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História da cidade em painel de Maria Bonomi

Quando Maria Bonomi chegou a São Paulo, em 1946, vindo da Itália, ela desceu na Estação da Luz com seu avô. Agora, contará a hitória dos que vieram como ela em painel a ser instalado no subsolo da estação

Por Agencia Estado
Atualização:

Quando Maria Bonomi chegou a São Paulo, em 1946, ela desceu na Estação da Luz com seu avô. Maria nasceu na Itália e veio para a capital paulistana, vinda do Rio, em um trem noturno. Agora, depois de tantos anos de sua chegada, a artista contará, em forma de um enorme painel de concreto a ser instalado em um corredor no subsolo da própria Estação da Luz, a história de todos os que chegaram como ela, a história da estação que é "espelho físico de percursos intangíveis de todas as almas e de cargas que originaram a nossa contemporaneidade". O painel, que terá 70 metros de comprimento e 3 metros de altura é mais um projeto de arte pública de Maria Bonomi, um dos nomes mais importantes da gravura brasileira. A artista foi convidada pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), há cerca de nove meses, para executar o painel na intervenção urbanística que está sendo realizada na Estação da Luz: a construção de uma passagem subterrânea que funcionará como um centro de conexão dos transportes sobre trilhos (trens e metrô) com o transporte sobre rodas. O painel será instalado em uma das paredes do túnel. Com título provisório de Epopéia Paulista, a obra será formada por três camadas com altos e baixos relevos gravados em concreto nos quais Maria Bonomi vai recriar a história paulistana nos planos passado, presente e futuro. "De minha parte, fui chamada para que o túnel tivesse um caráter social e histórico. E esse painel vai ter esse caráter social-histórico", diz a artista. O projeto ainda está em fase de captação de recursos e formatação para que seja aprovado pela Lei Rouanet. Além da construção do painel, o projeto de arte pública ainda engloba a publicação de um livro sobre a execução da obra e um kit de arte-educação para que o público entenda todo o mecanismo de criação artística. O jornalista Marcos de Souza, da Editora Mandarim, também participa do projeto. Ainda não há uma data definida para o começo da realização do trabalho justamente porque ainda faltam patrocinadores. Mas desde que foi feito o convite pela CPTM, Maria Bonomi está desenvolvendo a concepção do painel com o arquiteto Rodrigo Velasco, que a auxilia na área técnica. Segundo o arquiteto, depois que forem fechados os patrocínios, o painel levará somente um período de 60 a 75 dias para ser executado. Como foi determinado que a obra seja realizada em outro local - o túnel ainda está sendo finalizado - o painel será executado por partes em um galpão para depois ser montado na Estação da Luz. A proposta é dividi-lo em 150 placas com dimensões médias de 1 x 1,5 metro, que depois serão juntadas. Epopéia Paulista será formado por três camadas. A primeira será a descrição visual dos mais de 100 anos de Estação da Luz. Maria Bonomi conta que vai gravar, sulcar os diversos utensílios das pessoas que vieram pela Estação. "Eu já estou reunindo coisas há nove meses para grudar naquele painel", brinca a artista. Entre os objetos, estão serrotes antigos, chaveiros, martelos, instrumentos musicais e sapatos, por exemplo. O processo de realização do painel é o mesmo da gravura. A matriz será a madeira e nela serão incrustados os perfis desses utensílios, assim como os sulcos que formarão as outras duas camadas. "Só que em vez de a gravura ser impressa em papel, será impressa em concreto", explica Maria. "A tridimensionalidade fica latente." Vale dizer que uma das maiores preocupações de Maria Bonomi é o teor tátil de sua obra. E, desse modo, grande parte da concepção do painel foi pensada para que deficientes visuais também tenham contato com Epopéia Paulista. Foi a partir da participação no projeto Céu Aberto, em que cegos visitaram com a artista outro de seus painéis, o Futura Memória, abrigado no Memorial da América Latina, que Maria ficou atenta a essa questão. A segunda camada do painel vai ser a intitulada Vivências e a terceira, no alto, será a das nostalgias. Além de ser formado por três partes, outra característica do painel é a de ter o concreto colorido. A primeira cor será o vermelho, que remete ao solo de São Paulo, "a cor da terra em que se chegou". Depois será o cinza, "a tristeza de quando se chega" e que remete ao ter de construir - "é uma cidade que foi feita de concreto". Por fim, o verde das nostalgias. Maria Bonomi defendeu em 1999 sua tese de doutorado pela ECA-USP sobre o tema arte pública. Recebeu, com louvor, o título de doutora. "É importante que os geradores de espaços públicos continuem chamando os artistas para humanizar as áreas vazias", diz Maria. "A arte pública entra como uma provocação e solidariedade também. Cria um referencial para a população." Para Maria, que agora vai oferecer a São Paulo mais uma de suas obras públicas, o artista, nesse caso, foi chamado para "criar o insólito". Outros locais que abrigam suas criações públicas são a estação de metrô Jardim São Paulo e Avenida Paulista.

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