Peça a peça

Cada vez mais os fabricantes têm desenvolvido novas formas de dificultar a resolução de seus quebra-cabeças

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Por Vanessa Bárbara
Atualização:

Gosto de comprar quebra-cabeças usados, sobretudo da marca alemã Ravensburger. Em 30 de março de 2014, encontrei dentro da caixa uma peça que não pertencia ao meu quebra-cabeça. É toda bege com alguns veios mais escuros, achatada horizontalmente em forma de letra H e com “braços” nas laterais. Claramente pertencia a algum cenário desértico e não à minha bucólica paisagem de trem nos Alpes suíços. Terminei o quebra-cabeça e ela ficou sobrando.

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Isso quer dizer que em algum lugar do mundo existe um quebra-cabeça com esta peça faltando. Vocês não sabem como isso ataca a minha ansiedade. Quem estiver sentindo falta de uma peça nas especificações acima, por favor escreva para este jornal com nome, endereço e recompensa oferecida pelo resgate. Imagino que possa haver alguma criança doente por causa disso.  * Os primeiros quebra-cabeças foram criados a partir de mapas e eram passatempos de cunho educativo. A atividade ganhou força na época da Grande Depressão, por se tratar de uma opção barata que podia render muitas horas de entretenimento – e ainda por cima ser reutilizada.  Como tudo nesta vida, existe um submundo de entusiastas de quebra-cabeças. Os mais habilidosos conseguem encaixar até 100 peças por hora, enquanto a média faz 25 a 50 (eu faço umas quatro). Muitos dos mais experientes preferem ficar de pé durante o processo, pois acreditam que sentar é um fator limitador para seu estilo. 

Em geral, a tática mais utilizada é solucionar as bordas e depois separar as peças por cor. Mas há também quem as classifique por formato e número de “pernas”, a fim de facilitar a localização conforme a figura vai sendo preenchida. 

Eu pessoalmente uso a tática Vaca Louca: sentar num canto, concentrar-se numa indistinta área de céu (ou telhado) e começar a testar as peças uma a uma, enquanto converso aleatoriamente sobre o dia em que eu estava sentada no escritório com a janela aberta e o vento engoliu as anotações de uma entrevista que fiz com um coordenador do Ibama – ou qualquer história do mesmo naipe. Alternativamente coloco para tocar alguma seleção de músicas passíveis de serem cantadas em voz alta, com uma ou outra faixa de cunho mais reflexivo – que é para quando você fica em silêncio tentando resolver o quebra-cabeça e pensa no absurdo da existência. 

Os produtos da Ravensburger são notáveis porque suas peças são robustas, bem cortadas e encaixam perfeitamente. A marca comercializa o maior quebra-cabeça do mundo, um painel de 680 por 192 centímetros com dez cenas de desenhos da Disney. Ele tem 40.320 peças.  Foram eles também que lançaram o Krypt Silver Puzzle, um quebra-cabeça monocromático retangular com 654 peças prateadas e dispostas em círculo, tudo rigorosamente da mesma cor. Outro considerável desafio para os adeptos do passatempo é um puzzle de 5 mil peças com cores em degradê desenvolvido pelo artista Clemens Habitch. E há um puzzle da Clementoni só de peixinhos Nemo e uma única Dory. ]

Cada vez mais, os fabricantes têm desenvolvido novas formas de dificultar a resolução de seus produtos. Uma das marcas mais maquiavélicas é a Stave, que já produziu um quebra-cabeça impossível de resolver como pegadinha de 1º. de Abril.

A marca é conhecida por não trazer a figura na caixa (só uma pista por escrito) e por introduzir uma série de maldades como um “canto falso” (peça de canto que encaixa no meio de um quebra-cabeça), uma “beirada maldita” (peças adjacentes de beirada que não se encaixam por si só, mas exigem uma terceira peça para se juntar) e um “corte na linha da cor” (peças cortadas bem na linha divisória entre duas cores diferentes, de modo que uma peça azul pode emendar numa verde sem nenhuma pista da junção). 

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Alguns puzzles da Stave contém espaços em branco só para despistar.

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