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Musical no Rio revive a chanchada

Nossos tempos de Hollywood são revividos pela mesma companhia que levou ao palco, no ano passado, a biografia de Dolores Duran, no musical Atlântida - O Reino das Chanchadas que estréia no Rio

Por Agencia Estado
Atualização:

A Praça Tiradentes, no centro do Rio, vai reviver o tempo em que sonhávamos ter uma Hollywood tropical. Estréia nessa quinta-feira, no Teatro Carlos Gomes, o musical Atlântida - O Reino das Chanchadas, com a mesma companhia que levou ao palco, no ano passado, a biografia da cantora e compositora Dolores Duran. O espetáculo conta uma história ingênua com nuances de intriga policial para lembrar como se fazia cinema no Brasil nos anos 50 e homenagear os grandes atores, atrizes e diretores da época em que, pela primeira vez, tivemos uma indústria cinematográfica. As atrizes, produtoras - e agora também autoras - Ana Velloso e Vera Novello, responsáveis pelo texto de Atlântida não têm idade para lembrar desses anos dourados, mas descobriram um veio rico a ser explorado pelo teatro musical. "É um tipo de espetáculo que sabemos e gostamos de fazer, sobre um período que achamos importante recordar e com um público ávido por reavivar a memória", diz Vera. Juntas, elas fizeram sucesso nacional, no ano passado, com Dolores, quando já tinham no currículo Rio Que sempre Riu, sobre Walter Pinto, Você não Passa de uma Mulher, uma antologia sobre o sexo frágil na música popular brasileira, e Pixinguinha, sobre nosso maior chorão. "Procuramos sempre o mesmo esquema, juntando músicas e esquetes que vão contando a história", explica Vera. Em Atlântida, o formato foi ideal, pois assim eram contadas as histórias nas chanchadas, aqueles filmes preto-e-branco dos anos 50 em que a mocinha e o galã se metem num imbróglio cômico-policial, ao som de números musicais precursores dos atuais videoclipes. "De propósito, as cenas são meio soltas, mas os personagens se parecem com os ídolos da época. Tem a mocinha que lembra a Eliana (vivida por Tatiana Telink), a melhor amiga que homenageia Adelaide Chiozzo (Ana Velloso), a nordestina despachada com traços da Sônia Mamede (a própria Vera) e o cômico vindo do circo, para falar de Oscarito (Marcelo Mello)." O diretor De Bonis também tem experiência nesse tipo de espetáculo que trabalha com nossa memória musical. Responsável pela direção-geral de Dolores, no ano passado, ele conta que passou a infância dentro dos cinemas assistindo às chanchadas e nunca deixou de se sentir atraído pela precariedade da produção que acabou virando um estilo. Na época, criticado pela intelectualidade brasileira, que via nele cópia pobre e malfeita dos filmes americanos, é hoje incensado como arte brasileira. Para relembrar esse estilo, foi preciso uma grande produção, com 12 atores/bailarinos/cantores no palco, músicos tocando ao vivo e cerca de 40 pessoas nos bastidores. Os cenários (Sérgio Marimba), figurinos (Ney Madeira), e iluminação (Maneco Quindaré) reproduzem o visual de fotografia preto-e-branco das chanchadas, quando as cenas desenvolvem o enredo, mas os números musicais são em cores, pois mostram como os filmes eram rodados. As músicas são as da época. Marchinhas de carnaval, sambas, boleros e pré-bossa nova, que ficaram na memória do público, com arranjos de hoje, mas sem modernidades. "Pedimos ao diretor musical, Leandro Braga (o mesmo de Somos Irmãs, sobre Linda e Dircinha Batista), para ser fiel ao clima", avisa Vera. Divulgação"Procuramos sempre o mesmo esquema, juntando músicas e esquetes que vão contando a história" Ela e Ana Velloso começaram a pensar em Atlântida antes de estrear Dolores. Com a peça em cartaz, pesquisaram o que havia sobre a produtora, especialmente os livros Este Mundo é um Pandeiro, de Sérgio Augusto, e As Grandes Personalidades do Cinema Brasileiro, de Eduardo Gifoni, jornalista e atual curador do acervo da Atlântida. Remanescentes daquela época também deram entrevista para que as autoras pudessem montar o cenário em que a história se passava. Só o diretor Carlos Manga não pôde falar, sobrecarregado com seu trabalho na TV Globo. Ele é, talvez, o único profissional da Atlântida ainda em atividade, mas torce de longe para o sucesso do musical. "Mandou-nos inúmeros bilhetes desejando boa sorte" revela Vera. Com tanto subsídio, foi preciso fugir do factual para ser fiel aos fatos. "O material era tão rico que, para não ficar didático demais, optamos por criar uma ficção, em que cada personagem real aparecesse, não de forma explícita, mas revivido por outro da história, conta Vera. "Só Grande Otelo ficou de fora porque sua família pediu muito alto pelo direito de imagem. Achamos que não seria justo pagar só à família dele e incluir todos prejudicaria nosso orçamento." As experiências anteriores em musicais facilitaram a produção. O texto tem momentos para cada ator brilhar individualmente e/ou em grupo e o sucesso de Dolores trouxe o patrocinador. "Antes de estar decidido que faríamos Atlântida a prefeitura do Rio quis ser nossa parceira no projeto deste ano", comenta Vera. Do orçamento inicial de R$ 350 mil, foi possível economizar muito, usando a infra-estrutura do Teatro Carlos Gomes, que é municipal, enquanto empresas privadas deram apoios indispensáveis. "A tecidos Werner, que ganhou o Prêmio Shell no ano passado, por exemplo, nos deu tudo o que era necessário para cenários e figurinos e a Brascan forneceu a estrutura metálica." Atlântida - O Reino das Chanchadas terá temporada de seis semanas no Carlos Gomes e depois deve seguir carreira em outros teatros cariocas. Em meados do ano que vem, Ana e Vera pretendem viajar com o musical, tal como aconteceu com Dolores. E, já que este espetáculo está quase pronto, elas já começam a sonhar com o próximo. "Em 2002, queremos levar para o palco a vida de Clara Nunes, uma cantora muito importante de um período riquíssimo da música brasileira", adianta Vera Novello. "Vamos começar as pesquisas assim que Atlântida estrear."

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