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Nanini faz 35 anos de carreira na TV

As atrizes Marília Pêra e Marieta Severo; o diretor Guel Arraes; os cineastas Helvécio Ratton e Carla Camurati e a crítica teatral Bárbara Heliodora vão falar sobre o ator (na foto, como Irma Vap) que transita da tragédia à comédia com pleno domínio de sua arte

Por Agencia Estado
Atualização:

Comediante no sentido francês do termo - intérprete com talento para transitar da tragédia à comédia com igual domínio de sua arte -, Marco Nanini faz um balanço de seus 35 anos de carreira no programa Retratos Brasileiros, que vai ao ar nesta segunda-feira, às 20 horas, no Canal Brasil. As atrizes Marília Pêra e Marieta Severo; o diretor Guel Arraes; os cineastas Helvécio Ratton e Carla Camurati e a crítica teatral Bárbara Heliodora estão entre os profissionais convidados a falar sobre o ator. E claro, o próprio Nanini, com o humor que lhe é peculiar, relembra sua trajetória profissional desde os tempos de teatro amador e também a fase de estudante no Conservatório de Teatro, onde ingressou sonhando em ser um ator "trágico". E conta histórias divertidas de bastidores, entre elas a angústia diante do chamado "branco" que o assaltou numa das apresentações de Irma Vap - "o texto não vinha" - ou a cena que o obrigou a comer frango durante horas seguidas, no set de filmagem de Carlota Joaquina, Princesa do Brazil, de Carla Camurati. Semana passada, Nanini conversou com a Agência Estado sobre recentes e futuros projetos. Falou de seus personagens nos filmes Copacabana - também dirigido por Carla e que deve estrear em breve - e Tempestade Cerebral, de Hugo Carvana, cujas filmagens começam no dia 7. E apontou - com extrema lucidez - ações de política cultural que, se criadas, certamente propiciariam novo fôlego ao teatro brasileiro. Nanini possui dois apartamentos, um no Rio e outro em São Paulo. Quando está entre os paulistanos, costuma caminhar pela Av. Paulista, com paradas quase obrigatórias no Masp e na Livraria Cultura. Mas, no momento, não tem conseguido sair do Rio. Além das gravações da série A Grande Família - que vai ao ar sempre às quintas-feiras -, está às voltas com aulas de piano para interpretar o músico Apolônio Brasil, personagem central do filme de Carvana. O ponto de partida do filme pareceria meio absurdo caso não vivêssemos numa época em que ratos ganham orelhas humanas. Um cientista estrangeiro interpretado por José Lewgoy vem ao Brasil em busca do cérebro de um pianista já morto. Seu objetivo é extrair um pedaço do órgão para criar uma "poção de humor", elemento que, por algum fenômeno não facilmente explicável, parece ser abundante no Terceiro Mundo e pode ser vendido a bom preço no mercado europeu. "Quando o filme começa, meu personagem já está morto. Era um pianista da noite, sujeito bem-humorado, um bon vivant, de temperamento leve, querido por todos", define o ator. Conforme o cientista investiga sua vida, entrevistando amigos, parceiros de profissão e ex-mulheres, o músico aparece em cenas de flash-backs. Nada que Nanini não pudesse interpretar com um pé nas costas. O problema é a dublagem ao piano, instrumento que o ator vem estudando há meses. "Estou enlouquecido. Horas antes das aulas já estou em pânico." Não que o públicio vá ouvir o som do piano na interpretação de Nanini - "pelo amor de Deus, não" -, mas em alguma cenas ele "dubla" o som tirado das teclas pelo pianista Leandro Braga. "É dificílimo. No momento estou aprendendo as regiões do som no teclado, mas terei de aprender nota por nota." Tempestade Cerebral começa a ser filmado em junho e Nanini deve gravar todas as suas cenas em apenas um mês. "Mas foram muitos meses de preparação." Apesar de tudo, o ator confessa ser essa a parte que mais gosta em todo trabalho. "Fico profundamente absorvido, adoro essa fase e o aprendizado que sempre traz." Não foi diferente com Copacabana, filme no qual interpreta um homem de 90 anos. "Começo uma pesquisa desse tipo sem saber aonde vai dar. A investigação vai dando novas pistas, mudando o planejamento inicial." O bairro de Copacabana, no Rio há muito abriga uma grande quantidade de moradores da terceira idade. O filme aborda a vida dessa população, gente que gasta parte do dia em um carteado com amigos na praça, caminha pelo calçadão, relembra os bons tempos das festas num papo de bar. Nesse caso, a tortura maior não foi diante de um piano, mas sim numa sala de maquiagem para transformar-se no velho Alberto, um fotógrafo aposentado. "Eram horas de imobilidade total, não podia nem ao menos ler", relembra. Apesar das rugas, Alberto está longe de ser um velho alquebrado. "Pelo contrário, ele é um velho faceiro, de bem com a vida." O filme retrata uma realidade ainda pouco explorada nas telas, aquela parcela da população - ainda pequena, mas já existente no País - que envelheceu sem perda de qualidade de vida. O ritmo industrial da televisão, não é segredo para ninguém, dificulta, por vezes até impede, a pesquisa em torno de personagens. Por isso mesmo, Nanini está feliz com sua participação no seriado A Grande Família, no qual interpreta o chefe da família, o senhor Lineu. "O elenco reúne-se toda terça-feira. A gente assiste ao programa, discute as atuações, comenta a repercussão. Para mim, isso é uma novidade em televisão e estou achando ótimo." Palco - Por outro lado, toda essa atividade adiou os planos para voltar ao palco. Mas não por um tempo muito grande. Nanini planeja começar em novembro os ensaios de espetáculo sob a batuta de Felipe Hirsch, diretor de A Vida É Cheia de Som e Fúria. No mesmo mês, estréia no Rio Jantar entre Amigos, também sob direção de Hirsch, com Renata Sorrah e Xuxa Lopes no elenco. Por que essa súbita paixão coletiva por um diretor? "Realmente há uma fila de gente querendo trabalhar com ele; não sei bem explicar por que isso acontece. Ele é um bom diretor, muito informado, cheio de idéias e um bom diretor de atores, característica cada vez mais rara", comenta Nanini. Mas ressalta não ser o único com essas características e lembra, entre outros, Aderbal Freire-Filho, que o dirigiu em Mão na Luva. "Adoro o Aderbal, há tempos estamos namorando a idéia de uma nova parceria." Quanto à peça que fará com Hirsch, ambos não escolheram ainda um texto. "Ainda está longe, temos tempo." Nesse caso, é preciso ter tempo. A produção de um espetáculo teatral tem se tornado cada vez mais complicada, mesmo para um ator como Nanini. "As leis de incentivo têm aspectos positivos, mas são também perversas. Eu não tenho talento para captação, precisaria aprender essa matéria, que não foi ensinada no meu tempo de escola de teatro." Os prêmios, o currículo de 32 peças, 13 filmes e 15 novelas de nada lhe valeram no momento de captar recursos para Últimas Luas, monólogo escrito e dirigido por João Falcão. "Tive de vender imóveis. Só conseguimos um patrocínio no fim da temporada." Marco Nanini acredita que a democratização do teatro deveria ser a principal meta da boa política cultural, por meio de ações de sensibilização para o teatro. "Campanhas de barateamento de ingresso acabam por não atingir a população que não tem o teatro como prática cultural." Segundo ele, o teatro deveria estar nos currículos escolares, com a prática constante de leituras de peças, dramatizações e montagens. "Não importa se as pessoas não vão continuar na profissão. Antes de mais nada, todo mundo pode fazer teatro, é um jogo lúdico muito bom, sensibiliza a fantasia, a imaginação e sobretudo, proporciona um grande prazer." Ele ressalta ainda que a prática teatral exige a atuação de profissionais como cenotécnicos, costureiros, marceneiros, iluminadores. "Pessoas descobririam talentos que nem imaginam ter." Claro que, depois de atuar em Hamlet ou Navalha na Carne na escola, a curiosidade de conferir a atuação de um ídolo num dos papéis dessa peça seria bem maior. "Deveria haver uma política cultural voltada para a formação de público. Atualmente nossos espectadores vêm apenas de uma faixa reduzida da classe média."

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