O filme "Z" de Costa-Gabras sai em DVD

Considerado "subversivo", vocábulo hoje em desuso, mas de larga circulação nos anos 60 e 70, o filme foi proibido no Brasil por fazer críticas à ditadura militar na Grécia

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Por Agencia Estado
Atualização:

O lançamento em DVD de Z, de Constantin Costa-Gavras, é bom pretexto para relembrar a surrealista trajetória do filme no Brasil. Puro exemplar do cinema político e engajado, Z foi sumariamente proibido em território nacional por fazer críticas à ditadura militar na Grécia, país de origem do cineasta. Consta que o filme teria sido exibido no cineminha do Palácio da Alvorada para seu morador, o general Emílio Médici, que então ocupava a Presidência. Foi considerado "subversivo", vocábulo hoje em desuso, mas de larga circulação nos anos 60 e 70. Z foi sendo reapresentado à censura ano após ano e o resultado era sempre o mesmo: veto. Até que em 1980, embalado pelos ventos da abertura, conseguiu ser liberado, 12 anos depois do lançamento internacional. E então o problema inverteu-se. O longa foi considerado próprio para maiores de 14 anos, o que causou protestos dos exibidores. Segundo eles, dessa maneira o filme perderia o impacto de produto forte, proibido e se tornaria inviável comercialmente. Afinal, argumentavam, não adiantava nada liberá-lo para jovens, pois estes estavam mais interessados em praia que em política. No espaço de uma década, de sedicioso agente do comunismo internacional Costa-Gavras tornava-se palatável para surfistas e alunas de colégios de freiras. Cabotinamente, Z passou a ser considerado "uma lição de democracia". Assim é a História, aquela com agá maiúsculo, mais mutável que o clima de São Paulo. E é dessa História que Costa-Gavras costuma se ocupar. A trama inspira-se em fatos reais, a tomada do poder pelos militares na Grécia depois do assassinato do deputado Gregoris Lambrakis, vivido por Yves Montand. Durante um comício, o personagem de Montand é atacado por milícias fascistóides e morre. O interesse em calar um político incômodo tem como contrapartida a conivência da polícia com os agressores. Costa-Gavras "desenrola" a trama descendo aos bastidores da política grega, onde coexistem interesses variados entre corruptos, tiranetes em potencial, brutamontes e membros do Judiciário. Em pauta, a luta pelo poder, que desaguaria no regime dos coronéis gregos. Esse nó de interesses é desatado de maneira ficcional, mas guarda contato direto com a realidade. A sacada desses filmes políticos está na construção híbrida entre o documentário e o thriller. Guardam o verismo de um gênero, aliado à potencialidade de suspense de outro. Essa estratégia (que é também a de outros grandes filmes políticos como Queimada, de Gillo Pontecorvo, Sacco e Vanzetti, de Giuliano Montaldo, e Bandido Giuliano, de Francesco Rosi) foi alvo de críticas. O mínimo que se disse é que Costa-Gavras fazia filmes de mocinhos e bandidos, sendo que para ele os bandidos seriam os fascistas. Comentário simplificador, pois leva a pensar num cinema maniqueísta, característica que não pode ser atribuída a Costa-Gavras. Sua contribuição ao cinema é séria e coerente. Fustigou ditaduras de direita (basta lembrar de Missing, paulada no regime chileno de Pinochet), mas quem o acusava de fechar os olhos para o outro lado das ideologias em conflito foi surpreendido com A Confissão, libelo contra o stalinismo. Seus dois trabalhos mais recentes, O Quarto Poder e Amen, são denúncias contra o poder da imprensa e da Igreja. Mantém-se na mesma linha em que começou. Para quem quer apenas um pouco de diversão, um aviso: Z continua sendo um filmaço. b>Srviço - "Z" (França, Argélia, 1968). Dir. de Costa-Gavras, com Yves Montand, Irene Papas, Jean-Louis Trintignant, Charles Denner. DVD da Versátil.

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