"Lina Bo Bardi - Arquiteto" revê obra da criadora do Masp

Uma exposição no Masp e um livro da última pessoa a entrevistar a arquiteta revigoram legado da artista, que Cage definiu como "arquitetura da liberdade"

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Por Agencia Estado
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Passados 14 anos de sua morte, o legado da arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi (1914-1992) continua a suscitar debate. Um livro e uma exposição, que chegam nos próximos dias ao País, mostram como as proposições de Lina incorporaram conceitos de invenção, vanguarda, utopia, engajamento, vontade e espírito. "A arquitetura da liberdade", definiu o compositor John Cage (1912-1992) ao ver o Masp pela primeira vez. Essa arquitetura libertária ia além das problemáticas técnicas e estéticas. Seria "um instrumento de integração da existência humana na natureza e em seus mistérios, assim como uma comparação com a cidade e seus conflitos", definiram Luciano Semerani, Antonella Gallo e Giovanni Marras, os curadores italianos da mostra Lina Bo Bardi - Arquiteto, que se abre nesta quinta-feira, para o público - mais de um ano depois de montada na Europa. A exposição Lina Bo Bardi - Arquiteto reúne cerca de 200 obras com ampla amostragem do trabalho da artista, entre desenhos originais, montagens já vistas, objetos de mobiliário, maquetes, aquarelas e esboços. A exposição será abrigada pelo Museu de Arte de São Paulo (Masp), mais importante obra da arquiteta. Um dos destaques é o projeto inédito A Grande Vaca Mecânica, idealizado por Lina nos anos 80 e nunca construído - trata-se de uma espécie de "contêiner" zoomorfo, um ventre artificial cheio de ex-votos e brinquedos artesanais. Foi finalizado pelo pessoal da Universidade de Arquitetura de Veneza. Um crítico italiano, Gaetano Salerno, visitou a mostra em Veneza em 28 de setembro de 2004 e enxergou no trabalho de Lina "a certeza de que a requalificação social pode ser transmitida por meio da arquitetura". Ele salientou também os aspectos duchampianos dos artefatos de Lina. A teoria sobre a obra de Lina Bo Bardi ganha reforço também este mês, quando a editora Vitruvius lançar no Sesc Pompéia (projeto de Lina e seus auxiliares Marcelo Ferraz, Marcelo Suzuki e André Vainer) o livro Lina Bo Bardi - Sutis Substâncias da Arquitetura, de Olivia de Oliveira, volume de 400 páginas sobre o trabalho da arquiteta. Vai ser um livro com mais de 600 imagens, com projeto gráfico de Carlito Carvalhosa (também autor do projeto do livro sobre Rino Levi). A Vitruvius está lançando o livro em co-edição com a Gustavo Gili, editora de Barcelona, maior editora especializada em arquitetura na Espanha e das maiores do mundo. A autora do livro, Olivia de Oliveira, é brasileira, mas radicada há muitos anos na Europa (atualmente vive na Suíça, casada e com filho). Olivia, segundo o editor Abilio Guerra, da Vitruvius, foi a última pessoa a entrevistar Lina. Há muito tempo o Masp não dedica atividades à memória de sua idealizadora, Lina Bo Bardi. Críticos da atual direção do Masp dizem que é no mínimo "irônica" a decisão de celebrar a obra da arquiteta num local em que sua obra seria desrespeitada - o prédio do próprio museu, que teve algumas de suas características originais modificadas. Lina, por exemplo, planejou cavaletes de vidro especiais para que as obras do Masp fossem exibidas, e a atual direção do museu vetou seu uso. Os cavaletes transparentes, rejeitados aqui, têm sido usados em outros museus na Europa e tiveram seus direitos de reprodução vendidos ao Crown Hall, do Illinois Institute of Technology, criado pelo mítico arquiteto Mies van der Rohe. Nos últimos anos, Lina e o marido, Pietro Maria Bardi (1900-1999), sofreram uma espécie de "expurgo" no Museu que criaram e no qual investiram grande parte de suas vidas. Na mostra do centenário de nascimento de Pietro Maria Bardi, no ano 2000, a Pinacoteca do Estado foi a que dedicou maior carinho e ação criativa às celebrações. Graziella Valentinetti, irmã de Lina, diz que a importância do Masp na vida e na obra de Lina é o motivo principal pelo qual traz a mostra italiana a São Paulo. "É uma mostra muito bonita, e quando vi em Veneza, imaginei que talvez pudesse reportar o Masp à sua origem. É uma chance de lembrar minha irmã", afirmou. Graziella, que viveu 23 anos com a irmã e o marido, Pietro, tentou inicialmente montar a mostra na Bienal de Arquitetura, mas não conseguiu patrocínio. Serviço Lina Bo Bardi - Arquiteto. Masp. Av. Paulista, 1.578, 3251-5644. 11h/18h (fecha 2.ª). R$ 10. Até 19/2. Abertura hoje.

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