Paul Auster: "Se você não pode encarar a verdade, invente uma ficção"

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

Conhecido por sua aversão em participar de apresentações públicas, o cantor, compositor e escritor Chico Buarque de Holanda revelou ontem à noite que a exposição é até necessária. "O escritor não pode criar uma casca e se isolar, senão se torna um bicho esquisito", disse ele, na mais concorrida mesa de debates da 2.ª Festa Literária Internacional de Paraty. Mais de 1.500 pessoas acompanharam sua conversa com o americano Paul Auster, autor de Noite do Oráculo, instaladas nas duas tendas do evento. "Canso de ler entrevistas de autores que apontam sempre os mesmos nomes como preferidos (Kafka, Flaubert, Dostoievski), mas são incapazes de citar seus contemporâneos." Chico também acredita que a literatura não precisa de exibição. "Leitura de textos é novidade por aqui e, ao contrário da Europa e dos Estados Unidos, onde isso estimula a venda de livros, no Brasil isso não acontece." Curiosamente, ele é a estrela de uma festa que transformou a literatura em espetáculo e que atraiu uma legião de celebridades como os cineastas Cacá Diegues, Hector Babenco e Bruno Barreto, além de praticamente todos os autores participantes da Flip. Ele justificou a crítica ao evento classificando a literatura como uma "atividade solitária". Ele lembrou de seus problemas com a crítica no Brasil, particularmente a musical. Chico reafirmou sua observação feita nos anos 1980 à crítica musical, classificando-a de "péssima qualidade". Mas lembrou que, apesar dos problemas com os críticos, seu pai (Sérgio Buarque de Holanda) também exerceu a função de resenhista, igualmente desempenhada por Paul Auster há 30 anos. O escritor americano, aliás, sugeriu aos novos autores que não leiam críticas. O fantasma da impotência criativa não é o principal temor de Chico Buarque e Paul Auster. O escritor americano considera normais os momentos de crise e revelou que suas histórias surgem quase naturalmente. Elas podem estar relacionadas com fatos reais por vezes desconhecidos do próprio autor que, em Noite do Oráculo, usou o sobrenome de uma família judia polonesa, ignorando a estreita ligação entre os acontecimentos narrados e a vida passada de seus integrantes. Ele disse que parte da história de seu livro aconteceu de fato com um escritor francês que, inventando a tragédia de uma menina afogada, antecipou de fato a morte semelhante da própria filha. Po isso, parou de escrever por 25 anos. Chico relatou uma história semelhante ocorrida com Guimarães Rosa. Ao escrever um romance chamado A Fazedora de Velas, nunca publicado, o autor de Grande Sertão: Veredas começou a sentir os mesmos sintomas da doeça que acometia seu protagonista. Auster observou que a literatura, por vezes, serve para exorcisar alguns fantasmas, citando seu livro A Invenção da Solidão, de 1982, que lhe ajudou a suportar a morte do pai ocorrida três anos antes. "Se você não pode encarar a verdade, invente uma ficção", disse.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.