Obra de arte total na Casa de Vidro

Curador Hans Ulrich Obrist e o arquiteto Rem Koolhaas lançam projeto de mostra na residência de Lina Bo Bardi

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Por Camila Molina
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Estrela da arquitetura mundial, o holandês Rem Koolhaas visitou anteontem a Casa de Vidro de Lina Bo Bardi pela primeira vez. Estava com tanto frio que ficou por pouco tempo na sexagenária residência da arquiteta ítalo-brasileira, uma construção suspensa e transparente entre árvores do bairro do Morumbi. "É interessante que Lina Bo Bardi tenha descoberto a conexão entre folclore e a modernidade, combinação que acredito não ter visto em nenhum outro lugar", diz Koolhaas ao Estado, referindo-se às tantas peças de arte popular que fazem parte da coleção da arquiteta, morta em 1992, e que decoram a casa. Mas a visita do holandês tinha um propósito específico - ele e cerca de outros 30 criadores vão participar de exposição, em 2012, na Casa de Vidro de Lina, um projeto internacional com curadoria do suíço Hans Ulrich Obrist.Obrist também é uma estrela, está entre os curadores mais influentes do mundo da arte. Tanto ele quanto Koolhaas realizam amanhã, às 11 horas, uma palestra no teatro do Sesc Pompeia (Rua Clélia, 93, tel. 3871-7700), onde apresentarão para o público, ao lado da designer Petra Blaisse, o projeto da mostra na Casa de Vidro do Instituto Lina Bo e Pietro Maria Bardi, marcada para ocorrer entre setembro de 2012 e janeiro de 2013. Em processo inicial, a lista dos participantes, nacionais e estrangeiros, ainda não está fechada, mas o curador vai anunciar alguns nomes - entre eles o do artista Cildo Meireles e do arquiteto inglês Norman Foster."Comecei a ser curador por causa da minha cozinha", diz Hans Ulrich Obrist. Ele se refere à exposição que organizou na cozinha de sua casa, quando tinha 23 anos, e da qual participaram a dupla suíça Fischli & Weiss e o francês Christian Boltanski. "Foi uma experiência fundamental, algo que nunca quis perder, por causa da intimidade, do tipo de arte produzida numa escala completamente diferente do museu", continua o curador."No século 20, os museus acabaram ficando cada vez maiores, como shopping centers, e essa condição da escala humana acabou correndo o risco de desaparecer", diz Obrist. "A escala doméstica", completa Koolhaas. "Por um momento na história da arte, é assustador que a escala humana possa desaparecer, mas acho que isso não ocorrerá como um todo e por isso participo de um projeto como esse (da exposição na Casa de Vidro)", completa o arquiteto holandês, vencedor, em 2000, do prêmio Pritzker, e homenageado no ano passado com o Leão de Ouro da 12.ª Bienal de Arquitetura de Veneza, autor da tese de "enclosed city", a ideia central de projetos que ampliam o espaço público e minimizam o privado.A exposição na Casa de Vidro em São Paulo tem como conceito o trabalho de intervenção artística - e multidisciplinar - na escala íntima e sutil com a residência e sua história e com a obra de sua criadora. "O projeto é sobre a casa, mas os artistas terão completa liberdade para usar o espaço externo com suas árvores, o belo estúdio que há no piso inferior, o arquivo de Lina, com seus desenhos, sua coleção de arte", conta. "É sobre a ideia de a exposição ser uma casa e de a casa ser uma exposição", afirma Obrist, que faz referência ao conceito de obra de arte total (gesamtkunstwerk) na residência, a "reconfiguração temporária" da Casa de Vidro com os trabalhos dos artistas. O curador já organizou, por exemplo, projetos anteriores na Huerta de San Vicente, casa do poeta Federico García Lorca na Espanha, e na Nietzsche Haus, na Suíça."Há alguns anos estou interessado em Lina Bo Bardi, existe um fascínio por ela", conta Hans Ulrich Obrist, que conheceu primeiramente, em 2000, o Sesc Pompeia projetado pela arquiteta e esteve na Casa de Vidro no ano passado. "Um dos motivos da escolha de Lina para esse projeto foi a invenção dos extintos cavaletes (de vidro) para o Masp, com os quais se podia olhar a obra de arte de uma maneira diferente. Também podemos ver aqui na casa a ideia de uma gravidade desafiadora."O projeto é realizado pela produtora espanhola Isabela Mora em colaboração com o Instituto Lina Bo e P. M. Bardi. Além de futura inscrição na Lei Rouanet, um comitê de apoio privado foi criado com colecionadores brasileiros e estrangeiros (entre eles, o Instituto Inhotim). A exposição ainda vai abranger a edição de livro e filme, dirigido por Gustavo Moura.

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