
16 de maio de 2013 | 02h09
Uma das regras explícitas na atual Convenção de Genebra diz respeito ao tratamento de prisioneiros. O argumento principal de quem defende a repressão e seus excessos durante a ditadura militar no Brasil é que se tratava de uma guerra aberta entre o regime e seus contestadores armados, que sabiam no que estavam se metendo. Só aos poucos estamos conhecendo as atrocidades cometidas na luta contra a guerrilha no Araguaia, da qual a maioria não sobreviveu nem seus corpos foram encontrados. Mas quanto ao que aconteceu nas salas de tortura da repressão não existem dúvidas ou apenas suposições, está vivo na memória dos torturados e suas famílias. Foi quando os cães sem controle da guerra estraçalharam o que poderia haver de simples humanidade no tratamento de prisioneiros, ou o simples respeito a regras convencionadas, por um estado civilizado.
Se a discussão entre os que sustentam que salvaram o Brasil com seus excessos e os que querem que o Brasil conheça a verdade enterrada sem lápide daqueles tempos parece um diálogo de surdos, o grande mudo desta história toda é a instituição militar, que nunca fez uma autocrítica consequente, nunca desarquivou voluntariamente seus arquivos ou colaborou nas investigações sobre o passado, o dela e o nosso, para evitar a cobrança atual. E o que foi feito não era inevitável. Na Itália, por exemplo, na mesma época, o governo enfrentou uma violenta contestação armada sem sacrificar um direito civil, ameaçar uma instituição democrática ou recorrer ao seu próprio terror. Sem, enfim, soltar os cachorros.
A diferença, claro, é que lá era um governo legítimo.
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