Mats Ek desconstrói o "Lago dos Cisnes"

Diretor sueco do Cullberg Ballet mostra sua versão da clássica coreografia de 1875. Nela, o príncipe vive um complexo de Édipo e seu cisne é sensual e determinado

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Por Agencia Estado
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Uma das coreografias mais tradicionais e aplaudidas em todo o mundo, O Lago dos Cisnes, será apresentada pelo Cullberg Ballet a partir de sábado no Teatro Municipal do Rio, dando início a sua turnê pelo País. Aqui em São Paulo a coreografia chega no dia 10. No entanto, para quem espera assistir a um clássico do repertório romântico, essa versão criada pelo sueco Mats Ek vai surpreender e até mesmo chocar os mais conservadores. Ek costuma recriar, ou melhor, utilizar como ponto de partida balés românticos para compor suas coreografias, em geral perturbadoras. O Lago dos Cisnes original foi criado em 1875, baseado na música de Tchaikovski, o pano de fundo para contar a história de uma princesa transformada em cisne por um mago e que à meia-noite volta a forma humana. Coreografia - Tudo começa quando a rainha avisa ao príncipe Siegfried que precisa encontrar uma noiva e anuncia o baile real, no qual ele elegerá uma dama para ser sua esposa. Numa noite, quando o príncipe sai com amigos para caçar, depara-se com um grupo de cisnes brancos em um lago. O mais belo deles transforma-se em uma jovem encantadora. Siegfried apaixona-se e descobre a triste história de seu cisne. Mais adiante, durante o baile, Siegfried conhece o mago, sua filha vestida de negro e declara-se a ela. Depois, recorda que já havia feito o mesmo à beira do lago. Ao saber da traição, o cisne branco tenta o suicído, mas o arrependimento do príncipe salva-a e liberta-a da maldição. Numa versão trágica, uma tempestade provocada pela ira do mago mata os dois afogados. Todo esse quadro romântico, com a aura do século 19, sofre uma mudança radical e passa a ser apenas uma referência na visão de Mats Ek. "Utilizo os clássicos apenas como fonte de inspiração, não quero recriá-los, apenas pensá-los em uma outra época em outro contexto. Não refaço os balés de repertório, crio coreografias novas em cima deles", afirma o coreógrafo. "Os balés clássicos e de repertório são uma herança cultural. Eu respeito essas histórias, não procuro mudá-las. Na realidade, eu faço uma desconstrução da idéia original, absorvo o pensamento que está por trás, a essência da peça, a partir daí faço um brainstorm, organizo esses elementos e conto a história à minha maneira, sem destruir as características originais da coreografia." Para Ek, não há apropriação dessas peças, apenas uma maneira contemporânea de entendê-las. "A minha versão do Lago dos Cisnes foi criada para o Cullberg há três anos. Essa obra clássica consiste em um material interessante, singular, a começar pela música de Tchaikovski. Um outro aspecto que me atrai é a emoção que está presente em cada ato", observa. Conforme explica, o Lago é pontuado por temas marcantes, como o amor e a morte, ambos elaborados, sem cair em clichês e sem as seqüências compostas por Petipa. Ek apresenta um príncipe que nutre um complexo de Édipo por sua mãe. Sente verdadeira veneração, com direito a ter ciúmes do companheiro dela. Em seus sonhos, encontra uma pretendente ideal. Um cisne, nada romântico. Uma mulher sensual, forte, determinada. Na visão do sueco, os cisnes que povoam os sonhos do príncipe surgem descalços e carecas. "O príncipe é um homem jovem, que almeja crescer e tem diante dele uma série de caminhos", comenta o criador. Para isso, o príncipe do Cullberg fará uma viagem pelo mundo. "A viagem surgiu como ferramenta para o crescimento do príncipe, um momento de libertação do vínculo materno, por uma busca pessoal e por uma amada." Ek elegeu Israel como cenário e algumas músicas folclóricas reforçam o clima. No fim, ele encontra o seu cisne. Mats Ek é um coreógrafo aclamado pela crítica mundial, que quando criança sentia verdadeira aversão pela dança. Filho de Birgit Cullberg, era obrigado a dividir as atenções da mãe com a dança. Sua estréia nos palcos foi em 1976, com The Officer´s Servant. Na década de 70, criou trabalhos de conteúdo político como Soweto, uma crítica ao racismo na África do Sul. Em 1985, assumiu a direção do Cullberg Ballet. Passou a recriar os balés de repertório como Giselle e Sagração da Primavera. Em 1993, passou a direção para Carolyn Carlson. Desde então tem se dedicado a coreografar, não somente para o Cullberg como também para companhias em todo o mundo, com destaque para as criações A Bela Adormecida e Carmen, esta encenada no ano passado no Brasil. Direção - Atualmente o Cullberg possui duas diretoras artísticas, Lena Wennergren-Juras e Margareta Lidström. Lena atua na companhia desde a sua criação, em 1967, e foi assistente de ensaio de Ek. Margareta ingressou no grupo em 1992, protagonizou trabalhos clássicos e modernos como bailarina. Ambas estarão no País para acompanhar a turnê promovida pela Antares, com patrocínio da Nokia e Embratel.

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