Novo livro de Ellroy é cansativa autópsia dos EUA

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Por Agencia Estado
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Anfetaminas com champanhe ou vodca, essa é a idéia de paraíso de James Ellroy há uns 25 anos. Naqueles tempos em que ele não era um dos mais famosos escritores americanos. O James Ellroy de hoje é bem vestido, bem falante, vegetariano, nos seus 90 quilos e 1,87 m, viajando pelo mundo com sua segunda mulher, a ex-jornalista do L.A.Weekly, Helen Knode, com quem mora num bairro exclusivo em Kansas City. Promove seu novo romance, The Cold Six Thousand, lançado agora nos EUA, ainda sem previsão de edição brasileira. Foi em Kansas City, escolhida por ser tranqüila, que Ellroy escreveu The Cold Six Thousand. "Eu tenho uma imaginação turbulenta, mas vivo uma vida calma e pacífica. Escuto música clássica. Trabalho. É a única maneira de escrever o romance. A história da violência americana nos anos 60", diz o escritor. Ele começa uns poucos minutos depois do assassinato do presidente americano John F. Kennedy, em novembro de 1963, exatamente onde acabou o último best seller de Ellroy, Tablóide Americano. É uma história de tiras que se adaptam facilmente aos ventos que sopram, uma história de Máfia e conspirações, que termina em 1968, com a morte de Robert Kennedy, em Los Angeles. Ellroy nunca primou pela modéstia nas suas declarações. Sobre o novo livro, ele disse ao Los Angeles Times: "É a primeira vez que se vê o mundo real, o submundo dessa era. Levo você a Cuba, Vietnã, Las Vegas. Você encontra J. Edgar Hoover, Martin Luther King, Jack Ruby, Howard Hughes. Minha última obra-prima, cara." O Cassius Clay do neonoir - Contra essas palavras que lembram outro ícone da época, Cassius Clay/Muhammad Ali, que antes, durante e depois de cada luta falava sem parar, quase sempre se auto-elogiando e se chamando de "o maior", há a sensação clara de que Ellroy vem perdendo seu pique, exibido em livros como Dália Negra, Los Angeles - Cidade Proibida, Jazz Branco. Obras bem arquitetadas, perturbadoras, reveladoras de recantos ocultos e perversos da mente humana. O autor passou a complicar cada vez mais as tramas, a usar repetidamente o recurso do fluxo da consciência, a psicologia superficial tomou o lugar da ação, páginas e páginas se limitam a frases de três a quatro palavras, que amarram a ação e cansam o leitor. E o romance cresceu, cresceu até 672 páginas (pelo menos umas 750 em português). Com a pretensão de documentar a decadência do espírito americano nos anos 60, com a guerra do Vietnã e as mortes dos Kennedy e de Martin Luther King. Cold Six Thousand se concentra em três personagens, moralmente ambivalentes. Um advogado da Máfia chamado Ward Littell, o matador anticomunista Pete Bondurant e um tira de Las Vegas chamado Wayne Tedrow Jr. De modo geral, o que o romance diz é que os mafiosos querem o mundo livre do comunismo e querem ganhar dinheiro, não necessariamente nessa ordem. Acham que os Kennedy e King estão atrapalhando e os tiram do caminho. Os três personagens de Ellroy ajudam a Máfia nisso, mas nem sempre de boa vontade. Coadjuvantes famosos aparecem também, como o pugilista Sonny Liston e o ator Sal Mineo Ellroy lembra um pouco Hemingway, homem vencido pelo seu mito. Que permite, com seu machismo exibicionista, com seu ego literário exagerado, que críticos escrevam a seu respeito: "Os durões podem falar duro. Os duros podem falar tipo macho. Mas os durões não podem fazer sentido?" Ellroy hoje não bebe nem toma drogas. Conseguirá vencer o vício de querer ser o Norman Mailer do noir?

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