Herchcovitch desfila seu sucesso

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Por Agencia Estado
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Quem o visse há uma década, girando pela noite paulistana acompanhado de drag queens e travestis trajados com roupas estranhas, tecidos com estampas de aranhas, morcegos e caveiras em cores sombrias, dificilmente apostaria em uma consagração. Mas, 12 anos depois, o enfant terrible da moda paulistana tornou-se grife nacional e deu passos firmes para conquistar o mercado internacional. Mas o que mudou de uma década para cá? O jovem de braços tatuados e de cabelos longos abandonou a rebeldia? "Continuo o mesmo, mas é claro que meu trabalho amadureceu nesses anos", disse ele à AGÊNCIA ESTADO, recém-chegado da temporada francesa. Instalado em um sobrado na rua Hadock Lobo, onde funciona seu ateliê e show-room, Herchcovitch ainda mantém a aparência de um garotão. O endereço nos Jardins é o quartel-general de onde saem as criações com sua marca. Ele supervisiona tudo o que sua equipe, de cerca de 20 pessoas, está fazendo. Tem razões para isso. Suas idéias de rebeldia agora rendem dinheiro e prestígio. Origens - Alexandre Herchcovitch é neto de judeus poloneses e romenos. Mãe e pai são do interior de São Paulo. O filho nasceu na capital. Em 29 anos, mudou algumas vezes de endereço, mas manteve-se sempre perto da primeira casa de seus pais, na Alameda Lorena com Avenida Nove de Julho. Hoje está instalado em um pequeno apartamento, que pertenceu à sua avó, na Rua Padre João Manuel, no Paraíso. Despertou para moda aos 8 anos e na pré-adolescência frequentava a Rua 25 de Março e as ruas do Bom Retiro ao lado da mãe, que possuía uma confecção de lingerie. "Aprendi a costurar com ela". Agora dona Regina comanda a seção de produção da grife do filho. Até cursar a faculdade quase não saía sozinho. Estudou no internato judeu Iavne e ingressou no curso de moda da Faculdade Santa Marcelina. Foi nessa época o despertar do rebelde. "Até então eu desconhecia as ruas". O contato com os personagens da noite de São Paulo, diz, foi a pedra angular de seu estilo. "Fiquei fascinado com os notívagos. Foram os travestis e drags que me ajudaram a criar conceitos como o da mistura de sexos, que uso em minhas criações até hoje". Os amigos cultivados nessa época são os primeiros a serem convidados para os lançamentos das coleções: "Devo muito a eles. Eles foram os meus primeiros consumidores, os primeiros a acreditar em mim". E os primeiros produtos confecionados por Herchcovitch foram as famosas camisetas pretas com caveiras brancas estampadas na frente, vendidas, no início, a R$ 15, e hoje, a R$ 40. São Paulo então se expandiu para ele. Era assíduo frequentador da Nation, na Rua Augusta, e da Senhora Kravitz, em Santa Cecília. Hoje trocou a noite e as boates pelo dia e encontros com amigos em restaurantes ou em casa, onde exerce seu hobby, cozinhar. Acorda às 6h30, não toma café e sai para trabalhar. Paixão - As raras vezes em que não está trabalhando - nos últimos anos isso só tem acontecido nas tardes de sábado e domingo - ele costuma ir às feiras do Bexiga e Benedito Calixto. A cidade ainda é sua paixão. O fato de nunca ter saído daqui para se aperfeiçoar em centros internacionais de moda é, ao contrário do que pensa a maioria de seus colegas, encarado como vantagem. "Antigamente, até pensei que se tivesse me estabilizado em Londres ou Paris minha moda poderia ser melhor. Hoje vejo que ter ficado em São Paulo foi determinante para a originalidade do meu trabalho." O carrefour de culturas, a diversidade étnica, o pobre e o rico da paisagem paulistana contribuíram para sua originalidade e o fato de ter decolado daqui sem escalas para as pessarelas internacionais, segundo ele, só aumentou o espanto e a curiosidade dos estrangeiros por suas criações. Alexandre Herchcovitch está em sua 13ª coleção e prepara-se para ganhar mais altitude ainda no concorridíssimo universo da moda. As agulhas do ateliê da Rua Hadock Lobo estão caprichando para o desfile de janeiro do ano que vem, no MorubimFashion. Dois meses depois, as criações cruzam o Atlântico e aterrissam em Paris novamente, onde "temos a obrigação de consolidar e mostrar novidades". Já estão distantes os anos de improvisação e gambiarras no ateliê. A Rhodia, gigante do setor têxtil, e Herchcovitch assinaram contrato há dois anos por meio do qual a empresa fornece todo aporte tecnológico para a confecção e ainda financia os desfiles. Em Paris, para onde levou dez pessoas de sua equipe, as contas chegaram a US$ 150 mil. Depois, provavelmente em julho, a editora Cosac&Naif publica um caprichado volume com a retrospectiva de sua carreira. Com criações espalhadas em mais de 50 lojas no Brasil e 15 pontos de venda no exterior, o enfant terrible da São Paulo dos anos 90 quer se tornar um Napoleão.

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