Livro repassa os 50 anos do Teatro Tablado

Companhia de teatro amador fundada por Maria Clara Machado é revista em Os Melhores Anos de Muitas Vidas - 50 Anos de Tablado, de Martha Rosman

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Por Agencia Estado
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Fechem os livros e abram os olhos, costumava dizer Maria Clara Machado a seus alunos de teatro, incentivando-os a mergulhar na prática e deixar de lado a teoria dramática. A frase tornou-se mítica entre diversas gerações de artistas que passaram pelo Tablado, a companhia de teatro amador que ela fundou no Rio e que completa 50 anos no domingo. Para comemorar a data, atores, diretores, coreógrafos, figurinistas, iluminadores e cenógrafos vão se reunir na noite de segunda-feira, no próprio Tablado, no Jardim Botânico, onde pretendem relembrar histórias doces e divertidas e participar do lançamento do livro Os Melhores Anos de Muitas Vidas - 50 Anos de Tablado (Editora Agir, 160 páginas, R$ 20), de Martha Rosman, que dedicou 36 de seus 80 anos a uma instituição que é sinônimo de amor à arte teatral. "Escrever sobre o Tablado tornou-se, para mim, um dever", comenta Martha, que iniciou o projeto do livro em 1995, quando constatou que diversas gerações de artistas tinham um traço comum em suas carreiras: uma passagem pelo Tablado. Atores como Fernanda Torres, Selton Mello, Leonardo Brício, Miguel Falabella, e outros, mais velhos, como Louise Cardoso, Sérgio Viotti, Cláudio Corrêa e Castro, Ivan de Albuquerque e Rosita Tomaz Lopes exibiam um brilho nos olhos ao lembrar os momentos de aprendizado que receberam no teatro. "Decidi então mergulhar fundo nas lembranças dos meus 36 anos de Tablado, a época mais feliz da minha vida." Com o auxílio de Lúcia Carvalho, responsável pelas pesquisas e organização do livro, e de Cico Caseira, que entrevistou mais de 300 "tabladianos", Martha Rosman realizou o projeto, construindo um relato informal mas carinhoso de momentos marcantes do teatro brasileiro. O livro resultou em uma homenagem a Maria Clara Machado, que morreu no dia 30 de abril, aos 80 anos. "Eu já havia terminado a obra, quando aconteceu o inesperado, apesar de saber que, de um momento para outro, isso aconteceria", comenta Martha. A história do Tablado começou quando um grupo de jovens bandeirantes, junto de alguns estudantes da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio, todos da classe média carioca, decidiram fundar, em 1951, um grupo de teatro. Poderia ter sido mais um, entre tantos que surgem e desaparecem a cada ano, não fosse a participação de Maria Clara, recém-chegada de um curso de teatro em Paris. A diretora do Patronato da Gávea, também bandeirante, ofereceu uma sala para os espetáculos. Surgiu o Tablado, nome sugerido por Eros Martins Gonçalves. E, por orientação de João Sérgio Marinho Nunes, foi registrado o nome oficial: Teatro Amador - O Tablado. A primeira ata foi assinada por 16 membros em 28 de outubro e encabeçada por Maria Clara e seu pai, o escritor Aníbal Machado. O espaço era limitado, ao contrário das condições oferecidas aos novos atores, que apuravam sua técnica por meio da improvisação. Um dos preceitos básicos do Tablado era o de não se profissionalizar, pois, segundo Maria Clara, isso faria o teatro acabar. "Realmente, se tivesse deixado seu espírito amador, o Tablado não estaria funcionando até hoje", reconhece o ator Cláudio Corrêa e Castro, em um dos depoimentos apresentados no livro. Ele figurou em um grupo que, no fim dos anos 50, deixou o Tablado disposto a buscar o profissionalismo. Não houve arrependimento, mas os mesmos atores reconheceram, anos depois, que a fidelidade do Tablado aos seus princípios foi decisiva para sua manutenção. Por conta disso, inúmeros jovens subiram pela primeira vez a um palco, médicos aprenderam a construir cenários, donas de casa a criar figurinos, engenheiros a cuidar da iluminação e, juntos, todos aprenderam a representar. "A voz de Maria Clara até hoje permanece em mim: ´Procure a luz, Martha! Busque o foco´", escreve Martha. "Só 40 anos depois, decodifico aquele comando da Maria Clara: compreendo que a luz que comecei buscando fora, nos refletores, foi-se fazendo dentro de mim." Em sua história cinqüentenária, o Tablado lançou verdadeiros clássicos brasileiros do teatro infantil: O Rapto das Cebolinhas (1953), A Bruxinha Que Era Boa (1955), O Cavalinho Azul (1960), Maroquinhas Fru-Fru (1961), A Menina e o Vento (1963), O Dragão Verde (1984). E, claro, Pluft, O Fantasminha (1956), uma espécie de Hamlet do gênero, segundo o escritor Ruy Castro. Em seu livro, Martha acrescenta também depoimentos de assíduos freqüentadores do Tablado que, apesar de nunca terem sido alunos ou atores, acompanharam seu desenvolvimento. "Maria Clara, com seus olhos azuis de menina e sua fé naquele Tablado tão acolhedor, encantado e confortador, foi uma grande educadora", comenta a atriz Fernanda Montenegro, que acompanhou a formação da filha, Fernanda Torres. "Se eu nunca pisei naquelas tábuas, sinto-me realizada por minha filha."

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