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Pai e mãe

Ele tinha 65 anos e um dia surpreendeu a todos com a informação de que estava, finalmente, conseguindo falar com seu pai. Ninguém imaginava que ele ainda tivesse pai. Alguns chegaram a pensar que o contato se dera numa sessão espírita. Mas não, o pai estava vivo. Casara cedo, tinha vinte e poucos anos quando o filho nascera. Por isso mesmo, nunca haviam se entendido muito bem. Não tinham interesses em comum. Não tinham assunto.

Por Luis Fernando Verissimo
Atualização:

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Na política, eram opostos. O pai reacionário, o filho progressista. As poucas vezes em que falavam de política sempre acabavam da mesma maneira. – Vá viver em Cuba – dizia o velho para o filho. E este: – Vá viver no século dezenove.  Depois passavam semanas sem nem se olharem.

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Mas agora tinham assunto. – Estou podendo, finalmente, falar com meu o meu pai. – Sobre o que vocês conversam? – Remédios. Comparavam tratamentos.  – Qual é o seu betabloqueador?  – Está tomando o que para o colesterol?  – Experimenta este. Trocavam hemogramas. – Sua glicose está melhor do que a minha!

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o filho contou que era comum ir à farmácia com o pai, de braços dados.

Mãe. Ela contou que o conselho que recebeu da sua mãe, quando se casou, foi “Não seja inteligente demais, minha filha. Disfarce”. E contou que a mãe lhe dissera que devia o sucesso do seu casamento a uma frase. – Que frase, mamãe? – “Não tenho cabeça para essas coisas complicadas, mas...” A mãe usava a frase como preâmbulo sempre que precisava dizer ao marido o que ele deveria fazer. Segundo a mãe, para um casamento feliz, preâmbulo é tudo.

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