Morre o professor e escritor Roberto Ventura

Biógrafo de Euclides da Cunha e professor de teoria literária, ele morreu hoje de madrugada, aos 45 anos, ao bater o carro contra um caminhão em Mogi-Guaçu

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Por Agencia Estado
Atualização:

Professor de Teoria Literária da USP e biógrafo de Euclides da Cunha, Roberto Ventura morreu hoje em um acidente de carro, na Rodovia Adhemar de Barros (SP-340), em Mogi-Guaçu. Ventura, de 45 anos, seguia para a capital, por volta das 2 horas, voltando de São José do Rio Pardo, onde participava da Semana Euclidiana. Seu Passat colidiu com a traseira de um caminhão, com placas de Governador Valadares, de Minas Gerais. A SP-340 tem pista dupla nos dois sentidos em Mogi. O carro de Ventura e o caminhão seguiam na mesma faixa, da direita, no sentido interior-capital. O motorista do caminhão, Marcos Antônio Ferreira da Silva, contou à polícia que percebeu um impacto na traseira e parou o veículo para verificar o que havia ocorrido. Ele viu o carro de Ventura na pista e chamou a Polícia Rodoviária. Nos setes meses deste ano, ocorreram seis acidentes com vítimas fatais nesse mesmo trecho de Mogi-Guaçu. Desde sexta-feira da semana passada, Ventura era uma das figuras mais presentes da Semana Euclidiana. Primeiro, porque seria dele a obra mais esperada para o centenário de publicação de Os Sertões, uma nova biografia do escritor. Segundo, porque ele transitava como poucos entre os estudiosos de várias gerações e correntes e familiares do escritor, fazendo uma intermediação muitas vezes difícil, mas necessária. Terceiro, porque não se furtava a participar de nenhum debate. Terça-feira, à tarde, durante mesa-redonda sobre Canudos antes e depois da guerra, ele pediu a palavra e, entusiasmado, começou: "Tenho sete questões a fazer." Debateu longamente sobre datas de documentos e diferenças entre a cobertura de Euclides para o jornal O Estado de S. Paulo, em artigos escritos em 1897, e o que o escreveu em Os Sertões. Nas conversas na Estufa, restaurante em que os pesquisadores presentes ao evento costumam se encontrar, Ventura era presença garantida. Não se furtava a conversar com ninguém e distribuía seu e-mail e telefone sem parcimônia, sempre pronto a ajudar e receber informações. Também sugeria visitas a seu apartamento, localizado no Sumaré, em que está boa parte do material que estudou. Discutindo a vida de Euclides com Manoel Neto, no mesmo restaurante, e a morte do escritor pelo militar Dilermando de Assis, afirmou que essa era uma história em que "todos sofreram muito" e "não se devia fazer julgamentos morais". Recontou os últimos dias de Euclides, fez comentários, divagações, especulações, etc., discutindo o material que recolhe há quase uma década. Terça-feira, não era para ele estar em São José do Rio Pardo. Inicialmente, sua viagem deveria terminar no domingo. Na segunda, ele deu aula na Unicamp, convidado por Francisco Foot Hardman, também presente na Semana Euclidiana. Voltaria a São Paulo, mas decidiu retornar a Rio Pardo para fotografar documentos expostos na Casa de Cultura Euclides da Cunha, para o seu trabalho. Disse, então, que pretendia voltar ainda na terça porque tinha compromisso às 10 h em São Paulo e não queria deixar a viagem para a manhã. Hoje, logo depois de saber da morte do pesquisador, o diretor da Casa de Cultura Euclides da Cunha, Álvaro de Oliveira Neto, disse que planejava seguir com a programação, embora ainda fosse discutir o que fazer com os professores presentes. "Não sei o que se pode fazer em sua homenagem, tudo será pouco. No mínimo, posso garantir que ele será o homenageado da edição de 2003 da semana", afirmou. "Ele era uma pessoa especial para a casa euclidiana; na hora que se despediu de mim, me disse que tinha sido a melhor semana da vida dele." Ventura escreveu também Estilo Tropical, um estudo sobre o debate intelectual no fim do século 19, enfocando a literatura e as teorais raciais em voga na época.

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