Novo disco de Marisa Monte propõe o silêncio para refletir sobre a felicidade

'O Que Você Quer Saber de Verdade' recebeu críticas extremadas, tanto positivas como negativas

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Por Redação
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A propósito de Marisa Monte retomar três canções do álbum Mais (Beija Eu, Diariamente e Eu Sei) no novo show, a cantora lembra que aquele álbum e o mais recente, O Que Você Quer Saber de Verdade, receberam críticas extremadas, tanto positivas como negativas. Dessa vez, no entanto, alguns críticos pegaram mais pesado, acusando-a de ter mergulhado no brega ou porque no tempo em que ela ficou "parada" outras cantoras surgiram com trabalhos mais estimulantes. Porém, como seu histórico comprova, Marisa sempre teve esse componente, relacionado à canção popular de amor, seja de Tim Maia ou Roberto Carlos, dois de seus pontos de referência, em sua música. E não para de trabalhar. "Não cabe a mim fazer crítica da crítica, mas meu disco está aí e vai ficar. Gosto de reações apaixonadas como as pessoas tiveram desses dois discos. Mais foi considerado desde uma obra-prima até a maior mediocridade do mundo. Como esse também. Hoje em dia isso não tem a menor importância, porque o Mais está aí, há 20 anos, e fala por si." Para ela, o álbum de 1991 foi muito importante, porque havia grande expectativa depois do impactante CD de estreia, gravado ao vivo e com canções já consagradas, além de pérolas reveladas para mais de uma geração. O álbum mais recente também se seguiu a dois outros muito elogiados, Infinito Particular e Universo ao Meu Redor, lançados simultaneamente em 2006. Ela diz que nunca teve (e não vai começar a ter agora) preocupação com o tempo em que fica, digamos, fora de cena. "Acho que crítica tem muito mais a ver com outros fatores além da música. O tempo de criação é muito subjetivo. Não posso dizer que demorei 5 anos entre um disco e outro. Na verdade, demorei 44 anos para fazer esse disco." Além do mais, os dois de 2006 tinham 27 músicas inéditas. "Depois fiz um ao vivo, que saiu junto com um DVD em 2008, que ninguém lembra. Mas parece que isso não conta muito", ironiza. Nesse tempo ela fez dois anos de shows dos dois discos, um documentário da turnê, e se envolveu na produção do filme O Mistério do Samba, sobre sua relação com a Velha Guarda da Portela. "Depois tive uma filha, o que é uma boa produção também, e preparei um disco novo, que ficou pronto em maio do ano passado e saiu em outubro. Porque hoje em dia você não lança um disco, é um projeto, que envolve internet, vídeos. Tudo faz parte do trabalho do disco. Sou muito produtiva e o fato de eu não estar tão visível por não estar em turnê, para o público pode parecer que não estou fazendo nada. Mas o tempo para as coisas ficarem prontas tem vida própria." Engana-se também quem acha que O Que Você Quer Saber de Verdade é apenas mais um CD com canções românticas. "Não é um disco que fala de coisas simples, nem de amor. É um disco existencialista, que fala muito da vida, profundamente, toca em questões filosóficas, existenciais, sobre com fazer escolhas na vida", diz Marisa. Seu pensamento está explícito nos títulos das canções, como Seja Feliz, O Que Se Quer, O Que Você Quer Saber de Verdade. "E mesmo as que falam de amor, como Ainda Bem e Depois, são canções de bem viver o amor. Depois é uma música de separação feliz, de desapego, de desejar bem ao outro. Nada mais amoroso do que você querer o bem de uma pessoa que você amou e terminou a relação amando, não odiando. Não faz o menor sentido você ficar dez anos casado com uma pessoa e depois querer que ela morra, que ela seja infeliz." Em suma, é um disco que fala "muito de qualidade de vida". "Talvez seja um momento meu de maturidade, de desfrutar a vida. Como tudo na vida, isso pode parecer simples, mas é complexo. Como amar. São assuntos profundos, sofisticados. O disco propõe esse silêncio, para as pessoas pensarem sobre isso."Honestidade. Uma das canções mais positivas do álbum é Seja Feliz, que não entrou no roteiro do show, mas em que há um verso que diz: "Seja feliz com seu país." Marisa não teve intenção de dar conotação política ao verso e observa que o seguinte é "seja feliz sem raiz". Porém, diante de tantas barbaridades recentes na política nacional (caso Cachoeira, o novo Código Florestal, Lula aliado a Maluf, entre outros eternos escândalos), não há como escapar da questão: como dá pra ser feliz com o País hoje? "A gente vive um momento ético complicado, e é uma loucura porque antigamente a gente achava que a esquerda seria uma opção mais honesta e hoje em dia você vê que a honestidade não está nem na esquerda nem na direita. E talvez não esteja no poder, porque acho muito difícil chegar ao poder e não se corromper. Isso é triste de se ver, porque leva a gente a questionar todo o sistema", afirma. "Por outro lado, acho que temos um avanço da informação, que gera muito mais visibilidade pra tudo e talvez a gente tenha mais acesso a tudo o que está acontecendo e pode ser transformador, pela capacidade de mobilização da sociedade. A gente tem o histórico da ditadura militar em que não se podia fazer nada, não se podia votar. Na minha infância não tinha união de estudantes no meu colégio", prossegue. "Hoje vejo que há mobilização em coisas que acredito, que são movimentos apartidários em torno de várias causas, como a parada gay, desligados da política institucional. São iniciativas dos cidadãos unidos e articulados. Isso pode ser transformador, mas leva um tempo. O País cresceu, a desigualdade diminuiu um pouco. Sou brasileira e acredito no Brasil."

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