Ópera consagra parceria

O maestro Luiz Fernando Malheiro e o encenador André Heller-Lopes comprovam maturidade em novo trabalho

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Por JOÃO MARCOS COELHO
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Maldito pode ser um adjetivo adequado para qualificar o tremendo impacto de Os Sofrimentos do Jovem Werther, romance epistolar com tinturas autobiográficas de Goethe publicado em 1774, sobre a juventude europeia. O melancólico jovem que se suicida por não conseguir realizar a avassaladora paixão por Charlotte, casada com outro, se transformou em símbolo de um movimento estético que os alemães chamaram de "Sturm und Drang", ou Tempestade e Ímpeto. Jovens se matavam seguindo os rituais de Werther; na Itália, conta-se, a Igreja comprou uma edição inteira do livro só para impedir que circulasse no país.Mais de um século depois deste frenesi literário e comportamental, Jules Massenet interessou-se pelo tema para uma ópera. Ele conheceu a força de Goethe em 1859, quando, aos 17 anos, tocou percussão na estreia de Fausto, ópera de Gounod baseada no romance Dr. Fausto. Foi, porém, apenas aos 50 anos, que concluiu seu Werther, que estreou primeiro em alemão, em 1892, e só 11 anos mais tarde em francês. De lá para cá, se tornou não apenas sua ópera mais famosa, ao lado de Manon, como uma das mais amadas e encenadas no mundo inteiro. A montagem que hoje estreia no Teatro São Pedro tem diferenciais. Primeiro, mostra as duas versões da ópera, com tenor e barítono se alternando no papel-título: Fernando Portari canta hoje e dias 27 e 29 e 2; e o barítono Leonardo Neiva nos dias 1.º e 4. Mais importante: consolida a retomada, em São Paulo, de uma vitoriosa parceria que deu certo nos festivais de ópera de Manaus, entre o maestro Luiz Fernando Malheiro e o encenador André Heller-Lopes, reiniciada aqui pelo Teatro Municipal nas excelentes montagens da A Valquíria e Crepúsculo dos Deuses, de Wagner. Malheiro amadureceu, em mais de 15 anos de desafios líricos amazonenses, uma regência impecável; Heller igualmente frequenta patamares elevados de qualidade em suas encenações. É ele quem define o tom da montagem do São Pedro: "Buscamos um Werther mais próximo de nosso tempo. Um casal de amantes marcados não somente pelo amor proibido, mas também pela melancolia. Sem perder a raiz romântica da obra de Massenet inspirada em Goethe, olhei esse Werther à luz do existencialismo. A essência de Werther e Charlotte é marcada pela infelicidade - apenas no fim, com a morte do herói e sua transformação em 'personagem histórico', a reconciliação torna-se possível". O elenco reúne vários de nossos melhores cantores. Além de Portari e Neiva, Luiza Francesconi (Charlotte), Gabriela Pace (Sophie), Murilo Neves (Le Bailly), Vinícius Atique e Max Costa (alternando-se como Johann). Participa o Coral Infantil Canarinhos da Terra. No dia 3, o maestro Malheiro, em encontro com o público, fala sobre a montagem e sua relação com o quarteto para piano e cordas opus 60 de Brahms, apelidado "Werther", que será executado na ocasião por quarteto liderado pelo violinista Claudio Cruz.

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