PUBLICIDADE

Livro 'Moda Ilustrada' recapitula a história do vestuário brasileiro

Por meio de ilustrações, gravuras antigas e croquis de grandes estilistas, obra registra os movimentos de estilos que marcaram época

Por Patricia Figueiredo
Atualização:
Ilustração digital de Monica Ruf, 2016 Foto: Divulgação/Luste Editores

Da pele pintada dos índios no Brasil do descobrimento aos croquis digitalizados dos estilistas nascidos na era da internet, a moda brasileira já passou por inúmeras fases até chegar ao cenário atual. No novo livro “Moda Ilustrada”, as jornalistas Maria Rita Alonso e Marília Kodic relembram mais de 500 anos de história com o auxílio de 228 imagens, entre pinturas, colagens, estampas e croquis. O lançamento ocorre nesta terça, 3, na Faculdade Belas Artes, em São Paulo.  Publicada pela Luste, uma editora especializada em livros de arte e de moda, a obra é fruto de um ano de garimpo em busca de desenhos que revelam como a moda brasileira se desenvolveu de maneira quase antropofágica, reaproveitando influências de outros países para criar sua própria identidade. “Mesmo copiando modelos da moda europeia, estilistas nacionais já se faziam autores por meio de seus traços pessoais como ilustradores”, diz o estilista Ronaldo Fraga, que assina o prefácio.  Entrevistas e análises de documentos históricos ajudaram a contextualizar as imagens que retratam a evolução do vestuário no País, com curadoria do editor Marcel Mariano. O resultado é um interessante apanhado da moda brasileira, que poderá ser conferido também em uma exposiçãoem cartaz no Museu Belas Artes de São Paulo, entre os dias 4 e 28 de abril. 

Ilustração de Filipe Jardim, backstage do desfile da Neon/Dudu Bertholini e Rita Comparato, no Teatro Oficina, personagens Barbara Berger, Dudu Bertholini, 2015 Foto: Divulgação/Luste Editores

Dividido em quatro blocos, a obra destaca passagens como a chegada da família real em 1808 e a influência de Carlota Joaquina, que ditou moda por aqui. Ao desembarcar no Brasil usando um turbante nos cabelos por conta de uma infestação de piolhos no navio que a trouxe, Carlota sem querer inaugurou uma moda, que fez a cabeça das mulheres do Rio de Janeiro. O curioso episódio é apenas um dos exemplos de como a moda brasileira se apropriou de elementos externos em sua evolução. A chegada das primeiras revistas de moda, no início do século 20, também demonstra a subversão de símbolos europeus. Inspiradas nos magazines ilustrados da Europa, elas traziam moldes de roupas para facilitar a réplica dos modelos exibidos. As revistas abordavam também assuntos do universo doméstico da época, com dicas de beleza, receitas, filmes, contos, poemas. As duas publicações mais poderosas foram a semanal Jornal das Moças e a Fon-Fon, ambas criadas em 1914, no Rio de Janeiro. Em suas páginas, não era raro encontrar traços de grandes pintores como Di Cavalcanti. Entre os ilustradores dessa fase, no entanto, ninguém brilhou mais do que Alceu Penna, um esteta que também desenhava estampas e figurinos, e ajudou a criar o visual de Carmen Miranda, símbolo máximo do estilo nacional na década de 1940. Com o auxílio dessas imagens, as revistas ajudaram a popularizar no Brasil o conceito de prêt-a-porter, que ganhou espaço na Europa após a revolução industrial e a febre dos tecidos sintéticos. A abertura de lojas de departamento também contribuiu para a consolidação da moda pronta para vestir no País. Essas lojas multimarcas introduziram modelagens mais sóbrias e simples, perfeitas para o momento em que a população urbana crescia e que as mulheres começavam a ganhar liberdade para atuar fora de casa.

A absorção de influências europeias só passou a ser conscientemente questionada a partir da década de 1960. Nesse momento começaram a surgir no Brasil os primeiros costureiros-celebridade, que trabalhavam para destacar suas marcas próprias e diferenciá-las dos produtos importados. Os desenhos de Dener ilustram esse período de rupturas e contradições, assim como os croquis da mineira Zuzu Angel, pioneira no uso de referências do folclore nordestino em suas peças. Misturando tecidos aparentemente conflitantes, como a seda e chita, suas criações ganharam espaço em lojas como as nova iorquinas Bergdorf Goodman e Saks. Dali em diante uma leva de novos estilistas passou a ter fama e relevância. Dois movimentos surgiram para divulgar o trabalho autêntico de criadores que começavam a se organizar coletivamente: o Grupo Moda Rio, formado em 1975, e o Núcleo Paulista de Moda, criado em 1980. Enquanto o primeiro trabalhava para reunir patrocínio para os costureiros cariocas, o segundo se esforçava para quebrar a hegemonia do Rio de Janeiro na moda. Operando como uma espécie de cooperativa, o grupo reuniu marcas paulistas como Huis Clos, Rose Benedetti e a G., de Gloria Coelho. Em Era Digital, último bloco de “Moda Ilustrada”, uma sequência de imagens digitalizadas representam a euforia dos tempos pós-internet. As ilustrações de moda viajam o mundo levando as criações do Brasil para os milhões de usuários das redes sociais.  Com um empurrãozinho da tecnologia, que possibilita a mistura do traço livre com programas de edição digital, o desenho volta a ter um papel de destaque na moda. O que permanece uma incógnita é como esses avanços tecnológicos, que prometem o aprimoramento da inteligência artificial e da impressão 3D, vão afetar o desenvolvimento da indústria da moda no Brasil e lá fora.  "Mesmo na era da roupa pronta, o croqui mantém a sua importância na construção da imagem estética”, define Ronaldo Fraga. “E é o ponto de partida, solitário e pessoal, para a composição de todo o universo mágico do vestir.” 

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.