Montagem encena história de amor na maturidade

Intimidade Indecente, de Leilah Assumpção, conta a história de um casal que se separa aos 50 anos e volta a se reencontrar com o passar do tempo

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Por Agencia Estado
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Nem a experiência de 32 anos no teatro livrou a dramaturga Leilah Assumpção de sentir o nervosismo que antecede uma estréia. Autora de textos notáveis (Fala Baixo Senão Eu Grito, Roda Cor-de-Roda) que têm o mesmo fio condutor (a polêmica discussão do papel feminino), ela acompanha nesta sexta-feira o início da temporada de sua mais recente obra, Intimidade Indecente, no Teatro Renaissance. Mais que a excitação por finalmente assistir à encenação de sua nova peça o temor de Leilah é por se sentir solitária naquela dramaturgia que questiona prazer e poder. "Sinto falta de Plínio Marcos, que escrevia com o mesmo foco", confessa. "Gostaria que ele ainda estivesse nesta batalha." Um dos principais nomes a colocar em cena inquietações de ordem sexual e psicológica, Leilah, que já tratou da mulher reprimida (em Fala Baixo...) e questionou a instituição familiar (Roda Cor-de-Roda), discute agora uma história de amor na maturidade: aos 50 anos e com a independência financeira consolidada, Roberta e Mariano decidem se separar. O motivo é a descoberta de que o marido sente-se atraído por uma amiga da filha. A discussão do casal abre o espetáculo e já aponta um dos temas discutidos pela autora. "Roberta mostra que não é independente apenas economicamente, mas que consegue viver sem a presença de um homem", conta Leilah. A partir daí, são apresentados sucessivos reencontros quando os personagens estão com 60, 70 e 80 anos. São momentos em que a fragilidade e a forma de se relacionar são colocados em discussão. É quando também a autora passa a explicar o título da peça. "Toda intimidade é indecente, pois a mulher tem vergonha de aparecer sem maquiagem para o marido e este prefere, muitas vezes, o sexo à meia-luz", comenta Leilah. "Por isso, alguns diálogos são crus e poderão chocar algumas pessoas." Ela se refere, por exemplo, às críticas de Roberta sobre a anatomia sexual do marido e aos comentários dele a respeito do envelhecimento físico da mulher. A trama de Intimidade Indecente remete à uma peça ainda não encenada de Plínio Marcos, o que justifica o afeto de Leilah por sua obra - em "A Dança Final," o dramaturgo mostra um casal nu, na cama, depois de uma relação sexual frustrada. Ele, com 60 anos, discute com ela, de 50, sobre a inesperada crise de impotência. Um tema forte, em que a crise sexual corresponde ao fracasso existencial. "Já a Leilah prefere se voltar para as formas de relacionamento humano", observa a atriz Irene Ravache, que interpreta Roberta na montagem que estréia amanhã. "E, ao contrário de anos passados, em que a contestação exigia uma ruptura completa, agora ela pode escrever um final feliz sem constrangimento." A afinidade entre Irene e Leilah já dura 25 anos. O ponto de partida foram os ensaios de Roda Cor-de-Roda, em que a atriz interpretou a personagem principal Amélia, em 1976. "Descobrimos ter as mesmas angústias e, se eu me transformei em uma leitora analítica de seus textos, ela é uma excelente crítica de minhas interpretações", conta a atriz. A autora também enviou, ao longo dos ensaios, faxes com comentários para Irene, ao ator Marcos Caruso, que interpreta Mariano, e para a diretora da peça, Regina Galdino. "São cuidados especiais, pois ela construiu um personagem masculino extremamente rico", comenta Caruso. "Mariano é o típico brasileiro, preocupado com sexo, juventude, futebol e que, ao envelhecer, se descobre com baixa auto-estima." A franqueza com que é tratado o relacionamento é, segundo o ator, um dos pontos altos da criação dos personagens. "Mesmo separados, Roberta e Mariano continuam se encontrando e, se conseguem tratar de assuntos delicados aos 80 anos, é porque começaram a fazer terapia aos 50, um assunto que não é habitualmente tratado no teatro nacional." O tema instigou também a diretora Regina Galdino a criar um espaço cênico camuflado por uma cortina semi-aberta, que possibilita o público acompanhar as cenas como se estivesse olhando por uma fechadura. "Como se trata da discussão do sexo do ponto de vista da velhice, as pessoas poderão assistir aos momentos mais íntimos do casal de uma forma privilegiada", comenta Regina, que buscou orientar as interpretações para um tom não realista. Para isso, colabora a concepção do cenário: o que poderia ser apenas um moderno apartamento convive com a fantasia de paredes de onde os objetos são retirados, formando ambientes que registram a rotina dos personagens ao longo de 30 anos. Um período que, apesar dos atritos, termina com um final surpresa. "Sou conservadora e casamenteira", adianta Leilah. "Gosto de aspectos da vida à dois (como dormir juntos); assim, o fim é comovente e feliz." Intimidade Indecente. Comédia. De Leilah Assumpção. Direção Regina Galdino. Duração: 1h20. Sexta, às 21h30; sábado, às 20 e 22 horas; domingo, às 17 e 19 horas. R$ 50,00. Teatro Renaissance. Alameda Santos, 2.233, tel. 3069-2233. Até 30/9.

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