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Legado é o de um intelectual combatente

Além de sua ter escrito a coleção do Sítio, Monteiro Lobato colaborou com jornais, fundou editora e liderou campanhas

Por Agencia Estado
Atualização:

A simples menção do nome de Monteiro Lobato faz lembrar um bigode respeitável, cabelos levemente grisalhos e, especialmente, sobrancelhas de taturana, pouco antes que seus arquetípicos personagens dos livros infantis - Emília, Pedrinho, Dona Benta, Narizinho, Tia Anastácia - venham à mente. Logo depois, aparece a lembrança do intelectual combatente, que insistiu na criação de uma editora, que defendia suas posições nos jornais (o conhecidíssimo "Paranóia ou Mistificação", em que criticava Anita Malfatti, foi só uma de suas colaborações com o O Estado de S. Paulo, que procurou Mário de Andrade para publicar Macunaíma nos EUA, que fundou uma companhia de petróleo só para provar a Getúlio Vargas que, sim, ele existia no território brasileiro . Lobato é um dos escritores brasileiros mais controversos. Enquanto esteve vivo, viveu uma relação difícil, mas cheia de flertes, com os modernistas de 1922, mas que nunca resultou em namoro ou amizade. Sua obra adulta, representada especialmente por Cidades Mortas e Urupês, enfrenta restrições. O crítico Alfredo Bosi, por exemplo, afirma que "a indicação dos limites da arte lobatiana parece colidir com a relevância da figura humana que vive na história brasileira onde já assumiu um papel simbólico". Bosi diz ainda que Lobato "empunhou a bandeira do progresso social e mental de nossa gente". Mas é possível ler tal crítica com certo distanciamento hoje - porque Lobato é um dos autores que costumavam ser indicados como "precursores" do modernismo, e, em determinado momento, foi preciso diminuí-los para engrandecer o que veio depois. O fato é que as obras de Lobato carregavam o desejo apaixonado pela mudança do País, mas também estavam impregnadas de um moralismo que o afastava dos movimentos artísticos que mudaram a produção cultural. Uma das maneiras pelas quais esse moralismo se manifestou foi na produção de livros educativos (Aritmética da Emília, Geografia de Dona Benta) e de ficção científica, entre eles O Presidente Negro, que previa um futuro em que a racial norte-americana se converteria numa divisão institucional e política. Este livro e, especialmente, o papel subalterno de Tia Anastácia nos livros do sítio, costumam ser brandidos para apontar o racismo em Lobato, discussão que não se esgota e tem seus fundamentos. Mas não é possível deixar de enxergar sua indignação em Negrinha, em que uma matriarca enfia ovo quente pela goela da criança que nomeia o conto.

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