No CCSP, "Toda Nudez Será Castigada", de Nelson Rodrigues

Montagens da peça, desta vez encenada pelo Grupo Armazém, costumam ser lembradas pelo brilho das atrizes que interpretam a prostituta Geni

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

Quem viu certamente não esqueceu espetáculos do Grupo Armazém como "Pessoas Invisíveis" e "Alice através dos Espelhos", que tinham em comum uma dramaturgia criada pelo grupo, no primeiro caso a partir dos quadrinhos de Will Eisner e, no segundo, do clássico "Alice no País das Maravilhas". Criado em 1987 em Londrina (PR) e radicado no Rio desde 1998, o Armazém tem público cativo em várias cidades, São Paulo entre elas, onde já mostrou muitos trabalhos. Agora, está de volta com "Toda Nudez Será Castigada", de Nelson Rodrigues, montagem bem recebida no Rio, onde ganhou dois prêmios Shell - direção para Paulo de Moraes e iluminação para Maneco Quinderé. "Toda Nudez" estréia nesta quarta-feira no Centro Cultural São Paulo reinaugurando uma prática comum no passado e, infelizmente, rara nos dias atuais - cinco sessões semanais, de quarta a domingo. Só por isso, já mereceria aplauso. Mas o público terá muitos outros motivos para apreciar mais esse trabalho. Montagens dessa peça costumam ser lembradas pelo brilho das atrizes que interpretam a prostituta Geni, desde Cleyde Yáconis, na primeira montagem de 1965, passando por Darlene Glória no cinema e Leona Cavalli, em recente montagem paulistana. Há quem diga que a montagem do Armazém valoriza o personagem Herculano. ´Não concordo. Acho que há entre os personagens um equilíbrio pertinente com sua importância na trama´, diz Moraes. Vivido por Thales Coutinho, Herculano é um viúvo casto, que prometeu ao filho (Sérgio Medeiros) jamais ter outra mulher. Mas por um estratagema de seu irmão Patrício (Fabiano Medeiros) chega bêbado à cama de Geni (Patricia Selonk). Começa assim uma história trágica, contada em ritmo ágil, com diálogos vibrantes em cenas que se sucedem numa dinâmica de prender a respiração. ´É um texto forte, muito bem escrito, ousado na sua fragmentação, a peça que mais gosto do Nelson´, afirma o diretor, que ressalta o talento de frasista do dramaturgo, o que amplia o prazer de ouvir o texto (leia ao lado). Não há pequenos papéis nessa peça de estrutura circular que começa pelo desfecho. Na primeira cena, Herculano recebe um fita gravada por Geni que começa assim: ´Quem te fala é uma morta. Morri. Me matei.´ A partir daí, toda a história se reconstrói a partir das memórias de Herculano, sob estímulo do que ouve. Como em outras tragédias desse autor, os personagens oscilam entre a repressão dos instintos - num desejo impossível de pureza absoluta - e a explosão desses mesmos instintos represados. ´Todo casto é um obsceno´, diz Patrício sobre o irmão Herculano, resumindo esse movimento pendular. Seja para os personagens reprimidos - como as tias - seja para os que trazem os instintos à flor da pele, como Geni, tudo é sexo, e Moraes explora isso em sua encenação. ´Herculano vê o padre e o médico nus, mas isso está na cabeça dele.´ A cenografia, de Moraes e Carla Berri, reforça essa idéia. ´É uma caixa de acrílico, cheia de portas, que remetem às gavetas da memória de Herculano. Essa estrutura, com sua transparência, permite muitos recursos de iluminação, ora remete aos vitrais das igrejas, ora à iluminação dos bordéis, reforçando a oscilação entre o sagrado e o profano presentes no texto´, observa Moraes. ´E colabora muito para o andamento da peça. As passagens de cena são muito rápidas, há muita agilidade na entrada e saída dos personagens.´ Vale conferir. Toda Nudez Será Castigada. 110 min. 16 anos. Centro Cultural SP - Sala Jardel Filho . Rua Vergueiro, 1.000, 3383-3400. 4ª a sáb., 21h; dom., 20h. R$ 12.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.