Michael Lewis revela "A Nova Novidade"

Na tradição narrativa de Tom Wolfe, autor mira o fenômeno da supergeração de fortunas no Vale do Silício, seguindo os passos de Jim Clark, o homem que lançou o Netscape na bolsa

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Por Agencia Estado
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Quando Michael Lewis, antes de completar 40 anos, anunciou que escrevia A Nova Novidade pensando no Grande Gatsby, o clássico da literatura americana de Scott Fitzgerald, ninguém riu da petulância. Em vez disso, ele recebeu um adiantamento de US$ 1,2 milhão do seu editor. Não foi um risco. O primeiro livro de Lewis, Liar´s Poker (O Jogo da Mentira, Editora Campus) é um best seller na tradição narrativa de Tom Wolfe, que expôs, como comédia jornalística, as entranhas de Wall Street na década de 80. Lewis foi um insider no jogo dos mentirosos. Graduado em Princeton e na London School of Economics, teve seu momento de glória como vendedor de papéis especulativos da Salomon Brother´s e arruinou seriamente pelo menos um grande cliente cujo dinheiro deveria proteger. Quando largou a jogatina financeira para virar escritor estava recebendo US$ 225.000,00 ao ano. Nunca antes, explica ele, tantos garotos de 24 anos sem qualificações mínimas a não ser a arrogância ganharam tanto dinheiro em tão pouco tempo. "Os banqueiros de investimentos de riscos de Wall Street não são tipos que assumem riscos", disse Lewis, em um chat na Internet sobre seu livro. "São somente pessoas que tomam honorários indecentes apenas por estar na mesa quando o dinheiro muda de mãos. Não acho que isso seja diabólico. Apenas acho que eles são super-remunerados", conclui. A Nova Novidade mira também no fenômeno da geração de fortunas que brotam do improvável. O cenário agora é o Vale do Silício, a capital da alta tecnologia e da nova economia que assola todo o mundo. A Nova Novidade é uma reportagem centrada na personalidade de Jim Clark, o genioso criador da Silicon Graphics, o lançador na bolsa do Netscape, o programa navegador que popularizou a Internet, e do Heatheon, um sistema de seguros e serviços médicos on-line. As três empresas criadas por Clark passaram em curto tempo a barreira do bilhão de dólares na bolsa, enquanto no livro de receitas e despesas registravam apenas escritas vermelhas de fenomenais prejuízos. Lewis pinta um retrato simpático de Clark - um engenheiro rebelde e uma espécie de Marlon Brando que pilotava chips em vez de motocicletas. Ele intrometeu-se na mesa em que o dinheiro de risco é trocado de mãos e saiu dela com os bolsos tão cheios de notas verdes quanto os tradicionais parasitas do capitalismo de risco. O problema é que ninguém sabia se Clark estava blefando ao vender suas idéias. Ele havia criado o primeiro chip dedicado a processamento de imagens 3D, que levou ao sucesso da Silicon Graphics e virou Holywood de cabeça para baixo com a emergência dos filmes de efeitos especiais - e ainda nesta semana participou do lançamento de mais um empreendimento na rede: um site para recolher amostras de DNA e formar um banco para uso de laboratórios farmacêuticos. Se os capitalistas de risco é que levaram a parte do Leão na Silicon Graphics, ao constituir a Netscape, Clark jogou duro com os banqueiros. Um deles, Glenn Meuller, que teve um papel confuso nos descalabros administrativos da Silicon Graphics, meteu uma bala nos miolos quando Clark, por pura pirraça, negou-lhe a chance de comprar uma parte inicial da Netscape, antes do lançamento público. Como se trata de uma obra jornalística, Lewis pode se dar ao luxo de atribuir a explosão da nova economia a um motivo aparentemente fútil. Clark teria decidido abrir o bilionário IPO da Netscape depois de ver o veleiro de um conhecido na Baía de São Francisco. Por inveja, decidiu construir o maior veleiro do mundo, o Hyperion, que seria completamente navegável por computadores. O dinheiro para construir o veleiro veio do IPO, é claro. Quase a metade de A Nova Novidade reporta à alucinada - e desastrada -- construção do veleiro. No mínimo é uma boa metáfora de como as coisas podem ser disparadas na caótica nova economia por eventos tão triviais como a inveja de um garoto pobre (a mãe de Clark criou a família com uma renda de US$ 250 por mês). Seguindo as descobertas de Lewis dá para entender, por exemplo, porque o IPO do Palm Pilot, um dispositivo organizador e comunicador de mão (handheld), que pesa menos de 300 gramas, tenha atingido o valor de bolsa maior do que o da General Motors que fabrica carros de quase 1 tonelada. Requinte - Ao longo das 361 páginas de A Nova Novidade, Lewis faz Clark perseguir a construção do monumental iate - o maior do mundo, com um mastro da altura de um prédio de 19 andares e que custou US$ 37 milhões, além de levar a bordo uma coleção de quadros impressionistas no valor de US$ 30 milhões - da mesma maneira que o milionário Gatsby perseguia a reconquista da frívola namorada. É também quase com o sabor dos segredos de alcova que se fica sabendo, na intimidade, que Clark arrancou mais de US$ 1 bilhão no IPO da Heatheon, praticamente apenas com um papel rabiscado com um diagrama que ele chamava de O Diamante Mágico, que revolucionaria o atendimento dos clientes do sistema de saúde nos Estados Unidos. No complexo e burocrático sistema de atendimento americano, o doente se vê ante a dezenas de postos de pedágios de médicos, agentes de seguros, farmácias, hospitais, quando o que quer é apenas que lhe façam um curativo (Clark teve a brilhante idéia quando aguardava ser atendido com uma perna esmagada por um acidente de moto). O Diamante Mágico, explicava Clark aos íntimos, tinha apenas médicos, clientes, pagadores e fornecedores nos quatro vértices e, ao contrário do caótico e burocrático sistema de saúde americano, "apenas um cretino no meio recebendo o dinheiro de todos". A Nova Novidade - Uma História do Vale do Silício, de Michael Lewis, editora Companhia das Letras. 361 páginas. R$ 29,50.

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