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Papilas em festa

O cronista pede licença para servir mais uma rodada de empadas e outros salgadinhos

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Por Humberto Werneck
Atualização:

Quem disse que uma rodada de empadinha era suficiente? Para esse povo não há o que baste. Ainda mais se além de empadinha tem coxinha, pastel, croquete, empanada, toda a inumerável família de salgados, enfim, ante os quais cintila o olhar voraz da nacionalidade. Mas atenção: estou falando em salgadinhos reconhecíveis, não naquelas composições comestíveis, não raro bizarras, ainda quando deliciosas, as quais, à falta de legenda, impõem consulta a quem veio com a bandeja. 

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Parece ter sido rápida e gulosamente deglutido o que aqui se disse, na semana passada, a respeito daquela que seria a melhor empada do Rio de Janeiro, enquete da qual saiu consagrada a de camarão do Caranguejo (não confundir recheio e nome da casa), em Copacabana. “E pensar que passei duas semanas hospedada em frente, sem saber o que havia ali...”, lamentou a Alice. 

A conversa sobre empadas não tardou a suscitar discussão conceitual. “Tem que ser de massa podre”, decretou a Denise, com isso dando ensejo a imediata reação do Fernando. “Divirjo!”, posicionou-se o autor de Olga, Chatô e tantas outras iguarias literárias, o qual, conhecedor das massas, sentenciou: “A fina, quando bem feita, é inesquecível”. Provocadora, além de provocante, a mesma

Denise propôs ao cronista sociedade para a criação de uma rede de casas de empadas cujo lema, com ou sem recheio ideológico, seria “Aqui não tem coxinha!”. 

Inicialmente restrita às empadas do Rio, a enquete, previsivelmente, veio reabrir ancestral antagonismo entre cariocas e paulistanos, tendo estes sacado diversificada munição de seu arsenal de salgadinhos. Disposta a lembrar, de quebra, que também São Paulo tem uma Lapa, a Ana Paula invocou a Vilinha, pequena confeitaria ali estabelecida, que a seu ver oferece não só a melhor empada como a coxinha campeã da Pauliceia. 

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Vozes ergueram-se em uníssono, às margens do Ipiranga e do Tietê, para louvar o pastel da Maria, capaz de atrair multidões ávidas em dia de feira em frente ao Estádio do Pacaembu. Entre o de carne e o de queijo, não balança o coração da Ana: encara os dois – desde que lhe sobre espaço para o bolinho de bacalhau da Dona Felicidade, na Vila Romana. 

Com a autoridade de quem já teve sob seu comando uma revista dedicada à boa mesa, a Wanda revira os belos olhos ao se lembrar das miniesfihas armênias da Moema Kuyumjian, designer gráfica que em boa hora converteu-se em mestre-cuca. “Mas só sob encomenda”, informa a Wanda. Sua filha, a Luiza, não passa sem a coxa-creme da Ofner, em especial como arremate de uma boa (ou mesmo má) noitada. 

Depois de afirmar que a melhor empada brasileira só se encontra em certo endereço belo-horizontino, residência de sua mãe, o Miguel, autoridade no assunto, destacou, em São Paulo, a do Bar do Luiz Fernandes, em Santana, a do Bar Original, em Moema, e a do Jiló do Periquito, antigo Aconchego Carioca, nos Jardins – e, entre nós, revelou que a deste último é fornecida pela imbatível dona Maria do Carmo, que vem a ser sua progenitora. 

Em matéria de empanadas, o cronista e a torcida do Corinthians (do Juventus, vá lá...) não pestanejam antes de eleger as do Martin Fierro, na Vila Madalena, superiores até mesmo às de Buenos Aires, de onde, aliás, veio a dona e impecável maestrina da casa. Mas nem por isso se desdenhe das empanadas chilenas do El Guaton, em Pinheiros, as preferidas do Emerson, nem das do La Guapa, que segundo o Mario “são de gritar”. 

Não foi menor entre os mineiros o ouriço em torno do tema salgadinhos. A Dagmar prometeu apresentar-me à empada de queijo com abacaxi de sua amiga e conterrânea Mara Bila, de Pitangui. Estou esperando, Dagmar! Depois de evocar delícias de sua infância e mocidade em Curvelo e Corinto, “de massa fina e molhada”, o Ricardo nelas baseou-se para deitar teoria: “No recheio, o frango tem que vir desfiado, mas identificável, e não no meio de massa disforme, misturada e sem charme visual”. Não menos nostálgico, o primo Maurício evocou as empadinhas que, na casa de nossa bisavó Chiquinha, em Sete Lagoas, não apenas devorávamos como, saciado o apetite propriamente dito, transformávamos em projéteis de batalha aérea que tanto nos divertia como emporcalhava a sala dos menores.

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Ainda em Belo Horizonte, a Nísia registra o ressurgimento, no Minas Tênis Clube, do bolinho de feijão, algo como um acarajé miudinho cuja lembrança, nos anos 50, fez o poeta Paulo Mendes Campos tomar um avião no Rio, conforme contou em crônica, exclusivamente para apresentá-lo à inglesinha Joan, com quem viria a se casar. 

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A Ana Luiza, por sua vez, não abre mão de certa empada de quatro queijos da qual se abastece, veja você, num posto de gasolina, ao lado do Colégio Arnaldo. “Não é só a empada”, acrescenta a Nini, outra freguesa, “tem também o enrolado de presunto e queijo”. 

A Letícia dispõe de copiosas recomendações. Em matéria de empadas, a do Mercado Central, a de frango da Doces de Portugal e a de alho poró do Verdemar. E mais: o pastel de milho do Girassol, o bolinho de mandioca com mussarela do Xapuri e o enrolado de salsicha do Minas Tênis, este tão temperado quanto temperamental, adverte ela, pois a qualidade pode variar.

Quanto à Mariana, sua escolha recai na empada de queijo da Pão & Companhia e na de queijo da Papo de Anjo – voto que não significa veto no pão de queijo recheado da Pão de Queijaria. Na mesma Papo de Anjo da Mariana, a Raquel, não só para rimar, fica com um pastel, o assado crocante de frango. Já a Ana Maria é devota da empadinha da Avelã – nome da casa, esclarece, não recheio do salgado. 

Por fim, o Bernardo, de mudança do bairro Sion, levará saudade das coxas de uma vizinha – as de frango com catupiry, bem entendido, da Boca do Forno. Recém-casado com a Ana, seguirá o Bê rumo a longa temporada na Alemanha, com a missão de abastecer este cronista de informações a respeito do que por lá houver no quesito, claro, salgadinhos. 

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