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Matrimônio inspirado no Circo

Peça de Ariano Suassuna, Casamento Suspeitoso ganha nova montagem

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Por Ubiratan Brasil
Atualização:

A obra teatral de Ariano Suassuna sempre foi alvo de afagos e elogios - com exceção de O Casamento Suspeitoso, cuja nova montagem estreia na quinta-feira, no Teatro do Sesi. "De todas as que montei, esta foi a mais atacada", comenta Suassuna no prefácio da edição em livro da peça, lançada pela José Olympio. "Disseram que eu estava repetindo tipos e situações já usados no Auto da Compadecida e que empregara, nesta comédia, mais do que na primeira, meios vulgares e grosseiros de comicidade, além de criar personagens sem sentido."Tamanha resistência não intimidou o diretor Sérgio Ferrara, responsável pela nova montagem. "É uma dramaturgia difícil, ao contrário do que se pensa", comenta. "Como os personagens são tipos, a plateia não vai simpatizar se os atores não humanizarem suas interpretações."Por conta disso, Ferrara - que já montou clássicos tanto nacionais (Barrela) como estrangeiros (Mercador de Veneza) - apostou em um tom circense, que ameniza a farsa e garante uma cumplicidade mais imediata do público. Escrita em 1957 e ambientada na pequena Taperoá, no interior da Paraíba, O Casamento Suspeitoso mostra as armações que antecedem o matrimônio entre Geraldo (Joaz Campos) e Lúcia Renata (Suzana Alves). Ele é filho de Dona Guida (Bete Dorgam), mulher que comanda a cidade na base do grito, enquanto ela não passa de uma interesseira, de olho em uma grande herança que o futuro marido está para receber. Lúcia conta com o apoio da mãe Susana (Nani de Oliveira) e de seu amante Roberto Flávio (Nicolas Trevijano). Os empregados da família, Cancão (Marco Antônio Pâmio) e Gaspar (Rogério Britto), também se envolvem na história para tirar vantagem da situação, enganando tanto o Frei Roque como o Juiz Nunes, ambos interpretados pelo veterano Abrahão Farc. Enfim, instala-se a conhecida comédia de erros com um sotaque do romanceiro popular nordestino. Ou, como diz Suassuna em seu prefácio, uma peça que segue a "tradição do teatro grego e romano, do elisabetano, do espanhol e francês clássicos, do goldoniano, do alemão oitocentista, enfim, do teatro que considero o grande teatro e que se opõe ao contemporâneo, "o teatro de ruína", expressão que subscrevo integralmente".Para conseguir tal efeito, Ferrara buscou acentuar a malandragem que permeia cidades pequenas, aquela que é maliciosa e ingênua, ao mesmo tempo. "Não se trata de uma montagem realista, mas de uma comédia sem caricatura - o importante é o signo, não o exagero."Foi o que norteou especialmente o trabalho de Pâmio e Britto, cujos personagens se assemelham a João Grilo e Chicó, do Auto da Compadecida. No equilíbrio de espertezas (enquanto Cancão é o malandro, Gaspar passa-se por ingênuo), os atores encontraram inspiração em outra dupla famosa. "Depois de uma observação da Bete Dorgam, percebemos que nossos personagens se parecem com Oscarito e Grande Otelo", conta Pâmio. "Foi a chave ideal para criarmos nossa parceria em cena."Habituado a papéis marcados por riqueza dramática (encenou, por exemplo, o belo monólogo Mediano), Marco Antônio Pâmio surpreende no cômico, criando um personagem em que a linguagem corporal é tão importante como a voz. Também feliz em sua caracterização está Suzana Alves, ainda conhecida como Tiazinha: como Lúcia Renata, ela alterna com precisão ingenuidade e astúcia, fazendo o arco perfeito da moça que só pensa em se casar por interesse."Ela tem experiência em teatro e relevou um ótimo timing para a comédia", comenta Ferrara, que pediu ao elenco controlar o sotaque nordestino, a fim de evitar a caricatura.O mesmo cuidado se estendeu ao cenário e figurinos. Concebidos por J.C. Serroni, ambos apostam no tom circense inspirado pelo diretor. "Como o casamento é mote da peça, criamos um arco que faz a moldura no palco com imagens de santos casamenteiros", conta ele, que também elaborou uma cortina formada pelo mesmo tecido dos véus. Já os figurinos trazem as características da vestimenta do interior nordestino.A trilha sonora e também a sonoplastia, que reforça especialmente a comédia, são executadas ao vivo, por João Paulo Soran e Breno Amparo. Para completar a trupe circense, Sonia Maria e José Rosa formam uma espécie de coro, participando do bando que tenta aplicar o golpe em Geraldo. "Nossa intenção é trazer novamente o teatro popular que marcou o início da sala do Sesi", diz Ferrara. O CASAMENTO SUSPEITOSOTeatro Cultural Fiesp. Avenida Paulista, 1.313, tel. 3146-7405. 5ª a dom., às 20 h. R$ 10 (5ª e 6ª grátis). Até 4/12

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