Ivan Lessa: O ninho, suas idas e voltas

Colunista comenta pesquisas sobre imigração e especula sobre razões que levariam brasileiros a deixar o pais.

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Por Ivan Lessa
Atualização:

A notícia estourou como um fanático islâmico em meio à caserna de "infiéis" no Afeganistão: apesar de toda essa crise que os países civilizados, ou, melhor dizendo, os países ricos, vem passando, os números oficiais são implacáveis: o êxodo de brasileiros para o exterior, qualquer exterior, não pode parar. Tal como acontecia há séculos com São Paulo. O êxodo, também conhecido como diáspora, para pegar uma conotação bíblica menos negativa, havia decrescido em 2008. Agora, há cerca de um ano, aumentou de novo. Sociólogos e jornais esclarecidos mostram-se surpreendidos. Como se, subitamente, dessem com dois ou três casos de bom caráter nos setores políticos e financeiros de nosso país. Conjeturas há. Que custam pouco e são fáceis de alinhavar. Cabeças sensatas sugeriram um levantamento nos aeroportos brasileiros para saber quem vai, para onde vai e por que vai. Convenhamos. Mais uma chatice. Já basta ter de passar pelo detector de metais, por aquela "otoridade" que insiste que o passageiro em potencial (e em suas mãos impotente também) tire o cinto, o sapato, e desarme por completo o caríssimo, nos dois sentidos, laptop. Mais uma formalidade. Mais filas. Por que não, e vai daqui o palpite de quem se mandou, na maior calma, há mais de três décadas: não questionem nada. Tentem adivinhar. Botar a cabecinha para pensar. Conjeturar, que, como ficou patente (major, coronel, general), sai mais barato e é tão válido quanto sonhar com rei para amanhã fazer uma fezinha no leão. Eu diria que os que partem, além de não deixarem saudade, estavam de ressaca ou de ovo virado. Foram embora, assim, sem mais nem menos, por birra, despeito, novidadeiros que são, na melhor das hipóteses. Talvez nosso país esteja melhor sem eles. Eu diria também que a turma que volta para o Brasil, principalmente esses da cidadezinha de Gort, na Irlanda, que se disse atingida pela crise que assola a simpática ilha aqui do lado, e que constitui - ou constituía até outro dia - perto de 50% da população, volta para não perder um único segundo do novo governo da presidente (ou presidenta, depende do ponto de vista) Dilma Rousseff. Uma gente boa que, na Irlanda, país eminentemente católico, ou seja, a um passo da macumba e do candomblé, aprendeu a confiar num futuro melhor. Para eles, melhor futuro do que um Brasil com mulher de reconhecido passado político passivo e ativo (perseguição, poder) à testa das ações não pode ser melhor sinal. E, no aeroporto, a espera da nave espacial (invenção de um brasileiro cujo nome não deve ser pronunciado por dar azar) que os levará de volta ao torrão natal, discutem os méritos, relativos ou não, de outras mulheres que lideraram os destinos de seus respectivos países: Golda Meir, Indhira Gandhi, Benazir Bhuto. Tudo gente, ou damas, do mais alto gabarito. "Dona" Dilma, como já a chamam carinhosamente os que deixam Gort, enrolando aquele R céltico na boca, vai dar um jeito "nessa coisa toda", conforme dizem segundo o vocabulário político irlandês com o qual conviveram e com ele tanto aprenderam durante algum tempo. Agora, ao outro lado da moeda. Imigrantes brasileiros, de vários níveis sociais, com ênfase no nível dos ainda vivos e sem estarem cumprindo pena de prisão, principalmente no país nosso avozinho, Portugal, segundo relato diligentemente coberto aqui mesmo na BBC Brasil pelo eficiente Jair Rattner, insistem em afirmar que - este o título do relato jornalístico - "mesmo em crise, países ricos ainda oferecem vida melhor". Oferecem mesmo? Cético que sou, ponho em dúvida algumas coisinhas. Estarão sendo sinceros ou fazendo política? Haverá misoginia aí? A fama lusa indica que sim, segundo as más-línguas (e mentes preconceituosas também). Há uma concomitância oculta nesses dados todos. Qual concomitância? Por que concomitância? Deixo para os que melhor entendem do assunto tentarem desvendar o mistério. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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