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Moda e arte, juntas em ensaio

Chamada pelo Sesc, fotógrafa francesa Irina Ionesco trouxe ao Rio seu jeito artesanal de registrar imagens

Por Roberta Pennafort/RIO
Atualização:

Numa época em que a máquina digital virou objeto do cotidiano, e que a consequente banalização da fotografia está na ordem do dia, o trabalho de uma senhora francesa de 74 anos, que trabalha com uma câmera analógica, só revela suas fotos com o fiel laboratorista e para quem cada foto é única, impressiona. Fotógrafa de arte e de moda, Irina Ionesco trabalhou para grifes como Dior, Balenciaga, Givenchy e Saint-Laurent. Da moda brasileira nada conhecia, até ser convidada pelo Sesc para um ensaio a ser exposto em painéis durante o Fashion Business, bolsa de negócios de moda que será montada entre os dias 18 e 21, na Marina da Glória, no Rio. O trabalho foi realizado na quarta-feira passada, na Mansão Figner, casa de 1910, no Flamengo, onde funciona o centro cultural do Sesc. As três modelos contratadas, Fabiana Mayer, Bruna Sotilli e Jéssica Pauletto, vestiram peças das coleções primavera-verão de cinco grifes que participarão da feira: Sta Ephigênia, Carlos Miele, Barbara Bela, Vitor Dzenk e Patricia Viera.Suas imagens impactantes já viajaram por galerias da Europa, Estados Unidos e Ásia. Por aqui, Irina jamais havia trabalhado. Ela elogiou as modelos - "Fabiana tem uma beleza pré-rafaelita"; "Bruna é felina"; "Jéssica parece Audrey Hepburn em Bonequinha de Luxo", comentou. Também se encantou pela cidade, da qual partiria três dias depois. "O Rio é sublime, é a vida", declarou. E mais não disse, nas duas horas em que a reportagem do Estado a acompanhou.Ela estava concentrada. Parece ser tão econômica com as palavras quanto é com os fotogramas. No cenário montado na belíssima sala da mansão, o piso em parquê e o teto trabalhado contrastavam com o visual tropical, criado com palmeiras e flores. Apuro. Enquanto fotojornalistas chamados a registrar a passagem de Irina pelo País disparavam até dez cliques por segundo com potentes máquinas digitais profissionais, Irina, com sua Nikon F, mecânica, fazia suas fotos calmamente, escolhendo os ângulos com apuro. De fundo, uma trilha de Marguerite Duras, de sua escolha, compunha o clima. "Este é um momento de sonho e poesia. Ela não metralha, é uma artesã. É importante a gente registrar essa maneira de fotografar, que está morrendo", diz Betch Cleinman, jornalista carioca que conheceu Irina em Paris quando morava lá. Foi Betch quem trouxe ao Brasil a retrospectiva Espelhos de Luz e Sombra, que passou pela Caixa Cultural em São Paulo entre março e abril e segue por Brasília e Salvador até agosto.Irina rechaça interferências tecnológicas em sua arte. "A fotografia é para mim um elemento essencialmente poético. Cada sessão de fotos, encenada e concebida como uma sequência teatral, integra a mulher em um universo de sonho", já escreveu a mulher que tem vocação para performer: trabalhou como dançarina acrobática e foi alvo de um lançador de facas. Irina não é parente de Eugène Ionesco, um dos pais do chamado "teatro do absurdo", mas seus pais eram romenos, como o dramaturgo. Ela passou a se dedicar à fotografia nos anos 60, quando ganhou sua primeira Nikon. O ensaio pelo qual ficou conhecida é o perturbador Eloge de Ma Fille, dessa época. Ela fotografou a filha, Eva, então uma criança, nua, entre bijuterias, luvas, rendas e meias de seda, e em poses consideradas eróticas, o que lhe rendeu ataques.QUEM ÉIRINA IONESCOFOTÓGRAFA FRANCESA DE ARTE E DE MODACV: Filha de imigrantes romenos, nasceu em Paris em 1935. Começou a fotografar nos anos 60 e já trabalhou com os mais importantes estilistas do mundo.

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