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Guel Arraes faz rir de quem se leva a sério

Diretor de O Bem Amado diz que políticos se refletem em Odorico Paraguaçu

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Filho do ex-governador Miguel Arraes, Guel acompanhou a família no exílio, quando seu pai foi cassado pelo regime militar, nos anos 1960. A política faz parte do seu universo desde garoto, mas, como diretor, Guel gosta de encará-la por linhas tortas, mesmo sabendo que todo filme é sempre político. É um diretor que os críticos amam odiar, porque ocupa um espaço, o da produção comercial bem-feita, prosseguindo no cinema as pesquisas de linguagem de seus programas na TV. Muitos projetos - O Auto da Compadecida, Lisbela e o Prisioneiro - foram feitos para TV e cinema e a acusação em geral é esta - seus filmes são "televisivos". Guel faz agora seu filme mais assumidamente político.Por que adaptar O Bem Amado em 2010?A política é como o futebol no Brasil. Todo mundo escala a seleção, todo mundo avalia os políticos, mas as regras quase nunca são as mesmas. Tenho para mim que os lugares que se levam a sério são os melhores para se fazer comédia. Com exceções - Romance é outra coisa, o meu Tristão e Isolda -, o que me atrai é o humor. Até por ter convivido internamente com esse mundo da política, sempre fui atraído pela peça de Dias Gomes que deu origem à novela e à série. Odorico Paraguaçu virou o emblema do político brasileiro. Existem muitos Odoricos por aí e eles acham o personagem divertido, são os primeiros a rir. Mas nenhum assume que Odorico é o retrato deles, daí meu desejo de fazer o filme.O País mudou muito entre a peça do Dias, a novela e o filme. Como trabalhou isso?Era o desafio e, ao mesmo tempo, o bacana desse projeto. Muita gente avalia meu trabalho pelas inovações de linguagem. Podem até não gostar, mas desde Armação Ilimitada sei que tenho uma marca. Quando comecei a fazer TV, era tudo muito parado, o humor, de chanchada. Acho que contribuí para uma sofisticação da linguagem de TV e alguns críticos vão dizer que refaço minha TV no cinema. Não vou polemizar se é ou não verdade. Não concordo, mas a crítica é livre. Só que aqui não queria centrar o filme na linguagem. Era o personagem que me interessava, o retrato que ele fornecia do Brasil. O País mudou. O Odorico da ditadura não podia ser o mesmo da democracia. E com ele mudou tudo. A sátira política virou uma farsa. As Cajazeiras, que tinham um perfil, agora têm outro. São mais peruas. Gosto dessas mudanças.Seu estilo é muito baseado nos detalhes, e é algo que já vem do trabalho na TV.Sempre fui atento, na vida, a detalhes, a tudo. Levei isso para a televisão, com certeza, e agora trago para o cinema. O próprio processo do filme espelha o que digo. Quando propus a (Marco) Nanini que refizéssemos o Odorico, ele se assustou um pouco, porque é um personagem com muitos donos. O Dias (Gomes), o Paulo (Gracindo), que criou o papel na TV. Nanini descobriu que os direitos da peça estavam livres e resolveu encená-la. Fiz uma adaptação, a montagem não era a peça, algumas cenas vieram para o cinema. Nanini testou o personagem no palco e, depois, antes de filmar, tivemos algumas semanas de ensaios, não muitas. Sempre tivemos claro, por exemplo, que ele interpretava um ator. Todos os políticos são atores, e o Odorico não foge à regra. Levamos essa coisa até o limite da farsa, o que é difícil, mas o Nanini é muito bom de trabalhar no fio da navalha.(O ator, que se integrou à entrevista, realizada num hotel de São Paulo, dá seu depoimento. "Guel é ótimo diretor. Ele sabe o universo que quer criar, porque trabalha muito no roteiro e na decupagem, antes de filmar. E ele tem essa facilidade. Ele envolve o ator, compreende a gente, nos seduz. Como trabalhamos juntos há muito tempo, conheço seu método, onde ele vai posicionar a câmera, essas coisas. E, como trabalho no limite, já sei identificar suas pequenas indicações, sem que ele precise realmente falar, ou explicar.")Trailer.nome

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