Mario Prata lança romance policial com tom de comédia

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Por Agencia Estado
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A pequena Albuquerque deve ser do balacobaco. Já rendeu miss Brasil, motoqueiro rebelde, detetive particular e, principalmente, um cronista bem-humorado, Mario Prata. Da imaginação e dos teclados de Prata vêm saindo best sellers sobre os mais variados temas - sua adaptação a Portugal e à lingua portuguesa; seus dias de tortura num spa; suas vidas passadas... Desta vez, ele volta a Albuquerque para resgatar a figura de um filho ilustre - o ginecologista Ozanan Badaró, transformado por ironia do destino em vendedor de planos de saúde e, posteriormente, em gigolô sofisticado. Um belo dia, Badaró aparece morto. Suicídio, decreta o laudo. É nesse ponto da história que Prata abre a porta ao leitor de Os Anjos de Badaró (Ed. Objetiva, 256 págs., R$ 22 00). Misturando vários tempos narrativos, ele conta a história desse empreendimento sexual. Incentivado por uma parceira, Badaró montara uma agência de garotas especiais para atender homens ricos. Caiu na própria armadilha, apaixonando-se por uma delas. O romance de sua vida, registrado em disquetes de computador, é entregue ao amigo de infância, Alcides Capella, um repórter da velha-guarda, daqueles que ainda não aprenderam a usar um computador. O leitor vai acompanhando a história pelos olhos de Capella, marido fiel e conformado da pacata Cláudia - na verdade a personalidade secreta da detetive particular (formada em curso por correspondência) Lurdes de Fátima. Criou-se, enfim, uma dupla clássica de detetives, certo? Não. De Albuquerque chega, sem prévio aviso, Blanche, mãe de Cláudia, sogra de Capella. Com ar de velhinha fofoqueira do interior, Blanche revela-se uma internauta assanhada, daquelas que passam a noite em claro navegando nos chats de sacanagem. As aventuras desse trio, mais as narrativas nos disquetes de Badaró, ajudam a montar a história. Aparentemente, Prata comete um erro técnico: o leitor descobre com facilidade o autor do crime. É só aparência. O segredo do livro é mostrar de que maneira o crime foi cometido - e aí está o pulo do gato. O final, de certa forma surpreendente, é muito bem bolado e envolve personagens que pareciam esparsos ao longo da história. Os Anjos de Badaró chega num momento feliz da literatura policial brasileira. O gênero surgiu oficialmente no Brasil entre os anos 50 e 60, com Luís Lopes Coelho (1911-1975), autor dos livros de contos O Homem Que Matava Quadros, A Idéia de Matar Belina e A Morte no Envelope. Criador de um detetive, o delegado Leite, Lopes Coelho tinha um estilo mais rebuscado, usava um palavreado difícil, mas criava bons enredos. Nos anos 50, surgiria Marcos Rey, o paulista que injetou humor nas narrativas policiais. Deu tão certo que, nos anos 80, Rey seria um dos autores mais lidos por adolescentes atraídos por seus personagens, que viviam aventuras deliciosas nas ruas do bairro do Bexiga. A literatura policial brasileira só ganharia impulso nos anos 70 e 80, com autores mais elitizados, como Rubem Fonseca e Patrícia Melo. O caráter mais sofisticado confere a Fonseca e Patrícia uma aura de alta literatura, afastando-os da faixa dedicada aos romances policiais - o da literatura de diversão, perfeita para se ler nas férias, durante uma viagem, no fim de semana. Foi preciso que chegassem ao Brasil outros exemplos de bons autores policiais - Lawrence Block, P.D. James, Harry Kemelman, Ross MacDonald e o clássico Rex Stout - para que a prateleira nas livrarias não apresentasse apenas Agatha Christie e Arthur Conan Doyle. Com isso, escritores nacionais perderam o medo. Os editores também. Foram lançados autores como o ótimo Luiz Alfredo Garcia-Roza e o titã Tony Belloto. O sucesso dos livros de Garcia-Roza e Belloto tem algumas explicações: primeiramente, são bem escritos. Segundo, criam tramas que prendem mesmo o leitor às páginas do romance. Por fim, inserem a aventura policialesca em ruas e paisagens comuns. Bellini, o jovem detetive criado por Tony Belloto, mora na Avenida Paulista, toma café na Rua Peixoto Gomide, circula pela Rua Augusta e resolve um crime invadindo o Parque do Trianon. Mais paulistano, impossível. Da mesma maneira, Garcia-Roza coloca seu detetive no Bairro Peixoto, trabalhando em Copacabana, falando português como nós. A essa turma, juntam-se os personagens da comédia policial de Mario Prata. É bem verdade que o livro, escrito em tempo real na internet, tem mais de policial que de comédia. Mas tem boa trama e final-surpresa, o que é fundamental para leitores de suspense. Falta, talvez, a Prata - caso ele queira envolver seus personagens em mais aventuras - dar uma personalidade mais marcante aos detetives de sua história. Lurdes de Fátima e Blanche, sua mãe, têm perfis semelhantes, trajetórias parecidas. Em casos assim, a divisão Watson-Sherlock tem uma razão de ser: um é chão, o outro é céu; um é ação, o outro raciocínio... Hercule Poirot e Coronel Hastings, Nero Wolfe e seu assistente... essas duplas não nos deixam mentir.

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