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Os podres

A conversa entre os dois casais estava boa, até que a Márcia resolveu criticar o marido. – Sabem que o Alaor não joga papel fora? – Marcinha... – tentou protestar o Alaor. Mas Márcia continuou: – Não joga nem deixa eu jogar. Há anos que ele acumula papéis. Revistas, recortes de jornal... – Marcinha, precisa falar nisso agora? – Precisa, Alaor. Precisa porque eu não sei mais o que fazer com tanto papel dentro de casa. Desculpe, mas eu não aguentou mais.

Por Luis Fernando Verissimo
Atualização:

O desabafo de Márcia criou um constrangimento no outro casal. Mas Márcia não parou. – Vocês sabem que ele encheu um armário inteiro com revistas velhas? Aí eu não aguentei. Botei todas fora. – É. Minha coleção da Placar. Desde o primeiro número. Você jogou no lixo! – Precisava do armário para guardar roupa. Armário é pra isso. – A coleção inteira! – Sabem esses volantes que distribuem na rua? Ele pega todos. A casa está cheia de volantes. De telepizzas, de detetives, de tudo. Até de cartomante. Vocês acreditam? Cartomante! Agora o Alaor estava brabo: – Já que estamos botando os podres pra fora, o que você me diz das suas calcinhas? – O que que tem as minhas calcinhas? – As suas calcinhas penduradas no banheiro. Há anos que eu pergunto por que tem calcinhas penduradas no banheiro e você não dá bola. Explique, agora. Na frente de testemunhas. Por que nosso banheiro tem calcinhas penduradas por tudo que é lado? – Que ridículo, Alaor. – Há anos eu peço uma explicação, que não vem. Anos! Quando Márcia e Alaor saíram, o outro casal ficou comentando aquela explosão intempestiva de ressentimentos domésticos. Como era que um casal chegava àquele ponto? – Se bem – disse a mulher – que a Márcia tem um pouco de razão. Você também tem mania de colecionar papel... – Peralá. Eu só guardo suplemento literário para ler depois. – E nunca lê. Mas francamente, guardar volante de cartomante é demais. Mais tarde, na cama: – Bem... – Mmm? – Por que mesmo suas calcinhas ficam pendurada no banheiro? 

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