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O pinball vertiginoso do Franz

Grupo escocês alucina no Via Funchal lotado (e com ventilação insuficiente) e reafirma reputação de bom de palco

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Por Redação
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Na sauna superlotada que virou o Via Funchal, na terça à noite, frente a 5,8 mil pessoas, o grupo escocês Franz Ferdinand reafirmou sua reputação como uma das melhores bandas de palco do rock moderno. O Franz consegue aquilo que todos os grupos de rock sonham: reação em massa da plateia, adesão coletiva impressionante, ondas de euforia positivas. A questão é: como se consegue isso?Bom, a julgar pela performance da terça-feira, parece tudo muito simples ? como parece simples explicar um drible de Neymar ou Messi. Um baterista animal na cozinha (Paul Thomson, de sangue rockabilly); um teclado incidental que parece fazer trilha sonora para fliperamas; um cantor de verdade à frente, Alex Kapranos (que se curava de uma gripe); um par de guitarras tocadas com alegria; e composições que evocam desde trilhas de western spaghetti até corinhos dos Beatles. E mais: um empréstimo saudável dos riffs de algumas das melhores bandas de rock"n"roll da História, como Byrds, The Who, Beach Boys.Despidos de supercertezas subintelectuais e sem pose, os rapazes do Franz Ferdinand não deixam que o star system seja maior do que a música. Eles apenas convidam o público a dançar, seja com cadência (como quando fizeram uma versão mais lenta de Walk Away, tirando o pé do acelerador), seja na vertiginosa ladeira em que transformaram Do You Want To, na qual Nick McCarthy castigou a guitarra até estourar (literamente) as cordas.Se a gente prestar bem atenção, notará que há uma grande dose de repetição nas músicas do Franz, às vezes parece a mesma música sempre. São canções deliberadamente simples, com versos modulares, como Can"t Stop Feeling e Take Me Out, No You Girls e What She Came For, todas presentes anteontem à noite. Mas é a pulsão que pega, a energia que imprimem a cada refrão. Esse é o ponto: não são rock stars à velha moda, aqueles que têm um capital de "atitude", "selvageria" e "incompatibilidade" . Entregar o pacote de forma eficiente e sincera é seu negócio.Ola gigante. Kapranos iniciou tudo às 22h19, gastando seu português de ocasião, como convém nesta época de relações bilaterais: "Boa noite, São Paulo!" Foi aos primeiros acordes de No You Girls, a quarta música, que o chão tremeu de fato na Vila Olímpia, com uma ola gigantesca de cabeças balançando na pista. "Hey, mano!", brincou Kapranos.Nick McCarthy encarnava um Jerry Lee Lewis de pinball ao teclado, e Kapranos não economizava na garganta (nem parecia que vinha de um festival de antibióticos). Quem destoava era o baixista, Bob Hardy, que quase não se mexe em cena e, em dado momento, tocava encostado na caixa de música ? é uma espécie de Zé Fernandes do rock.Antes do bis, a banda finalizou com um momento Olodum, com um kit de bateria extra em que todos tocavam simultaneamente, trocando de posições em sentido anti-horário ao redor do instrumento (coisa que o Sepultura inventou lá na época de Roots). Olhando o povo em êxtase, dava a impressão que o velho rock"n"roll ainda pode mudar, nem que seja por 1h30, o jeito como a molecada enxerga o mundo.

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