Mostra revê pintura moderna antes de 1922

Acervo de 1,5 mil obras de Sérgio Fadel traçam um panorama da arte brasileira, que antecede ao Modernismo em exposição no CCBB do Rio de Janeiro

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Por Agencia Estado
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A exposição Arte Brasileira na Coleção Fadel, que começa nesta terça-feira, para convidados no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), defende uma premissa do curador Paulo Herkenhoff, endossada pelo dono das obras, o advogado Sérgio Fadel: a Semana de 22 não deu início ao Modernismo no País, pois desde o fim do século 19, artistas haviam aderido ao movimento. "Reunimos obras do Impressionismo ao Neoconcretismo, rupturas que deram início e fim à arte moderna nacional", diz Herkenhoff. "O ano de 1922 ficou como fetiche, até porque no ano em questão, não foram produzidas obras significativas." Mesmo quem não aceita a tese, concorda que, ao longo de quase 40 anos, Fadel reuniu, em seu acervo de 1,5 mil obras um panorama da arte brasileira. "Só se iguala à coleção de Gilberto Chateaubriand, que está no Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio, e a do Museu de Arte Contemporânea (MAC), de São Paulo" comenta Herkenkoff, que veio de Nova York, onde é curador também do MoMA para organizar esta mostra e lançar o catálogo, em que discute a questão através de 16 ensaios temáticos. "Assim, o público terá duas visões da história da arte moderna brasileira." Fadel começou sua coleção em 1964, já com artistas importantes: um retrato do jornalista Roberto Rodrigues (irmão do dramaturgo Nelson Rodrigues) feito por Cândido Portinari e uma marina de José Pancetti, reproduzindo Cabo Frio, no litoral fluminense. "No início, visava mais à valorização e conhecia pouco a arte brasileira. Depois, fui estudando, lendo, ouvindo artistas e críticos amigos e adquiria o que me agradava mais", conta Fadel. Herkenhoff levou para o CCBB 160 obras, que estarão espalhadas em seis salas, não cronologicamente, mas por temas, tendo sempre em mente a tese de que a Semana de 22 é um marco artificial, mas que a arte brasileira libertou-se dos movimentos internacionais com o Neoconcretismo. "Até então, nossos artistas adaptavam idéias importadas. Mesmo Tarsila do Amaral, ao pintar "Morro da Favela", aplicava aqui teorias de Léger. Só Lygia Clark, a partir obras como "O Bicho" e "A Quebra da Moldura", e outros neoconcretistas buscaram referências nossas", ensina o curador. "Com a mostra e o catálogo quero propor uma história da arte não como seqüência de estilos, mas um legado de questões às quais nossos artistas apresentaram soluções." Os quadros citados estão na mostra, ao lado de obras fundamentais como "Tiradentes" e "Anoitecer", de Alberto Guignard, "Maternidade em Círculos", de Belmiro de Almeida, pioneiro no Abstracionismo brasileiro, além de quadros de Volpi, Castagnetto e Eliseu Visconti. A organização é didática. A primeira seção, "Modernismo e Abstração", tem obras como "Onda", de Anita Malfatti, e "Descoberta da Linha Orgânica", de Lygia Clark. Em seguida, "Pintura e História" mostra o caminho percorrido pela arte da predominância do positivismo em Pedro Américo à interpretação do materialismo histórico de Guignard e Segall. "Noturno Brasileiro", a terceira seção, tem paisagens feitas por Djanira e Castagneto, enquanto a seção dedicada à "Cor Moderna" tem como destaque a "Favela", de Tarsila, além de quadros de Di Cavalcanti e Volpi. Há retratos, até mesmo um de Burle Marx feito por Flávio de Carvalho (do qual há também um auto-retrato) e outro de Mário de Andrade, pintado por Anita Malfatti. "O livro é um desafio diferente, que tenta desestabilizar verdades consagradas na arte brasileira", adianta Herkenhoff. Não por acaso, a capa é uma reprodução da "Maternidade em Círculos". "Esse quadro é uma experiência abstrata de 1908, 14 anos antes da Semana de 22." Fadel conhece a importância da coleção. Empresta obras para cerca de 50 mostras por ano, embora só tenha realizado uma de seu acervo há dez anos, com ênfase no período anterior ao Modernismo. "Um conjunto desse deve ficar à disposição do público. Só preciso encontrar quem cuide dele corretamente", confessa ele, que busca uma instituição que receba as obras em comodato, tal como acontece com Gilberto Chateaubriand e o MAM do Rio. Houve contatos nesse sentido no primeiro mandato do prefeito César Maia, que progrediram quando Luiz Paulo Conde o sucedeu. "Com a mudança do governo, as conversas pararam. Mas ainda tenho essa intenção."

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