Nelson Baskerville estreia nova montagem de 'Credores'

PUBLICIDADE

Por AE
Atualização:

Aproximar o enredo de uma peça escrita no século 19 das reflexões sobre as fluidas e inconstantes relações amorosas da pós-modernidade pode soar como um despropósito. Certamente seria, não fosse o autor em questão August Strindberg, observador arguto dos conflitos que a emancipação feminina viria a deflagrar. Uma de suas criações mais conhecidas e reverenciadas, "Credores" estreia nesta quarta-feira, no Sesc Ipiranga, em nova montagem. Desta vez, filtrado pelo olhar anárquico de Nelson Baskerville - diretor que mereceu o Prêmio Shell deste ano pelo espetáculo "Luís Antônio - Gabriela". É a segunda vez que Baskerville se aventura pela obra do dramaturgo sueco. No início do ano, encenou "Brincando com Fogo", comédia em que os vínculos conjugais apareciam esgarçados. E lá, assim como faz agora, não temia intervir com mão pesada em um texto clássico. Reforçava o humor apenas insinuado no original. Tornava ainda mais evidente o ridículo das desavenças entre sexos. "Não tenho nenhum pudor em mexer no texto só porque se trata de Strindberg", afirma o encenador. "Brincando com Fogo foi, de certa forma, um ensaio para o que estou fazendo agora."Em "Credores", Strindberg também está a dissecar as armadilhas do casamento. A diferença está na maneira de fazê-lo: tomado por um ímpeto ainda mais impiedoso e acre. Examina o interior de um triângulo amoroso. Flagra as fragilidades de um homem apaixonado, põe em evidência os cruéis mecanismos de poder e dominação que regem o território que tanto nos esforçamos para imaginar idílico. Nesta versão da Cia. Mamba, uma quarta personagem surge para atenuar o cenário de opressão que cerca a protagonista feminina. Mas não esgota a carga de misoginia que embalava Strindberg. Passado mais de um século, o propalado discurso da igualdade não conseguiu apagar o fato de que o acordo de monogamia permanece a ter dois pesos e duas medidas. Outra diferença está na ambientação e na linguagem. Ainda que não haja referências temporais, a trama parece transportada à contemporaneidade. Ressoa incomodamente próxima, cotidiana. Tanto, que poderia ser a leitura fictícia de "Amor Líquido", o terrível diagnóstico que o sociólogo Zygmunt Bauman escreve sobre a precariedade dos atuais laços afetivos. "Foi preciso livrar-se da linguagem empolada para chegar à verdade", acredita Baskerville. "Não se trata de modernizar. Não é necessário fazer isso. Apenas considerar com que olhos o público de hoje está assistindo a essa peça." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.CREDORESSesc Ipiranga (Rua Bom Pastor, 822). Tel. (011) 3340-2000. 3ª a 5ª, às 21 h (feriados, às 18 h). R$ 16. Até 13/12.

Tudo Sobre
Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.