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O sucesso do bígamo Berilo da novela da Globo

Bruno Gagliasso, entre dois amores, arrebata o público no intervalo de tantos mistérios em 'Passione'

Por Patricia Villalba e Jotabê Medeiros
Atualização:

É frequente que atores, mesmo os que interpretam as piores figuras, acabem se envolvendo tanto com seus personagens que passem a entender suas motivações e defendê-los. Mas a simpatia e o jeito docemente atrapalhado do Berilo de Passione (Globo, 21h15) não são suficientes para Bruno Gagliasso, seu intérprete, dar-lhe redenção. "O comportamento de Berilo é totalmente reprovável. Procuro todas as razões possíveis que levam Berilo a agir como age. Dentro do set, sou seu advogado de defesa, fora do set, o promotor que o acusa", revela o ator ao Estado.

 

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Berilo é bígamo, comicamente casado com a italiana Agostina (Leandra Leal) e a brasileira Jéssica (Gabriela Duarte), situação que rende ótimas cenas e boas risadas na novela de Silvio de Abreu. É papel leve, que afasta o Tarso, esquizofrênico que ele interpretava em Caminho das Índias. Gagliasso é bom de comédia e drama, como já ficou provado, e tem um carisma que faz o público pensar que, poxa vida, o Berilo não faz por mal.

 

O Berilo poderia ser tomado pelo público como um safado, mas não há quem não nutra grande simpatia por ele. A que se deve essa simpatia?

Creio que existem diversos fatores. Um deles pode ser minha trajetória como ator. O espectador pode estar transferindo para Berilo a síntese do meu trabalho anterior, ou seja, um personagem de forte apelo afetivo como o Inácio, o Junior, o Ricardo, o Tarso e o Ivan. Se isso ocorre, é indevido porque o comportamento de Berilo é totalmente reprovável. Dentro do estúdio, defendo-o com todas as forças. Procuro todas as razões possíveis que levam Berilo a agir como age. Em cena, tento dar a ele feições de uma pessoa mais atrapalhada com seus sentimentos do que agindo maquiavelicamente. Para isso, me inspirei em O Arlequim Servidor de Dois Amos, de Goldoni.

 

Não posso deixar de perguntar: o coração do Berilo bate mais forte por Agostina ou Jéssica?

A concepção de amor do Berilo é distorcida, mas eu, como intérprete, procuro em cada palavra dos capítulos uma via para amar as duas com a mesma intensidade. Dessa forma, eu deixo a torcida pro espectador. A comédia não exige uma motivação psicológica tão aprofundada quanto o drama. Esse contorno amoroso que dou para as duas personagens é buscado na própria cena em si.

 

Você acha que um homem é capaz de amar duas mulheres?

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Não poderia responder por todos os outros homens do planeta. Até porque, em várias culturas, isso não só é possível como completamente aceito e assumido pela própria lei. No entanto, na cultura ocidental e católica da qual fazemos parte, isso se torna complicado. Na nossa cultura, o melhor a fazer é suportar as frustrações de uma escolha.

 

Atores como Rodrigo Santoro e Selton Mello têm trabalhado bastante no cinema. Mas você não. E faz uma novela atrás da outra. É a TV que não abre mão de você ou é você que prefere esse rumo?

Tenho deixado esse jogo rolar livre, mas isso não quer dizer que eu não tenha pleno domínio das minhas escolhas. Até recebo roteiros, mas ainda não apareceu um personagem que tenha, pelo menos, duas características que considero importantes: uma grande problemática humana para desenvolver e que não seja muito próximo dos que já fiz em outros meios. E é verdade que eu recebo ‘intimações’ na televisão. E o resultado disso é que agarro oportunidades tão bacanas, como esta de trabalhar com um gênio como o Silvio de Abreu.

 

Berilo já está no olimpo da TV, por Jotabê Medeiros

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Casado com Agostina na Itália e com Jéssica no Brasil, o bígamo Berilo (Bruno Gagliasso) é o tipo de malandro que só enrola aquele que quiser ser enrolado. Daí seu charme, já que o núcleo em que transita está cheio de gente pedindo para ser engambelada: Olavo (Francisco Cuoco) e Clô (Irene Ravache) parecem implorar por uma folga da filha ninfomaníaca; e o núcleo italiano está mais ocupado em correr atrás de rabos de saia brasilianos do que em defender Agostina (Leandra Leal) da infidelidade binacional.

Nesse engambela geral, Berilo - um tipo composto por Gagliasso como mezzo-Didi Mocó, mezzo-Roberto Begnini - conquista um posto privilegiado na galeria novelesca brasuca. Assisti-lo em ação imediatamente conduz a uma comédia fantástica de Blake Edwards, Minhas Duas Mulheres (Micky + Maude, de 1984), na qual Dudley Moore faz jornada dupla nas casas de Amy Irving e Ann Reinking, que engravidam simultaneamente. Moore acaba sendo escorraçado por ambas, e o espectador torce para que ambas o perdoem.

A farsa do bom bígamo é um receituário tiro-e-queda da dramaturgia moderna (com uma suave inflexão feminista em Dona Flor e Seus Dois Maridos). Todo oportunismo será perdoado, com uma condição: que o malandro demonstre amor legítimo por ambas. É curioso ver o sucesso de Berilo entre as mulheres, que teriam amplos motivos para detestá-lo - mais de 9 mil deles seguem seu fake no Twitter, o Berilo_Passione (ou "italianinho safadinho", como diz seu perfil).

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Fragolone de olhar de cachorro faminto, Berilo fugiu de bicicleta pela praia, forjou documentos de divórcio, montou-se como um executivo de quinta categoria: tudo pela vida dupla. Só mantinha diálogos francos e sinceros com seus bebês, porque esses não podiam retrucar - seu filho com Jéssica até parecia divertir-se com a canastrice do "pai" de Projac.

Houve exageros no pastelão, mas Berilo/Gagliasso deu um banho (de pijama) na audiência no dia em que dispensou Jéssica (Gabriela Duarte). "Ela tava muito triste", dizia à titular, Agostina, que concordava com todo seu pesar. Agostina (Leandra Leal), se pudesse, faria uma cópia do seu italiano para a outra, generosamente. Essa é a arte de fingir que se vive uma vida que não é a sua (mas que bem poderia ser...)

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