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Kiss leva 25 mil pessoas ao Anhembi, em São Paulo

Sem mudar uma vírgula do que faz há décadas, banda vira escolinha do rock'n'roll

Por Jotabê Medeiros
Atualização:

O baile de máscaras transformou a Zona Norte de São Paulo numa Veneza das profundezas. Centenas de pais e mães com seus filhos e filhas ainda crianças, boa parte deles com os rostos pintados, aguardavam comendo sanduíches de carne louca e hot-dogs na enluarada noite de sábado no Anhembi. Após quase 40 anos de estrada, o Kiss virou uma espécie de Escolinha do Rock, um cenário ideal para a iniciação ao rock'n'roll: os pais não correm o risco de o gênero ser rejeitado pelos filhos, e os professores são tão divertidos que os velhos não se chateiam durante a graduação. E sabe quais foram as primeiras músicas? Detroit Rock City, Shout it Out Loud, Calling Dr. Love e Hell or Hallellujah. Com um repertório e uma performance praticamente imutáveis nas últimas décadas (tocaram apenas três músicas novas, que na verdade são tão arquetípicas que poderiam ser velhas), a veterana banda norte-americana parece didática em seu esforço de mostrar que, sim, o rock pode viver tranquilamente por baixo da maquiagem e dos fogos de artifício.

O Anhembi não estava lotado, tinha metade da área ocupada por festivos fãs do Kiss (cerca de 25 mil pessoas). O Kiss não enrola, então foi um show curto, de 15 músicas. A área VIP foi abolida, não se sabe se por exigência do grupo, então a proximidade de seus reais admiradores com a banda era bem maior. Paul Stanley saudou o público de São Paulo dizendo que tinham passado antes pela Argentina (vaias estrondosas) e Chile (vaias menos estrondosas), mas que "esta noite, vocês são o público número UM". É isso: o Kiss não mente, toda noite é o melhor público do mundo, e esse público espera exatamente a música que vem a seguir.

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É louvável a longevidade do Kiss, sua disposição de fazer o ingresso valer a pena. Ao contrário de outras bandas, não há predominância burguesa no show do Kiss, é principalmente o trabalhador que está ali, gastando seus suados reais. A voz de Paul Stanley não é mais tão potente, os riffs de Thommy Thayer são repetitivos, sem pegada, e os gritos esganiçados de Stanley não chegam mais até o fundo da garganta. O Kiss é hoje tipo um circo Piolim do rock, com sua lona furada, seu leão desdentado, seu palhaço remendado. Por isso mesmo, têm sua graça, sua honestidade.

Cospem sangue de groselha, voam suspensos por cabos, mostram a língua descomunal de Gene Simmons - mas é um Globo da Morte controlado, politicamente correto, "família". Quando o baterista Eric Singer apontou uma "bazuca" para a plateia, o Kiss parecia que ia mandar um tiro de advertência de que o rock ia finalmente decolar na noite, mas ele acabou mirando no alto do palco e estourando o seu rojão ali mesmo.

"Olê Olê Olê Olá!", provocou Simmons, e a plateia respondeu: "Geneee, Geneeeee!". A contaminação do rock'n'roll pela lógica do reality show não fez bem ao Kiss. Já predomina um climão meio de Tarantella em cantina italiana, aquela alegria feita de autoironia. E essa alegria vai bem até que o macarrão acaba.

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