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Melo e Castro lança antologia

Os 50 anos de produção poética do poeta português, que nos últimos anos está morando na cidade e dando aulas na USP, estão em Antologia Efémera

Por Agencia Estado
Atualização:

O poeta português E.M. de Melo e Castro lança na terça-feira, às 18h30, na Livraria Cultura (Avenida Paulista, 2.073, tel.: 0--11-285-4033), uma reunião de 50 anos de poesia. Antologia Efémera (Lacerda, 340 págs., R$ 39) é o nome do livro, que, segundo o autor, pretende ser uma "súmula" do seu trabalho como escritor, desde a adolescência. "Uma publicação de toda a minha poesia ocuparia 1.200 páginas, o que seria inviável no momento; achamos que a edição de um quarto disso seria um desafio qualitativo e apresentaria ao público um livro de mais fácil aquisição e leitura", explica o poeta. O título, para ele, dá a idéia de um cabedal acumulado ao mesmo tempo em que aponta para o caráter necessariamente provisório de uma antologia de um autor em atividade. Melo e Castro, hoje com 68 anos, é um dos mais importantes poetas portugueses. Em 1969, tornou-se um pioneiro mundial do videopoema, ao transmitir pela Rádio e Televisão Portuguesa uma obra chamada Roda Lume. Com 2 minutos e 50 segundos, o poema irritou os censores apesar de não ter nenhum conteúdo político explícito. O poeta já estava sendo processado por "abuso de liberdade de imprensa" pelo regime, por publicar poemas eróticos e escatológicos (recentemente, relançou um conjunto com essa temática em Portugal "para combater o politicamente correto", explica, dividindo a última palavra em duas partes e acentuando o sotaque português, em que a letra "o" tem um som próximo ao da letra "u"). O autor também tinha problemas com poesias mais "sérias", como é o caso da obra reproduzida nesta página e que integra a antologia. Segundo o poeta, ela foi censurada "inúmeras vezes" pela burocracia instalada nos jornais pela ditadura salazarista. Experimental - Nestes 50 anos, Melo e Castro teve seu nome associado a vários movimentos de vanguarda. O que acabou por rotulá-lo foi o concretismo, pois Melo e Castro foi, em Portugal, o seu mais ativo arauto. "O que é engraçado, porque só fiz poesia concreta por um breve período de minha vida, fiz apenas 50 ou 60 poemas concretos", diz. Segundo o poeta, essa associação à essa sua fase experimental, concreta e combinatória não dá conta de toda a sua obra, que começou e ainda se vale do verso tradicional ("Como por uma fenda no tempo/ diviso as sombras do que vem depois" são os dois primeiros versos do poema Inquietação, de 1950), passou pela prosa (contos, alguns publicados na antologia), a videopoesia e a poesia visual (como em O Conhecimento) e agora espera ansioso pela disseminação da Internet de banda larga. A antologia, acredita, ajuda a entender seu processo criativo. "Verifiquei que os textos iniciais poderiam iluminar o que estou fazendo agora." Para Melo e Castro, os meios de difusão cultural não se superam, mas se acumulam. "Diziam que o livro iria acabar, mas ocorreu o contrário: nunca se publicaram tantos livros quanto agora." O que muda, acredita, é a posição do artista, diante das novas possibilidades: "Mallarmé encarnou a angústia do homem criador diante da página em branco; hoje, o poeta encarna essa angústia diante da TV, do cinema e, especialmente, da Internet; em breve, com a banda larga, tudo isso vai estar junto", afirma. Para Melo e Castro, a poesia visual, no entanto, não é nenhuma novidade na história da humanidade. "A dimensão visual do texto não é uma invenção do século 20; a leitura da esquerda para a direita e de cima para baixo, sim, é algo intimamente relacionado à tradição literária ocidental." Na opinião do poeta, essa tradição transformou a literatura mais num jogo de idéias que num jogo de escrita. Em dois momentos históricos, no entanto, essa concepção foi desconstruída: tanto o barroco quanto a poesia no século 20 reincorporaram à obra poética o jogo de visualidades. São Paulo - Há cinco anos, o poeta português vive em São Paulo, na Avenida Angélica, e dá aulas de literatura comparada na Universidade de São Paulo. Na semana passada, Melo e Castro foi ao cinema para assistir ao filme Capitães de Abril, da conterrânea Maria de Medeiros, sobre a Revolução dos Cravos, de 1974 - o movimento militar que pôs fim à ditadura portuguesa. Foi abordado e ouviu uma pergunta à que já se acostumou: "O senhor é o poeta Haroldo de Campos?" Mais que a simples aparência física, em especial pela volumosa barba, os dois são amigos, encontram-se em São Paulo com freqüência. Desde os anos 50, Melo e Castro foi o principal interlocutor dos jovens concretistas em Portugal. Ele, embora considere a confusão engraçada, se queixa: "Ele é mais corpulento do que eu." Segundo ele, já aconteceu de a confusão ocorrer na presença de Haroldo e de seu irmão, Augusto. Depois de convencer o interlocutor de que não era Haroldo, perguntaram-lhe, então, se era o Augusto. "O que é um absurdo, o Augusto tem quase dois metros de altura." Outra confusão comum na sua vida é ser chamado de Eugênio de Melo e Castro, confundindo o seu nome com o da filha, cantora. "Mas aí a culpa é minha", justifica. "Deveria tê-la chamado de Ernesta."

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