Literatura e raízes à mesa

Moda das publicações dedicadas à culinária aquece o mercado no País

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Foto do author Maria Fernanda Rodrigues
Por Maria Fernanda Rodrigues
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Do Grande Dicionário de Culinária de Alexandre Dumas às receitas de Rachel de Queiroz em O Não Me Deixes. Da galinha cabidela que Gabriela, personagem de Jorge Amado, prepara para Nassib, receita usada antes por Eça de Queirós, ao conto A Festa de Babette, de Karen Blixen. A literatura quase sempre foi permeada pelo universo gastronômico, por meio dela foi possível acompanhar a história dos hábitos alimentares e, por consequência, a história da humanidade. De uns tempos para cá, a cozinha, espaço que nunca perdeu seu status de lugar de convivência e serviu de cenário para todas essas tramas literárias, tem recebido seus moradores para experiências culinárias. "O cozinhar deixou de ser uma necessidade nutricional para ser uma afirmação cultural. Isso acontece porque hoje o brasileiro tem orgulho de sua nacionalidade", diz o chef André Boccato. "Essa sensação de estar a reboque de uma outra cultura passa a ser substituída por você fazer cultura", comenta. Para ele, essa retomada da cozinha se deu quando a economia brasileira começou a melhorar. Boccato, que é também editor e dono de livraria - ambas especializadas em gastronomia -, faz a curadoria do Cozinhando com Palavras, espaço da Bienal onde chefs, nutricionistas, pesquisadores e escritores se revezam para conversar com o público. Ao invés de palco, uma bancada, com pia e um fogão. Durante alguns desses encontros, os chefs vão cozinhar e a plateia poderá degustar. É a segunda vez que a Bienal monta essa cozinha-auditório e a iniciativa também tem se popularizado em outras feiras de livro, como a de Frankfurt, Londres, Abu Dabi e Paris. Esse movimento é visto também nas livrarias. As seções de livros sobre comidas e bebidas aumentaram para acolher a crescente produção das editoras. Além disso, espaços como esse da Bienal já são criados dentro das lojas. A Cultura, que em breve abre uma loja no antigo Cine Vitória, no centro do Rio, quer construir lá sua terceira cozinha experimental para aulas, palestras e demonstração - a primeira foi a do Fashion Mall, também no Rio, e a segunda em Curitiba. "A ideia de montar a cozinha surgiu porque hoje todo mundo virou chef", diz Pedro Herz, diretor da rede de livrarias. O leitor está sempre atrás de novidades, mas não se esquece de alguns clássicos. "Dona Benta está superviva", diz. Para ele, quem gosta mesmo desse assunto é um bom comprador. Na Livraria da Vila, já são tradicionais os encontros do Degustação de História, com a chef Tanea Romão e o escritor Ilan Brenman. O assunto também é tema de oficina literária. Começa em São Paulo no dia 18 de agosto o curso Literatura e Comida, com Alessandra Porro, na Oficina de Escrita Criativa. Pensando nesse boom, José Carlos Júnior e Renato Guazzelli inauguram, na Bienal, a Tapioca, editora que não pretende apenas lançar livros de receita, mas também obras de reflexão, que possam ser adotadas pelos cursos universitários. O primeiro lançamento é O Dilema do Vegano, de Roberto Juliano. Serão 15 títulos até o fim do ano, incluindo O Menino do Pé de Moleque e A Menina da Baba de Moça - os dois pelo selo Tapioquinha. A expansão do mercado pode ser comprovada pelo desempenho de duas das mais tradicionais editoras da área. Nos últimos cinco anos, as vendas da Senac cresceram 107% - o índice foi de 24% entre 2010 e 2011. Já a Melhoramentos, que vendeu 22% mais em 2011 do que em 2010, quer encerrar 2012 com 3 milhões de livros vendidos.

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