Engenheiro de formação (quantos espectadores sabem disso?), Robert Altman estreou na direção em 1957, depois entrou na televisão e lá ficou confinado durante mais de dez anos. Voltou, em 1968, com um filme que vive passando na TV: No Assombroso Mundo da Lua, sobre a saga dos astronautas norte-americanos, interessante, por certo, mas inferior ao admirável Os Eleitos, que Philip Kaufman fez nos anos 80, e foi um dos grandes filmes, não apenas de Hollywood, naquela década. A descoberta de Altman deu-se em 1970, quando M.A.S.H. recebeu a Palma de Ouro no Festival de Cannes. O resto é história. Altman fez grandes filmes (Nashville, Quando os Homens São Homens, O Jogador, Short Cuts: Cenas da Vida) e, eventualmente, chegou a ser indicado para o Oscar. Concorreu este ano por Assassinato em Gosford Park. Agora, você pode dar marcha a ré no tempo e (re)ver o primeiro grande Altman. M.A.S.H. está sendo lançado em DVD pela Fox. Não é um DVD qualquer. A empresa caprichou nos extras: galeria de fotos, trailer, documentário sobre a digitalização das imagens, outro documentário sobre médicos de guerra e comentários do diretor e dos atores sobre cenas importantes. Tudo isso é valioso e contribui para o interesse, mas o melhor é o próprio filme. É preciso reportar-se à época em que o filme surgiu. Os EUA estavam atolados na Guerra do Vietnã, que dividia a sociedade norte-americana. Neste contexto, Altman conseguia denunciar o horror e o absurdo da guerra evocando a ação do Mobile Army Surgical Hospital, os hospitais móveis do Exército, na Guerra da Coréia. Elliott Gould e Donald Sutherland interpretam os cirurgiões que costuram os membros destroçados de soldados e usam as horas vagas para jogar golfe ou correr atrás de enfermeiras. Uma delas, interpretada por Sally Kellerman, tem o sugestivo apelido de Lábios Ardentes e você logo fica sabendo por que. É um ótimo filme, devastador e inteligente. Perto dele, o Altman que refaz Jean Renoir (A Regra do Jogo) em Gosford Park, filtrando a luta de classes numa trama de mistério à Agatha Christie, é um tanto decepcionante. Diverte, possui ótimas atrizes, mas o velho Renoir era mais arguto e contundente no seu olhar sobre as relações sociais.