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Mostra reúne produção cultural dos anos 70

O Itaú Cultural levou mais de um ano de planejamento para gestar Anos 70: Trajetórias, exposição que mapeia a produção cultural daquele período

Por Agencia Estado
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Desenterrem aquela sandália de couro com sola de pneu, a camiseta com a estampa do Mr. Natural, o disco dos Mutantes, o exemplar amarfanhado do Pasquim, a figurinha carimbada do Rivelino: os anos 70 estão voltando! E, dessa vez, não se trata apenas de uma coisa de pele, ou de décor, para ser menos preciosista. O Itaú Cultural - e sua equipe de 12 curadores e pesquisadores - levou mais de um ano de planejamento para gestar Anos 70: Trajetórias, um mapeamento da produção cultural daquele período. Uma produção que Ricardo Ribenboim, diretor-superintendente do Itaú Cultural, chama de "cultura de fresta", produzida sob a vigilância estreita do Ato Institucional Número 5. São 180 filmes (realizados em Super-8 e que serão mostrados em vídeo) do período, além de 200 poemas de 78 escritores, a reedição do célebre espetáculo Banquete dos Mendigos, no Teatro Municipal, a estréia de espetáculo de dança de Lia Rodrigues baseada na produção de Lygia Clark e a abertura do website de Hélio Oiticica, entre inúmeras manifestações. Não se trata de um tour de force com apelo nostálgico, diz Ribenboim. O mergulho na cultura produzida nos anos 70 surgiu a partir da constatação que não existe documentação suficiente sobre o período. Não de uma maneira sistemática ou científica ou mesmo ensaística. "Uma das coisas notáveis dos anos 70 é que estivemos articulados ao nível das vanguardas internacionais", diz Celso Favaretto, coordenador-geral dos eventos. "As artes brasileiras desenvolveram-se nas diversas direções - particularmente as artes plásticas - e produziram singularidades, especificidades" lembra Favaretto. A particularidade estava na conjuntura política. Os artistas brasileiros viviam espremidos pela ditadura. Era preciso radicalizar a experimentação para poder se expressar. Embora em simultaneidade com o que se produzia em Milão e Paris, a arte brasileira dos seventies também foi diferente em outro aspecto: o da evidenciação. Não conseguiu transpor fronteiras de mídia - apesar dos casos conhecidos de gente como Lygia Clark, Antonio Dias, Gershman e do próprio Oiticica. Vasculhar os arquivos do período foi o desafio dos curadores. Rubens Machado Jr. examinou cerca de 600 filmes de Super-8 do período. Selecionou 180 para mostrar em vídeo. Lisette Lagnado trabalha desde 1999 na produção teórica de Hélio Oiticica (1937-1980), documentos e apontamentos que ele deixou - demonstrando, como ela diz, uma vontade de sistematizar sua produção. Os cartunistas Jal e Gualberto Costa fazem uma "escavação arqueológica" nas principais revistas do período (como os nove pioneiros números da revista Balão, surgida na USP) para definir como se cristalizou o moderno cartum nacional. Fazem isso em um ateliê de criação, preparado para receber os visitantes da mostra. Na área literária, foi organizada uma antologia virtual dos anos 70, centrada com grande ênfase naquela que ficou conhecida como "geração mimeógrafo". Os visitantes terão à disposição 108 poemas de 29 autores, incluinto Torquato Neto, Wally Salomão, Ana Cristina César, Bernardo Vilhena, Jorge Mautner, Paulo Leminski e Alice Ruiz, entre outros. Na sala especial Literatura Marginal e Fac-símile, o visitante poderá manusear cópias xerox de livros de Chacal, Cacaso e Nicolas Behr, entre outros expoentes da chamada "poesia alternativa". Também será mostrada a publicidade da "década perdida", num esforço curatorial de Washington Olivetto, evidenciando os signos do período - comportamentais a políticos. O crítico e historiador de arte carioca Frederico Morais é um dos convidados especiais do evento. Ele protagonizou, em 1971, os chamados Domingos da Criação, no Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio de Janeiro. Esses acontecimentos, pioneiros exemplos da arte-educação no País, serão revistos em fotografia e slides.

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