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Parque de Diversões aposta no teatro

Por Agencia Estado
Atualização:

Apesar de todas as campanhas de popularização, o teatro ainda é um espetáculo para poucos no Brasil, principalmente quando se avolumam montagens ricas e espetáculos musicais luxuosos. E isto não vale somente para o público, mas também para atores. Cada vez mais, elencos são escolhidos sobre nomes globais, e a dificuldade de se iniciar uma carreira não são poucas. No meio disso tudo, um grupo de atores, bailarinos, músicos e cantores está vivendo uma experiência muito diferente. Mesmo sendo muitos deles iniciantes na profissão, têm trabalho garantido, benefícios trabalhistas, excelentes instalações para atuar e remunerações apreciáveis. Como se isso não bastasse, seus espetáculos têm sempre de casa cheia, com uma platéia animada e participante, que nunca se cansa de aplaudir. Distribuem autógrafos e posam para fotos com seus fãs de todas as idades. E tudo isso acontece num parque de diversões. Completando seu segundo ano, o Hopi Hari é um parque temático com 760.000km2, possuindo dois teatros e uma sala de espetáculos, montada como um saloon do Velho Oeste americano. O gerente-geral de operações, Jorge Luiz Vernaglia, explica que a inclusão destes espaços artísticos atendeu ao objetivo "de absorver também um padrão de visitantes que só os brinquedos não permitiriam, que são avós, pais e mães e outros adultos. E as próprias crianças". Na criação destas atrações artísticas está Isabel Gomez, coordenadora de shows e eventos; ela própria uma profissional com 24 anos de experiência teatral - o que de certa forma, garantiu que não se fizesse algo como "espetáculos circenses", mas sim um legítimo (e talentoso) núcleo de artistas. Estudante do Macunaíma, ela se profissionalizou com o grupo teatral Vacalhau e Binho, onde começou a descobrir uma vocação para a organização e produção dos espetáculos que sobrepujou a de atuar no palco. E é ela, com sua longa vivência teatral, que destaca um diferencial fundamental para os artistas no parque temático - a qualidade das instalações. "Quando eu vi este Teatro di Kaminda, e os outros espaços, fiquei apaixonada. Aqui eu tenho equipamentos que nunca tinha tido em São Paulo", diz. Alguns dos shows montados atenderam diretamente aos temas das áreas do parque, como o Klap-Klap Show, uma apresentação dos personagens de Vila Sésamo (realizado num teatro próprio, de 200 lugares); e o espetáculo de música e dança do Velho Oeste, no Bar Saloon (300 lugares). Já as montagens do Teatro di Kaminda (800 lugares) são as mais complexas, e também as mais livres, pois não têm compromisso temático. Em razão disso, aliás, o teatro já está em sua segunda montagem de comédia, e a idéia é estrear novas peças de tempos em tempos. Além disso, ao longo do tempo, os atores vão inserindo pequenas mudanças, agregando piadas e outros efeitos ao espetáculo. Isabel explica que o objetivo é realmente montar um repertório próprio, como uma boa companhia de teatro. Ela, como seria de se esperar, é parte fundamental no processo de criação dos espetáculos e novas montagens. O processo é dinâmico e, sem dúvida, incentivador da criatividade de atores e bailarinos. Tanto Isabel quanto Jorge Luiz tomaram parte no processo de seleção dos artistas contratados, num trabalho em que, além do recebimento de mais de 700 currículos, foram realizadas 300 apresentações, feitas à escolha dos artistas, numa cena de dois minutos de duração. Ou seja, escolheram-se não só o talento e a habilidade, mas a criatividade. Hoje, o casting do Hopi-Hari inclui 52 artistas e seis técnicos, reunindo talentos veteranos e novos. Sem dúvida, boa parte do sucesso no Kaminda se deve ao talento de um veterano, o ator Carlos Arruda, conhecido como "Puruca". Com 25 anos de profissão, é amigo de Ziraldo, com quem já escreveu peças e dirigiu montagens, e com uma carreira de muitas participações, como no grupo carioca Cante e Conte, e em espetáculos como Esperando Godofredo, que ficou quase dois anos em cartaz. Campineiro, com 47 anos e toda sua bagagem teatral, mesmo assim Arruda admite que o trabalho no parque "foi uma grande surpresa", e hoje ele considera o grupo reunido no Kaminda "como uma grande família", e que acabou se tornando uma experiência muito interessante "porque cada um aqui veio de uma escola, e a gente acaba aprendendo muito, inclusive com os novos". Hoje na pele de um tresloucado diretor de cinema, que leva pessoas da platéia ao palco para atuar em sua "superprodução", o ator está adorando a "interatividade" do trabalho. "E tudo isso sem contar como é raro encontrar um teatro deste para trabalhar, aqui no Brasil." Outra de longa experiência artística é "Joe" Welsh, uma das duas cantoras do Bar Saloon. Atriz desde os seis anos, e trabalhando profissionalmente desde os 13, ela própria é também um exemplo da qualidade obtida na seleção do casting do Hopi-Hari. Tendo começado a estudar canto aos 19 anos, Welsh é uma cantora lírica de formação - "e aqui canto country". E essa mistura de seu trabalho original de atriz com o canto de soprano faz com que sua figura no palco seja realmente magnética, com a voz que não surpreenderia se estivesse em algum CD de Nashville. Para sorte e deleite dos visitantes do parque, ela encarou bem o desafio de passar de La Traviata para os acordes à la Garth Brooks - "não foi fácil, tive de suar um pouco". Mas ela não duvida que valeu a pena - "aqui é muito legal, pois além de ser uma empresa e a gente ter uma regularidade de trabalho, de pagamento, o que é excelente; estamos fazendo aquilo que nós gostamos! E aqui é um laboratório fantástico para você se aperfeiçoar cada vez mais." Já Cássia Rogero, de 32 anos, está tendo com o Kaminda a sua primeira chance de atuar profissionalmente. Atriz formada pelo curso do Conservatório Carlos Gomes, ela já havia atuado em diversas peças experimentais, em festivais no interior paulista e campanhas de popularização, mas nunca como contratada. Segundo ela, "para nós, que estamos aqui, essa chance é como uma benção. Todos os atores que eu conheço, que trabalham fora daqui, vivem sempre numa grande insegurança. Aqui eu tenho um salário mensal, um trabalho fixo, contratada. Eu me sinto sorteada". Além disso, ela comenta que no cenário normal, o ator tem "de correr atrás de um todo - do local, da divulgação e de tudo que for necessário; aqui, nós temos toda uma infra-estrutura preparada, só temos de nos preocupar em atuar e agradar o público". Ela também lembra que "lá fora, você tem de sempre buscar uma ´casa cheia´, enquanto aqui isto não existe, nosso espetáculo está sempre lotado". E o público, também, é diferente, segundo Cássia - "ele é totalmente receptivo, vem preparado para se divertir, a risada vem muito fácil. É bem diferente do que acontece lá fora." Mas, falando nas chances para novos talentos, um dos melhores exemplos é o dançarino do Bar Sallon, Fábio Brito Cador, um santista de apenas 20 anos que começou a estudar dança num projeto da Secretaria de Cultura de Santos, com 11 anos. As dificuldades da carreira artística, porém, levaram Cador a se profissionalizar como modelo fotográfico, enquanto mantinha vivo o talento para dança através de atividades paralelas, chegando até a aprender artes circenses - o que acabou facilitando seu desempenho no Hopi-Hari, aonde além de dançar, executa um número de chicote de cowboy. "Antes, eu era obrigado a fazer um pouco de tudo." No parque, esta realidade mudou totalmente. Cador está tendo a chance de se iniciar no canto, e finalmente, de poder atuar profissionalmente como dançarino. No fim, se ainda existe alguma dúvida da qualidade artística conseguida nos inusitados palcos do Hopi-Hari, faça um teste. Acomode-se numa das poltronas do Teatro di Kaminda, ou puxe uma cadeira no Bar Saloon, e prepare-se para o show. Você não vai se arrepender.

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