Museu da Língua Portuguesa recebe mostra de Oswald de Andrade

Exposição usa conceito antropofágico para revelar as faces do escritor paulistano

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Foto do author Antonio Gonçalves Filho
Por Antonio Gonçalves Filho
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Em cinco anos e meio de existência, o Museu da Língua Portuguesa nunca fez uma exposição de um autor paulistano. Hoje, às 19 horas, suas portas serão abertas para os convidados de uma mostra em homenagem ao primeiro deles, Oswald de Andrade: o Culpado de Tudo, que ficará aberta para o público de amanhã até janeiro de 2012, um mês antes das comemorações dos 90 anos da realização da Semana de Arte Moderna de 1922, da qual o escritor foi um dos mentores. Não se trata de uma mostra museológica no sentido tradicional. Nem poderia. Oswald de Andrade (1890-1954) odiaria uma exposição com muitos objetos e poucos roteiros, ele que aconselha o leitor do seu Manifesto Antropófago (1928) a reagir contra todas as catequeses e acreditar nos sinais. Assim, o curador José Miguel Wisnik, poeta, músico, professor, ensaísta - enfim, um homem multidisciplinar como o homenageado -, preferiu estabelecer um roteiro para os visitantes que cobre todos os períodos da vida do escritor, da infância ao triste epílogo da trajetória do autor de Serafim Ponte Grande. Esse roteiro começa com painéis ilustrados por meio de textos e desenhos extraídos do poema As Quatro Gares (1927), escrito um ano antes do Manifesto Antropófago. Eles introduzem o visitante no roteiro traçado por Wisnik com as quatro fases da vida do modernista: a do pirralho abastado sob as ordens da mamãe (1890-1919), a do vanguardista que revolucionou a literatura e ajudou a introduzir a modernidade artística no Brasil (1920- 1929), a do revolucionário que abraçou causas populares (1930-1945) e, por fim, a fase da utopia, em que Oswald, no seu último decênio (1945-1954), tenta retomar o ideário antropofágico e cai no ostracismo, sendo recuperado nos anos 1960 pelos poetas concretos e os criadores do movimento tropicalista. O movimento que o visitante fará na exposição é circular. Tudo volta ao mesmo ponto, afinal, na vida de Oswald. Wisnik recorre a uma correspondência analógica, a do sambódromo, para explicar o desfile que organizou, começando com as quatro gares da vida, passando pelo carrossel amoroso de Oswald - outra sessão cíclica com suas nove mulheres - e chegando à apoteose, sua afirmação da antropofagia cultural. Por esse carrossel passou a bailarina americana Isadora Duncan (1877-1927), que dançou "quase nua" para ele em Osasco. O círculo fecha-se com a última esposa, Maria Antonieta d'Alkmin, sua sexta mulher, que tinha características próximas à da figura da mãe, Inês Henriqueta Inglês de Sousa Andrade. Oswald não escapou de Freud e da própria ficção. Vagou de porto em porto como os passageiros de sua nau dos insensatos em Serafim Ponte Grande. Essa inconstância teve um preço amargo. No carrossel das amantes, duas figuras se destacam: a de Deise, poeta que frequentava a garçonnière de Oswald na Rua Libero Badaró - morta aos 19 anos, em consequência de um aborto malsucedido - e a bailarina Landa Kosbach, que conheceu em 1912, numa viagem de navio ao continente europeu (ela se tornaria, na maturidade, a professora de dança de sua filha Marília). Por causa de Landa, que tinha 16 anos na época, o impulsivo Oswald foi acusado publicamente de pedófilo.

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