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O texto vivo de Daniel MacIvor

Em entrevista, autor de ‘In on It’ fala sobre seu processo de criação

Por Maria Eugenia de Menezes
Atualização:

Desde 2001, quando assistiu a uma montagem de In on It em Nova York, Enrique Diaz tem sua carreira atada à do dramaturgo canadense Daniel MacIvor. Além de ter feito a sua própria versão de In on It, em 2009, retornou aos escritos de MacIvor outras duas vezes: em A Primeira Vista, em 2012, e agora com Cine_Monstro, atualmente em cartaz no Sesc Pompeia.

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De passagem por São Paulo, onde veio lançar um livro e participar de um debate, o autor conversou com o Estado sobre as peculiaridades de seu processo criativo. Discorreu sobre as estruturas formais de seus textos, que os aproximam de jogos de armar, e confessou qual o seu maior temor ao escrever: entediar o espectador.

Você não é apenas um dramaturgo, mas também um diretor e um ator. Como o fato de atuar e dirigir influenciam a sua maneira de escrever? Acredito que os meus textos foram feitos para ser encenados, é pela encenação, pela performance que o público acaba se interessando. A história que está sendo contada não é o ponto central para mim. O espetáculo é essencial e a história está sendo contada ali dentro. Talvez porque os meus estudos tenham sido como ator e não como dramaturgo. Não estudei teoria do teatro ou dramaturgia.

Mas você se vê essencialmente como um escritor, não? Sim, é assim que me defino. Mas eu tenho consciência de que as minhas palavras existem para serem ditas e não lidas. Na página, o texto é difícil de ler, é difícil entender todas aquelas vozes que estão sempre mudando.

E como é o seu processo de criação? Você escreve sozinho ou a partir do contato com seus atores? Escrevo sozinho, mas nunca começo a escrever porque tive uma ideia. Escrevo sempre a partir de vozes que tenho na minha cabeça, de personagens que começam a conversar. Quando em A Primeira Vista uma das personagens diz que o nosso problema é querer nomear as coisas, isso surgiu de um diálogo entre as atrizes. Ainda que a minha filosofia esteja ali também. Mas não é dela primeiramente que eu parto.

É curiosa essa sua descrição, porque seus textos têm invariavelmente uma estrutura muito nítida, com algo de quase formal e matemático, como peças de um jogo que vão se encaixando. Sim, é como uma arquitetura. Mas isso acontece porque, para mim, o maior problema do teatro é quando o espectador fica entediado. E sempre que ele sabe o que vai vir a seguir, esse tédio se impõe. Você precisa surpreendê-lo o tempo todo. Dar à plateia a impressão de que está assistindo a um tipo de peça e, de repente, levá-la para outro lugar completamente diferente, Fazer com que abra mão dos seus prejulgamentos.

Essa relação com o espectador parece muito importante para a sua obra. Os personagens falam diretamente para quem os assiste, mas não lançam mão do tipo de interação que costumamos ver no teatro.Acho que é porque sou muito grato pela presença das pessoas. Elas poderiam não estar no teatro, mas vieram. Não posso ignorar o público, fingir que eles não estão ali. Há uma cena nos Simpsons em que Homer diz a Marge: ‘Você sabe quão chato era isso? Era chato como uma peça.’ Não quero nunca que as pessoas tenham essa sensação com as minhas peças.

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Suas encenações são minimalistas, assim como suas indicações nas rubricas das peças. Você prefere o palco vazio? Ou é uma maneira de enveredar por um teatro mais experimental?Eu tinha um mentor quando era jovem que costumava dizer que uma página em branco é perfeita, e tudo que você coloca ali é uma falha. Isso ficou comigo. Um palco vazio já é perfeito. Para mim, experimental é tentar construir um cenário.

Em A Primeira Vista você construiu uma obra muito afetuosa. Cine_Monstro, de certa maneira, parece o oposto disso, tomada por uma espécie de instinto de morte. De onde vem esses universos tão distintos? Não acredito nessa ideia de um ‘self’, uma individualidade a ser conhecida, que eu sou ‘uma’ coisa. Acho que o que existe é uma coisa fluida, em movimento, que se manifesta de diferentes maneiras com cada pessoa. Dizer que eu sou de determinada maneira é como dizer que quero viver em estado de felicidade. É impossível.

 

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