Ivan Lessa: Michelle, a obsessão do momento

Colunista comenta a obsessão por Michelle Obama e relembra primeiras-damas brasileiras.

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Por Ivan Lessa
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Lá está ela na capa da revista Time da semana passada. Mais de quatro milhões de exemplares em todo o mundo. Lá está ela na capa de... Bobagem pensar em enumerar. A nova primeira-dama norte-americana só perde em popularidade para seu primeiro-cara-metade, Barack Obama. Michelle Obama ganha disparado de Beyoncé, Susan Boyle e Brangelina (é Brad e Angelina, uai!). Uma verdadeira obsessão. E magnífica. Aos 45 anos de idade, quase 1m80 de altura, braços roliços expostos, vestidos em Technicolor (segundo a Time) copiados por todo mundo de todos os sexos, Michelle é o ideal feminino que, naquele país, e agora o mundo, não se via desde os tempos de Jacqueline. Como essa, seu nome é mais popular na França do que em Ohio ou no Quênia. Quem diria, há um ano, que ela - chamada de certa feita em New Hampshire por uma jornalista famosa de "Monique" - iria virar coqueluche. Com seus dotes físicos tão impressionantes quanto sua bagagem acadêmica. Que dizer de suas sobrancelhas arqueadas como dois eloquentes circunflexos? Nada. Nada a dizer nessas horas. Uma ou outra pessoa pode pensar que deve doer à beça na hora de aparar devidamente os dois sinais diacríticos que ora imperam na Casa Branca. Qualquer sacrifício vale para manter altos - arqueados, encurvados - os símbolos de uma esplêndida democracia. Michelle Obama, suas duas adoráveis filhas, sua mãe, membros da família e amigos, mais o simpático cão d'água português, Bo, habitam hoje, e continuarão habitando por algum tempo, aquele que é talvez o endereço mais famoso do mundo: Avenida Pensilvânia, 1600. Michelle abandonou, em louvável gesto de desprendimento, um bem sucedido emprego no ramo da advocacia (US$ 212 mil por ano) para cuidar da carreira do marido, das filhas, Bo, parentes, amigos, casa e uma "horta da saúde". Nestes 120 dias. Michelle, a cada 120 minutos, surge nos noticiários. Não só por seu par de tênis de US$ 540 e seu domínio do bambolê (foi registrado em vídeo e fotos), mas por sua presença charmosa e elegante. Longa vida pública e pessoal a Michelle! Tudo isso me leva às nossas primeiras-damas. De ouvido, e por ordem cronológica, tento me lembrar se não de todas mas as que mais deixaram seu nome nos registros históricos brasileiros. Curioso, mas apesar de primeiras-damas, nós, com nossa ginga, nossa simpática intimidade, chamamos a todas elas de "Dona". Não por falta de respeito. Coisas da língua, não reformada como um general. Dona Alzira Vargas é a primeira que me vem à mente. Sob o signo de seu primeiro-damismo nasci e até minha pré-pubescência sob ele fiquei. Consta que "Dona" Alzira se empenhou muito em obras de caridade. Foi seguida por "Dona" Santinha, que, dizem, praticamente forçou o marido, o Marechal Eurico Gaspar Dutra, a fechar o jogo. Café Filho, Carlos Luz e Nereu Ramos" não tiveram "Donas". Ao menos para mim e a mídia que me cercava. Lembro-me, e muito, a seguir em meu calendário, de "Dona" Sarah Kubitschek, cuja passagem pelo poder foi marcada por viagens, casamento de filhas e também a beneficência social. E "Dona" Eloá Quadros, de tão breve duração? Como o próprio Jânio, nada tenho a dizer a seu respeito. Nem mesmo consigo visualizá-la. O mesmo se dando com a excelentíssima senhora Ranieri Mazzilli, outro cometa de brevíssima passagem por nossos inquietos céus democráticos. Da ditadura, não vejo "Dona" alguma ao lado do Marechal Castelo Branco. Costa e Silva? Opa! Viva "Dona" Yolanda Costa e Silva, que estava em todas. Mais discreta, perfil mais baixo mesmo (ou low profile como se diz agora no Brasil livre e trigueiro) foi a senhora Garrastazú Médici, "Dona" Scyla. Não visualizo-a nem de tênis ou rodando bambolê. Sérião, Ernesto Geisel, deixou para a história, também muito sisuda, "Dona" Lucy. Com a democracia, por assim dizer, as primeiras-damas, continuaram suas carreiras de "Donas". Ninguém mais "Dona" do que "Dona" Ruth, de vida pessoal e pública tão sacudida quanto a de seu marido, Fernando Henrique.Por diplomacia, paro nesse passado recente. Tudo para falar de duas primeiras-damas que nunca chegaram a ser "Donas". Rosane Collor, que era isso só, Rosane, e acabou-se. Agora, atenção, muita atenção: Maria Tereza Goulart, que não havia hipótese de ser "Dona" de nada em lugar nenhum. Era Maria Thereza simplesmente. Mulher do Jango. Estive uma ou duas vezes com ela. Na pérgula do Copa. Trocamos três frases, três lugares-comuns. Como ambos éramos destituídos de qualquer coisa que lembrasse ideologia, aqueles brevíssimos momentos me marcaram profundamente. Por isso que digo sempre: em matéria de primeira-dama, páreo para Jackie O e agora Michelle também O, só Maria Thereza. Com agá e zê. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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