greg) é do tipo de homem que faz questão de ter uma namorada linda, Carla (Aline Fanju), e que ao mesmo tempo tem um caso com outra mulher mais jovem e mais linda ainda. Carla, por sua vez, é amiga de Steph e sofre o problema oposto. É bonita demais. Esta é a premissa da peça de Neil LaBute que chega ao teatro Vivo hoje e discute exatamente quanto o culto excessivo à beleza pode ditar padrões de comportamento e relacionamento no mundo atual. "Eu mesma nunca tive o padrão de beleza tradicional. Quando ia fazer testes para algum papel, ouvia: Você é exótica", brincou Ingrid, que há tempos procurava um texto para encenar. "Depois de mais de dez anos encenando Cócegas com a Heloísa Périssé, queria algo com que me identificasse e dissesse algo também. O texto do LaBute é muito crítico, mas tem humor. Tudo o que faço, mesmo drama, tem que ter humor", comenta a atriz, que tomou contato com Razões para Ser Bonita ao ganhar um livro de LaBute da amiga Deborah Evelyn. "Aí, uni com observações que já vinha fazendo. Hoje todo mundo, pobre ou rico, quer estar sempre bonito. Mais importante do que ser é aparentar ser", declara a atriz, que, ao texto original, acrescentou monólogos que escreveu para cada personagem. É exatamente a obsessão pela cultura das aparências que o texto mordaz de LaBute critica com precisão e humor corrosivo. Razões para Ser Bonita integra uma trilogia que versa exatamente sobre as neuroses e preconceitos do mundo atual, completada por Gorda e A Forma das Coisas. Para dividir o palco, Ingrid, que também é produtora do espetáculo, convocou, ao lado do diretor João Fonseca, Faria, Machado e Fanju. "Minha personagem é a linda que sofre com isso porque há também preconceito com quem é bonito, como se mulher bonita não pudesse ser inteligente", comenta a atriz, que diz que não era bonita na infância. "Era gordinha, usava óculos fundo de garrafa e tinha uma lancheira da Mônica. Nunca fui a musa da classe. Mas acho que minha geração foi mais tranquila. Hoje, muitas meninas já são obcecadas em ser bonita", comenta Fanju. Machado e Faria, apesar de se declararem tranquilos em relação à vaidade, concordam que a ditadura da beleza já não é exclusividade feminina. "Sempre fui mais ligado ao esporte, mas o poder da beleza é algo até mesmo assustador. Cresci com um galã em casa e ainda me lembro quanto achava uma loucura isso do mito do homem bonito", comenta Faria, que é filho de Reginaldo Faria. Já Machado pondera: "Costumava ser mais fácil para os homens, mas hoje todos sofremos com isso. Eu me identifico com meu personagem, o Greg, que tem uma visão crítica de tudo. Ele sabe que as mulheres se cobram mais e, muitas vezes, nem percebem que alguns 'defeitos' para elas são charmosos para nós. A beleza por si só não basta. E é por isso que ele não troca a mulher que ama por 'bonita' nenhuma".

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