Ivan Lessa: Talento e formosura na ABL

Colunista comenta trajetória de candidata à vaga deixada por Moacyr Scliar na Academia Brasileira de Letras.

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Por Ivan Lessa
Atualização:

Há um cantinho que é quase meu na Academia Brasileira de Letras. Eu merecia, se não um fardão, ao menos uma espadinha de pau e um chapéu de jornal na cabeça. Presumo mesmo um átimo de imortalidade. Mas minhas cismas fixaram residência naquela graça de casa que foi o Petit Trianon. Reivindico pouco na ABL. Os fatos, no entanto, não podem ser negados. Meu bisavô, Júlio Ribeiro, é patrono da cadeira 24 (sem gracinhas, por favor) e meu pai, Orígenes Lessa, foi candidato por duas vezes, induzido por aqueles que, na época, eu chamava, para chateá-lo, de "maus amigos". Na primeira vez, perdeu para José Sarney, o que não chega a ser demérito, pois há muitos fora dos panoramas político e literário que continuam a deixá-lo passar a bola entre suas pernas. Da segunda, o Lessa foi enfim eleito e imortalizado. Botou a fantasia, foi de espadim na bainha, fez discurso inaugural, tomou o célebre chazinho, se esse não é lenda, molhou o biscoito, se também fazem parte do ritual. Nos anos 70, estive, na companhia de Millôr Fernandes, Jaguar e Elke Maravilha, entrevistando o Austregésilo de Athayde, à frente da distribuição de jetons e biscoitinhos por mais de três décadas. A entrevista era para o Pasquim e a presença da Elke mera provocação, uma vez que aqueles que zelam pelo cultivo da língua e do livro pátrio ainda não admitiam a presença (talvez não admitissem sequer a existência) do sexo frágil entre eles. Era um clube fechadíssimo e à velha maneira inglesa do White' e do Boodle's. Elke pintou o 7. Austregésilo, altaneiro, não ligou e, mais, deu um baile naquilo que os inocentes chamavam, de "patota". Sereno, botou para escanteio todas as provocações e ainda nos deu uma lição sobre as verdadeiras finalidades da Academia. Fez-nos de bobos. Estávamos, no entanto, em boa companhia. Nos idos dos anos 40, moleque metido, compareci à posse de Manuel Bandeira no Petit Trianon, uma vez que o "poeta do beco" iria ocupar a cadeira cujo patrono era meu bisavô, Júlio Ribeiro, conforme já disse. O empossado num trono de imortais é obrigado a fazer um discurso elogiando seu patrono. Como o bom Bandeira deve ter suado para dizer algumas boas palavras sobre aquele que fora o autor de um romance escandaloso do século XIX, A Carne. Nos anos 70, fiz questão de ir à cadeira 24 e Elke, instruída pelo bando de cafajestes que éramos, nela se aprumou exibindo suas pernas sem fim. A foto lá está na coleção de quem guardou o jornaleco. Hoje, tudo mudou. Os 40 imortais, acho eu, tem um arranha-céu só para eles, com um andar (tem jacuzzi?) para cada imortal. O Clube do Bolinha acabou. Mulher entra, sim senhor. Já teve presidenta, ou presidente (a ABL endossa as duas formas, a ABL endossa tudo que passar à sua frente, seu negócio é não fazer marolas.), e, agora, são em número de 4. Nada mau, nada mau. Enfileirei este background apenas para, dado meu relacionamento, pessoal e familiar, com a instituição, apoiar a candidata à cadeira 31, deixada vaga pelo desaparecimento precoce do excelente escritor (mas escritor de verdade) gaúcho Moacyr Scliar. Trata-se da também gaúcha Leda Prado Borba, praticante do jornalismo, da política, da arte e da cultura. Leda Prado tem, conforme ela mesma, sem falsas modéstias, adianta em seu currículo, "carisma e docilidade", além de ser "atuante, comunicativa" e possuir "espírito de liderança em equipe". Não bastasse, é uma belíssima mulher. Quem duvidar que dê uma chegada ao YouTube, aonde ela aparece em diversos clipes, palestrando com imortais, vivos e mortos, e lançando ainda, há alguns anos, sua candidatura à Presidência da República. Ela conta com 3.800 tardes de autógrafos realizadas em todo o Brasil e é autora de 50 livros (alguns ainda por publicar). A saber, para citar apenas alguns: Colheitas de Outono, O Destino pode nos Esperar, Os Conselhos do Espelho, Amor Tropical, Páginas da Vida, Laços de Amor, Quase Perto do Amor e por aí afora, sem contar roteiros de cinema, editoria, criação de capas, revisão e "vendas de eventos literários"(sic). Tem intimidade com o Inglês, Francês, Italiano e Espanhol (são línguas e não amigos ou conhecidos). A coisa não para aí: Leda Prado, além de atriz e apresentadora de TV, claro, é também artista plástica (estilo clássico renascentista, naturezas vivas, abstrações em terceira dimensão (?)). E ainda: projetos gráficos de revistas, desenhos animados, histórias em quadrinhos e programas de televisão infantil. Não acabou: prepara atores e atrizes. Sapateia, dança balé clássico e jazz. Acham pouco? Pois segurem aí: tem 10 anos de propaganda e marketing na Empresa Casa Lidador, E eu nem falei em seu talento como modelo de publicidade e desfiles de modas e sua atuação como figurinista. Seus mestres? Paulo Coelho, o Dalai Lama, Evandro Lins e Silva além de Vinicius de Moraes, Tom Jobim e Carlos Drummond de Andrade. Uma lástima que não esteja em jogo (sorry, atual ocupante) a cadeira 24. Meu bisavô e o Bandeira ficariam orgulhosos. Eu, em seus nomes, recomendo entusiasticamente um passeio pelos clipes de Leda Prado postados no YouTube e, se você é ímortal, votar nela. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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